Hípias de Élis –
(460 a 399) a.C
Autor: Alysomax
Soares
Introdução
Hípias foi um
filósofo sofista da Grécia antiga, ele ficou muito conhecido por ter uma
excelente memória. O domínio de seus conhecimentos era visto como uma espécie
de saber enciclopédico. Foi também considerado um doxógrafo e compilador de
várias obras. Sua vasta obra produzida e compilada de maneira ordenada permitiu
que muitos filósofos e historiadores pudessem sistematizar o pensamento da
filosofia antiga, contribuindo assim de maneira notável com o registro escrito
da História da Filosofia. Foi muito criticado pelos filósofos da época devido à
prepotência que tinha em relação ao domínio de seus conhecimentos. Gabava-se
também de ganhar muito dinheiro com seus ensinamentos, por isso, era mal visto
por alguns pensadores de seu tempo. Além disso, julgava ser conhecedor de tudo
e afirmava poder discursar sobre qualquer tema. É considerado um dos criadores
da etnologia (ciência que estuda a cultura através de documentos). É autor da
célebre frase: “A lei é o tirano dos Homens”. Estudou as áreas
da Filosofia, História, Poesia, Música, Educação, Artes, Matemática, Astronomia,
Direito e Política. Era tido como um polímata, devido ao seu vasto conhecimento
erudito em várias áreas do saber. Acredita-se que teria sido discípulo de um filósofo conhecido por Hegesidamus. Seu principal objetivo como professor era
ensinar a arte da argumentação (erística), pois desejava que seus pupilos
pudessem discutir qualquer tema com maestria.
Desempenhou trabalhos
manuais de tecelão e sapateiro, sendo posteriormente a essa fase, nomeado
Embaixador de sua cidade natal. Alguns historiadores da filosofia o consideram
como o “pai da mnemônica”, por ter sido o criador do método da
"Mnemotécnica" (arte da memória). O filosofo Platão o cita em alguns
de seus diálogos como “Hípias maior” e “Hípias menor”. Entre suas principais
teorias estão: o conceito de virtude universal, o relativismo da moral, o poder
e a igualdade entre os indivíduos. É visto também como um dos primeiros
pensadores a criar teorias sobre a arqueologia. Destacou-se na área financeira
tendo inclusive adquirido riquezas com o ensino. Na área da literatura ele
escreveu tratados, elegias, tragédias, versos épicos e alguns textos em prosa.
Sua obra jurídica também colaborou para que o pensamento democrático grego se
consolidasse. De suas obras restaram-se poucos fragmentos. Pesquisadores
apontam que ele possivelmente tenha escrito uma obra de nome “Synagogé” em
que descreve problemas filosóficos, registros históricos e uma lista com
vencedores das olimpíadas. Nasceu por volta de 460 a.C e veio a falecer em 399
a.C.
Filosofia da
Natureza
Defendia o estudo das ciências da natureza, pois acreditava que através dela o homem produziria um caminho correto para uma boa conduta na vida. Na sua visão, para que o homem pudesse compreender a natureza ele precisaria estudar o “todo” de maneira distinta das “partes” que a formam, isto é, o universo como um todo seria constituído por seres particulares aos quais ele denominava de “coisas”. Hípias acreditava que a natureza se apresentava de forma plural, daí explicava que as “coisas” não poderiam ser formadas de uma única substância, mas sim de múltiplas partículas. Essas coisas existiam independentemente do homem ter dado nome a elas. Dessa forma, para ele, a realidade seria eterna se não existisse o vazio no universo. Dizia que o universo possuía um formato esférico.
Filosofia Moral
Descreveu
conceitos sobre a ideia do belo e da moral, antecipando conhecimentos futuros
sobre a estética relacionada com a ética. Dizia não haver diferença entre o
homem mentiroso e o verdadeiro, pois acreditava que o conceito de “poder” seria
a capacidade que o indivíduo tinha de fazer o que quisesse, ou seja, poder
dizer a verdade ou a mentira de acordo com sua habilidade. Para ele um
indivíduo ignorante não era capaz de ser mentiroso, porque não seria hábil na
arte de enganar. Explicava que a verdade existe mesmo que o homem não tenha a
capacidade de conhecimento total dela. Nesse contexto, ele destacava que a
lei natural era essencialmente o sustentáculo da moralidade. Transcorria que a
ideia de justo e bom eram relativas para determinadas situações.
Filosofia da
Educação
Defendia na área
do ensino o objetivo da busca pela excelência apresentando ao estudante a
possibilidade dele poder escolher aquilo que quisesse aprender. Dessa maneira,
uma boa educação levaria o aluno a prática do aperfeiçoamento e a solução de
suas deficiências. Entendia que o ensino da virtude se relacionava com a ideia
de variedade de conhecimentos, por isso, para um conhecimento ter qualidade ele
precisaria de quantidade. Esse método adotado por Hípias era chamado de “polymathía”
(domínio de todos os saberes) ou saber enciclopédico. Explanava que os cidadãos
sábios de todas as nações eram semelhantes em virtudes, portanto deveriam se
juntar em torno de uma virtude universal. O conceito de nacionalidade
precisaria ser superado e no seu lugar deveria ser construída a ideia de
humanidade, como se todos vivessem em uma espécie de “aldeia global” e com
pensamentos igualitários. Esses pensamentos conduziriam o ser humano a elaborar
políticas públicas práticas que atendessem as necessidades básicas para a sua
dignidade, pois seriam baseadas em virtudes naturais. Explicava que os
conhecimentos deveriam ser aplicados de maneira prática, com isso, ele produzia
vestimentas e coisas de uso diário.
