quarta-feira, 22 de abril de 2020

Crátilo de Atenas

Crátilo de Atenas - (450 a.C)

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Foi um filósofo pré-socrático da Grécia antiga que era considerado um dos poucos discípulos do filósofo Heráclito de Éfesos. Sabe-se que ele floresceu em meados do século V a.C, porém a data de sua morte é incerta. Era visto como um dos primeiros filósofos a defender um conceito naturalista da linguagem. Sua historiografia é escassa, pois são poucos os dados coletados e produzidos a seu respeito, quase todas as informações do seu sistema de pensamento estão citadas em fontes indiretas. Platão escreveu uma obra intitulada de “Crátilo”, cujos indícios apontam para a possibilidade do personagem dessa obra ter sido o mesmo Crátilo que era discípulo de Heráclito. Segundo o filósofo Aristóteles, Crátilo teria sido um dos mestres de Platão antes deste ter se tornado discípulo de Sócrates. Pesquisadores apontam que as principais teses defendidas por Crátilo com base na filosofia Heraclicista discorriam ideias sobre: o fluxo universal; o mobilismo radical; a incognoscibilidade do real; e sobre a justeza dos nomes. Nesse contexto, ele traduzia seu conceito de “logos” discorrendo sobre os horizontes do pensamento, da palavra, do conhecimento, da sabedoria, e da linguagem. Sua filosofia teria exercido grande influência nas bases do pensamento cético.

Filosofia Mobilista

Crátilo aperfeiçoou as ideias de seu mestre Heráclito, pois enquanto Heráclito dizia que uma pessoa não poderia entrar duas vezes no mesmo rio, visto que na segunda vez nem a pessoa seria a mesma e nem o rio seria o mesmo, para Crátilo não seria possível entrar sequer uma única vez, pois na sua visão, a água que molhasse a ponta do pé não seria a mesma que iria banhar o calcanhar. Desse modo, sua doutrina é considerada como uma interpretação radical do pensamento de seu mestre. Nesse sentido, Crátilo levou ao extremo o conceito de “panta rei”, isto é, de “devir” criado por Heráclito, formulando sua teoria com base nas ideias de seu mestre, porém com um aprofundamento maior dessas teorias. Da mesma forma, ele dizia que era impossível dar um nome às coisas, pois estando “estas” em um constante “devir”, não poderiam em um segundo momento, serem mais “aquelas”. Argumentava que devido à impermanência rápida e a transformação constante das coisas, o conhecimento sobre elas seria impossível, ou seja, nada se poderia saber, nada se conseguiria afirmar. Limitava-se, portanto a apontá-las, contentando-se em apenas mover os dedos. Chegando a sugerir que o homem deveria silenciar a respeito da diferença entre a linguagem e a realidade das coisas. Crátilo teria estudado também as relações que as letras teriam com os objetos, dessa maneira, ele estudava como a natureza era simbolizada através da arte com uso da linguagem.   

Filosofia da Linguagem

Platão escreveu um diálogo chamado de "Crátilo" em que discorre sobre a gênese da linguagem e suas relações com a comunicação.  A obra dialoga entre duas correntes de pensamento que se dividem em: tese convencional e tese naturalista. Crátilo defendia a segunda corrente, pois acreditava que as coisas teriam um nome próprio por natureza. Durante o diálogo, Crátilo elabora questionamentos sobre os nomes das coisas, desse modo, ele problematiza ideias a respeito da origem das palavras e o sentido delas. É nessa obra que a famosa frase de Platão: “o pensamento é o diálogo da alma consigo mesma”, tornou-se conhecida. No decorrer do diálogo, Platão descreve que a linguagem oral seria uma cópia do pensamento e que a linguagem escrita seria uma cópia da linguagem oral, nesse sentido, ele prossegue fazendo reflexões sobre a natureza dos nomes e os seus possíveis significados. Embora defendesse a discrição para alguns assuntos, Crátilo possuía grande poder oratório em que descrevia sua dialética singular e autêntica, pontuando discursos retóricos que conduziam seus interlocutores a debates inconclusos.

Filosofia Sapiencial

+ “Todas as leis são igualmente justas”.

+ “Não se pode nunca afirmar se uma coisa é falsa ou verdadeira”.

+ “Todas as coisas possuem nomes justos conforme a sua natureza”.

+ “Ninguém se banha sequer uma única vez em um mesmo rio, pois a água que molha a ponta dos pés não é a mesma que toca o calcanhar”.  

 

Fontes:

ARISTÓTELES. Metafísica. Tradução do português. Textos adicionais e notas de Edson Bini. São Paulo. Edipro. 2012.

AUROUX, Silvain. A Filosofia da Linguagem. Campinas: Unicamp, 1998.

BORNHEIM, Gerd. Os Filósofos Pré-Socráticos. São Paulo. Cultrix, 1967.

CIVITA, Victor. Pré-Socráticos: Os pensadores. São Paulo: Nova Cultura LTDA. 1996.

DIELS, Hermann; KRANZ, Walther. Os Fragmentos dos Pré-socráticos. Berlim: Weidmannsche Buchhandlung, 1906.

KOYRÉ, Alexandre. Introdução à Leitura de Platão. Lisboa: Ed. Presença, 1984.

LAÊRTIOS, Diógenes. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. 2ª ed. Brasília. UnB. 2008.

MARCONDES, Danilo. Iniciação a História da Filosofia: Dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. 13ª ed. Rio de Janeiro. Zahar. 2010.

MARTINS, Mary Julia. Crátilo e a Origem dos Nomes. Rev. Internacional de Humanidades. Barcelona: FEUSP, 2007.

MUTSCHLER, Hans Dieter. Introdução à filosofia da natureza. Trad. Enio Paulo Giachini. São Paulo: Loyola, 2008.

PLATÃO. Diálogo: Crátilo e Teeteto. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 1988.

REALE, Giovanni. ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 3ª.ed. Vol.1. São Paulo: Paulus.1990.

RUSSELL, Bertrand. História da filosofia ocidental. São Paulo. Companhia editora nacional. 1957.

SILVA, André Luiz Braga. Platão e Heráclito: parricídio e Ressuscitação. Uberlândia: Rev. Ítaca 16, UFRJ, 2011.

SILVA, Kalina Vanderlei. Dicionário de Conceitos Históricos. São Paulo: Contexto, 2010.

VERNANT, Jean-Pierre. As origens do Pensamento Grego, São Paulo: Difel, 1981.

sábado, 11 de abril de 2020

Xenófanes de Cólofon

Xenófanes de Cólofon – (570 a 475) a.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Foi um filósofo pré-socrático da Grécia antiga que era considerado o fundador da escola Eleática. Direcionou seus estudos para o campo da Teologia, Filosofia, Poesia e Cosmologia. Figura na lista dois chamados filósofos da “phisis”, isto é, que investigavam na natureza a origem racional do cosmos. Escreveu suas obras em formato de poesia, muitas delas desapareceram com o tempo, tendo restado apenas alguns fragmentos ou citações em trabalhos de outros pensadores. Ficou conhecido como “o rapsodo”, pois vivia perambulando pelas ruas, recitando poemas contra as crenças religiosas e dominantes da época, por isso, também era visto como um andarilho errante. Segundo biógrafos, seu nomadismo deu a ele a sabedoria necessária para questionar, explicar e instruir-se por diversas áreas do conhecimento. De acordo com os historiadores, ele teria sido mestre do filósofo Parmênides de Eléia. Xenófanes nasceu em 570 a.C, na cidade de Cólofon região que hoje é conhecida como Turquia e que fica situada nas proximidades da Ásia menor, possivelmente faleceu com mais de 90 anos, por volta de 475 a.C, em algum local pelo sul da Itália.

Filosofia Teológica

No campo da teologia, Xenófanes foi um forte combatente do antropomorfismo, pois ele dizia que se os animais pudessem pintar, eles representariam seus deuses em forma de animais. Ele quis dizer que o homem tende a formular um conceito de Deus a sua própria imagem, queria demonstrar a unidade e perfeição de Deus, como sendo à essência de todas as coisas, com isso, ele teria rebatido principalmente o pensamento antropomórfico dos poetas da época. Sua filosofia se relacionava com uma concepção teológica de mundo. Na sua visão, só existe um Deus único, em nada semelhante aos homens, que é eterno, imóvel, puro e nunca foi gerado. Argumentava que era necessário dá ao conceito divino uma pura e elevada formulação, dessa maneira, ele pontuava que:

O tudo é “um” e o “um” é Deus. O verdadeiro Deus é único, com poder absoluto, clarividência perfeita, justiça infalível, majestade imóvel; que em nada se assemelha aos deuses homéricos sempre a perambular pelo mundo sob o império das paixões. (Xenófanes de Colófon).