Filosofia do
Direito
Argumentava que a
lei seria apenas um disfarce para o poder. Na sua teoria jurídica ele condenava
conceitos ligados ao direito positivado e advertia da importância de um direito
natural que pudesse transcender alguns estágios de percepção da realidade. Ele
acreditava que existiam três formas de compreensão da realidade que seriam: as
leis espaciais, os princípios temporais e as regras universais. Posto isto, ele
explicava que os homens ao elaborarem as leis positivadas ficavam submersos em
um mundo em que não entendiam as leis do espaço, então como consequência também
não conseguiam compreender os princípios temporais e nem transcender na busca
de preceitos universais. Dessa maneira, ao criar suas próprias leis positivadas
o homem acabava esquecendo esses princípios regulados pela natureza. O direito
na sua concepção deveria ser naturalista. Para ele, o homem precisa conhecer as
leis naturais e para isso seria necessário conhecer a natureza. Dizia que
o “nómos” (lei) obrigava o homem a se tornar um escravo e que
as desigualdades que eram impostas não possuíam legitimidade, pois era fruto de
uma lei e não da natureza. Condenava o sistema vigente da magistratura que
selecionava para os cargos pessoas imaturas e incompetentes.
Filosofia da Matemática
Sistematizou
partes da história da geometria antiga. Destacou-se na matemática ao descobrir
o conceito da trissectriz ou quadratriz em uma curva no círculo. Essa curva
mecânica tem essa etimologia porque pode ser usada para formar uma curva dentro
de um quadrado e também para trissecar um ângulo. A quadratriz pode ser
definida como a intersecção de duas linhas em movimento. Alguns matemáticos
utilizaram essa curva em um antigo problema sobre a quadratura do círculo e
também sobre a trissecção do ângulo. Ele também formulou os primeiros conceitos
sobre a “equação da grade”.
Hípias Menor –
Diálogo Platônico
Aqui Platão trata
da questão do homem mentiroso e do verdadeiro, ele descreve que o personagem
Hípias adverte que o homem mentiroso não é diferente do homem que diz a
verdade, pois ele pontua o significado de poder como sendo um atributo que
uma pessoa adquire tanto para “poder” dizer a verdade quanto à mentira. Nesse
diálogo o personagem Sócrates questiona Hípias sobre seu discurso homérico em
que ele descreve argumentos dos personagens Aquiles e Ulisses em um dilema
ético. O diálogo segue entre o paradoxo moral que se estabelece na argumentação
de que o homem mais capaz de dizer a verdade pode ser também o mais capaz de
mentir e a ideia de que o homem verdadeiro pode não ser superior ao homem
mentiroso.
Hípias Maior –
Diálogo Platônico
Nesse diálogo Platão
transcorre sobre a ideia do belo descrevendo algumas definições sobre o que
pode ser considerado belo. O conceito de belo nessa época abordava o tema não
apenas em seu formato estético, mas também com uma conotação do que é
eticamente o bem e moralmente a justiça. A sua visão totalizante do que pode
ser o belo se traduz de maneira ontológica e metafísica, pretendendo esgotar o
tema em sua melhor completude. Assim o horizonte de abrangência do que pode ser
delimitado como belo, ganha um amplo terreno de possibilidades. Para Hípias a
ideia de belo se fundamentava em uma visão particular para cada um, ou seja,
não seria possível debater tal questão, pois seria mera opinião. O belo ou o
feio nunca seriam algo que pudesse ser descrito de forma universal por todos. Os
personagens Sócrates e Hípias travam um debate argumentativo em que as duas
visões dos personagens sobre o que é o belo se completam, porém sem que eles
cheguem a uma conclusão definitiva.
Principais Obras:
- Os discursos da
circunstância.
- As obras
eruditas e as obras poéticas.
- Os nomes dos
povos
- Diálogo Troiano
- Elegias
- Tratados
arqueológicos
Filosofia
Sapiencial
- “A lei é o
tirano dos Homens”.
- As
verdadeiras leis são somente as da natureza: "São válidas em cada país e
do mesmo modo".
- “A Natureza une
os homens, enquanto a lei frequentemente os divide”.
- “Todos são
iguais não existe distinção entre homens livre e escravos, gregos ou bárbaros”.
- “Por natureza
ninguém nasce escravo, a lei é que tiraniza o homem”.
- “É melhor seguir
as leis da natureza do que as leis humanas”.
- “O semelhante é
por natureza parente do semelhante, mas a lei, tirano dos homens, é muitas
vezes contrária à natureza”.
- “O verdadeiro
saber será! à imagem e semelhança do Cosmos, um todo; o enciclopedismo é, para
o sábio, um dever e, de modo algum, uma vaidade. O discurso erudito tem, para o
espírito, uma trama que é do mundo; será, pois, um discurso totalizador, e sua
totalização não representará a nova reiteração de um real reduzido ao mesmo,
mas um fazer ver a complexidade e de integrar, sem as perder, as infinitas
variedades às quais o real aparece sempre novo”.
- “Para quem não é
uma unidade, não obstante as virtudes individuais constituírem os postulados
externos para a virtude absoluta que, através da presença das virtudes
separadas, é transformada em virtude total”.
- “Ó homens aqui
presentes! Creio-vos a todos unidos, parentes e concidadãos, não por lei,
porque o semelhante é por natureza parente do seu semelhante, mas a lei, como
tirana dos homens, em muitas coisas emprega a violência contra a natureza”.
- “Como tomar as
leis a sério, como acreditar ser necessário cumpri-las, se os próprios
legisladores as infringem e modificam?”.
Fontes:
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