O combate ao antropomorfismo consistia na ideia que ele tinha de que Deus não poderia ter formas humanas, essas formas não poderiam ser físicas, espirituais ou psicológicas. Desse modo, ele era considerado um “panteísta idealista”, pois argumentava que Deus seria o próprio cosmos, porém dotado de imutabilidade. O conceito de Deus para Xenófanes seria de um ser diferente da visão dos pensadores da época, com uma identidade abstrata, pois não possuía nenhuma qualidade entendida pelo homem, e não poderia ter nenhuma semelhança ou aparência com o homem. Nesse sentido, não teria nenhuma simetria material, espiritual ou estética, assim sendo, ele acreditava que a verdade das coisas era inatingível aos homens, porque mesmo que alguém dissesse a verdade sobre algo, ele não poderia saber o que seria de fato um axioma da verdade. Para Xenófanes, Deus não teria origem, pois ele acreditava que se Deus pudesse nascer, logicamente também poderia morrer, pois, o que tivesse origem também teria um fim. Então, a realidade seria definida pela opinião e aparência das coisas. Embora defendesse a existência de apenas um Deus supremo, ele acreditava na possibilidade da haver seres superiores aos humanos e inferiores ao Deus supremo, ou seja, semideuses. Devido a sua visão de combate ao pensamento antropomórfico, ele foi considerado por muitos historiadores como sendo um reformador religioso.


Filosofia da Natureza

Estabeleceu como “arché” do universo um elemento chamado de “terra”, essa substância seria o principal elemento de formação das coisas na natureza. Dessa forma, esse princípio teria como características básicas o conceito de “unicidade” e “imutabilidade”. A “terra” seria o princípio físico das coisas, principalmente do homem, que na sua visão era formado de “terra e água”, assim sendo, ele definia que: “tudo vem da terra e para ela volta”. Sua crença panteísta trabalhava um conceito idealista de que haveria uma unidade em toda a matéria. Essa ideia de “Um” não era apenas uma noção de matéria, mas estava relacionado também ao conceito de “Deus”. Ele argumentava que o universo seria “uno” e que essa singularidade era vista também como uma totalidade, isto é, a “unidade do todo” com um aspecto esférico.

Ao observar, em seus estudos, os fósseis de animais, ele conseguiu formular evidências sobre a teoria da “História da Terra”, percebendo que alguns fósseis de animais marinhos, estariam em locais distantes e diferentes uns dos outros, desse modo, ele compreendeu que em outros tempos àqueles locais poderiam estar embaixo da água. Teorizava que os ventos e as nuvens surgiam da água, pois explicava que a força que impulsiona o vento, vem do mar. Definia que o arco-íris era formado por uma espécie de nuvem púrpura, vermelha, roxa, azul, e amarela; Na sua cosmologia, ele presumia que o Sol seria um novo Sol a cada dia, pois segundo ele, o Sol era formado por pequenas fagulhas que se combinavam ao amanhecer e desapareciam no fim da tarde. Desse modo, ele acreditava na existência de infinitos Sóis e Luas. Dizia que o movimento era uma ilusão, pois seria na verdade a separação entre o percebido e o refletido.

Filosofia Moral

Destacava os valores intelectuais enaltecendo a superioridade da virtude e do comedimento. Dizia que essas seriam as forças verdadeiras para o desenvolvimento do “logos”. Para ele, o homem deveria viver em busca da sabedoria e dos prazeres de forma sociável, isto é, mantendo o equilíbrio em relação aos prazeres, sem grandes excessos. Explicava que o saber era mais importante que a aparência e acreditava que o progresso era conquistado através da sabedoria. Dessa forma, pontuava os valores da sabedoria e da inteligência, como sendo valores superiores, pois a moral do sábio seria superior a moral dos atletas, aos quais teriam destaques, em sua época, pela força física e pela estética corporal. Para Xenófanes, o que tornava melhor os homens e as cidades (polis) em que eles viviam era à força da inteligência e da sabedoria, e não a força física. Esse pensamento visava combater a valorização que os gregos davam para a força física, pois não adiantava lutar por um corpo perfeito, quando na verdade, tudo teria vindo da terra e para ela retornaria. Nesse sentido, ele condenava a imoralidade dos deuses da mitologia grega, criticava a crença pitagórica na transmigração da alma e censurava o vício da luxúria. Ele defendeu alguns valores éticos que influenciaram outros filósofos que o sucederam.

Curiosidades

Xenófanes ironizava o conceito de metempsicose descrito por Pitágoras, dessa feita, ele descreveu um episódio sobre Pitágoras, que este, passando um dia por um cão que estava sendo espancado, tomou-se de piedade e pediu ao dono do animal que parasse de bater-lhe, pois se tratava de um amigo de Pitágoras, reencarnado em cão, e que este reconhecera ao ouvi-lo gemer.

Obras:

- Sobre a Natureza

- Elegias

- Paródias

- Fundação de Cólofon;

- Colonização de Eléia;

 

Filosofia Sapiencial

- “É preciso um sábio para reconhecer um sábio.”.

- “Não é justo usar a força contra a sabedoria.”.

- "Nenhum ‘homem’ conhece a verdade ou a certeza e nenhum nunca saberá.”

- “O mundo não foi gerado, pois é eterno e incorruptível”.

- “Os etíopes dizem que os seus deuses são de pele escura e possuem o nariz achatado, os trácios, que os seus são loiros e de olhos azuis.”.

- “Se os bois e os cavalos tivessem mãos e pudessem pintar e produzir obras de arte similares às do homem, os cavalos pintariam os deuses sob forma de cavalos e os bois pintariam os deuses sob forma de bois.”.

- “Todo inteiro vê, todo inteiro pensa, todo inteiro ouve”.

- "Não disse Deus tudo a nós, mortais, quando o tempo começou, apenas através de uma investigação demorada o conhecimento ao homem aportou".

- “Os mortais imaginam que os deuses foram gerados e que têm vestuário, fala e corpos iguais aos seus.”.

- “Sem esforço tudo vibra com o coração do pensamento”.  

- “O que de belo e honesto os deuses não concedem aos homens senão o poder de muito trabalho e persistência.”

 - “Tudo aos deuses atribuíram Homero e Hesíodo, tudo quanto entre os homens merece repulsa e censura. Roubo, adultério e fraude mútua".

- “É de louvar-se o homem que, bebendo, revela atos nobres, como a memória que tem e o desejo de virtude, sem nada falar de Titãs, nem de Gigantes, nem de Centauros, ficções criadas pelos antigos. ou de lutas civis violentas, nas quais nada há de útil”.

 

Fontes: 

ARISTÓTELES. Metafísica. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2012.

BORNHEIM, Gerd. Os Filósofos Pré-Socráticos. Cultrix, São Paulo, 1967.

BURNET, John. A aurora da filosofia grega. 1ª ed. Rio de Janeiro: PUC RIO, 2007.

CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia. Vol. 2. São Paulo. Companhia das letras. 2010.

CIVITA, Victor. Pré-Socráticos: Os pensadores. São Paulo. Nova Cultura LTDA. 1996.

DUMONT, Jean. Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: EdUnB, 2005.

FELIPE, Luís. Bellintani. Ribeiro. História da filosofia I. Florianópolis: Filosofia/Ead/UFSC. 2008.

GUTHRIE, William. A history of Greek philosophy . Londres: Cambridge Univ. Press. 1962.

HADOT, Pierre. O que é a Filosofia antiga? São Paulo: Lisboa, 1999.

HAMLYN. David. W. Uma história da filosofia ocidental. Rio de Janeiro. Jorge Zahar. 1990

HOBUSS, João. Introdução à história da filosofia antiga. Pelotas. Dissertatio Filosofia. 2014.

KIRK, Geoffrey. RAVEN, John. Os Filósofos pré-socráticos. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1994.

LAÊRTIOS, Diógenes. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. 2 ed. Brasília. UnB. 2008.

MARCONDES, Danilo. Iniciação a História da Filosofia: Dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. 13.ed. Rio de Janeiro. Zahar. 2010.

REALE, Giovanni. ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 3.ed. Vol.1. São Paulo. Paulus.1990.

RUSSELL, Bertrand. História da filosofia ocidental. São PauloCompanhia editora nacional. 1957.

SANTOS, Mário. José. Os pré-socráticos. Juiz de Fora, Editora UFJF, 2001.

SELL, Sérgio. História da Filosofia I. Palhoça. UnisulVirtual. 2008.

VERNANT. Jean Pierre. Mito e pensamento entre os Gregos. Rio de Janeiro. PUC.

domingo, 5 de abril de 2020

Parmênides de Eleia

Parmênides de Eleia – (530 a 460) a.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Foi um filósofo da antiguidade grega que era considerado o principal representante da Escola Eleática. Alguns historiadores o conceituam como sendo um dos pais do imobilismo universal. Refutou as ideias do filósofo Heráclito de Éfeso, fazendo-lhe contraposição de pensamentos. Pertencia a uma família nobre, tendo sido admirado pelos sábios da época por sua elevada conduta moral e ponderada. Exerceu grande influência nas ideias de Platão. A escola eleática, à qual ele fez parte, teve filósofos notáveis como Zenão de Eléia, Melisso de Samos e Xenófanes, que foi seu mestre. Era amigo de um filósofo pitagórico conhecido por Amínias, por isso teria estudado também algumas ideias da Escola pitagórica. Parmênides era um poeta e escreveu sua  obra em versos hexâmetros semelhantes aos de Homero, além disso, ele atribuiu suas ideias a uma revelação divina. Escreveu uma obra intitulada “sobre a natureza e sua permanência”. Nesse texto, ele teria afirmado que a tal revelação divina, teria lhe iluminado sobre a verdade em relação à imutabilidade das coisas. Ele nasceu aproximadamente em 530 a.C na cidade grega de Eleia (atual Itália), situada na região da Magna Grécia. O nascimento e morte de Parmênides  ainda não é bem definido por historiadores, tendo vivido aproximadamente entre os séculos VI e V a.C. Acredita-se que tenha falecido por volta de 460 a.C.

Filosofia Cosmológica

Para o descrito filósofo, havia uma espécie de organização racional do universo que era unitária, infinita, indivisível, indestrutível, imutável e imóvel. Nesse sentido, o “ser” das coisas era o princípio fundamental de tudo, pois seria baseado em uma espécie de ideia infinita e universal. Na sua visão, toda a realidade seria imutável, estática, e sua essência estaria incorporada na individualidade divina do “ser-absoluto”, ao qual permearia todo o universo. Esse “ser” na visão de Parmênides era onipresente, já que qualquer descontinuidade em sua presença seria equivalente à existência de seu oposto, isto é, do “não-ser”. Desse modo, ele concluía que: o que está fora do “ser”, não é “ser”, pois o “não-ser” é nada; o “ser”, portanto, “é”. Ele acreditava que o “ser” seria a causa primeira de tudo no universo, essa visão do “ser” era uma visão de matéria, como se dessa matéria que era denominada “ser”, surgisse tudo no universo. Parmênides observava as mudanças físicas que ocorriam no mundo como sendo uma mistura em que participam o “ser” e o “não ser”, resultando disso tudo um “vir-a-ser”. A mistura seria feita pelo desejo e quando o desejo era satisfeito o “ser” e o “não-ser” novamente se separavam. Para ele, não existia nada além do “ser”, desse modo, ele dizia que: 

“se o mundo é logicamente imutável e o mundo que observamos é completamente mutável, podemos deduzir que esse mundo só pode ser falso e tudo não passa de uma ilusão. O mundo sensível é uma ilusão. Uma vez que o mundo é cheio, não há espaço para o movimento e, portanto, nem para a mudança”. (Parmênides).

Nesse sentido, ele quis dizer que só seria possível chegarmos a alguma verdade universal, se conseguíssemos nos desprender dos sentidos, pois o que é verdadeiro só poderia ser capitado pela razão. Desse modo, afirmava que no caminho da verdade que seria a realidade, tudo “é o que é”, pois a existência seria atemporal, uniforme, engendrada, necessária e indestrutível. Já em relação ao movimento dizia ser impossível, negando a existência do nada e do “não-ser”. Pode-se concluir que o “ser” apenas “é”, pois se tivesse sido criado por algo, teria sido originado por outro “ser”. Ele também não poderia ter sido criado do nada, pois se assim fosse, esse nada, que seria o “não-ser”, então, existiria, e como não existe o “não-ser”, pode-se deduzir que o “ser” simplesmente “é”.

Filosofia ontológica

Parmênides abordou temas relacionados à ontologia do "ser" e sobre a "razão lógica". A ciência conhecida como ontologia estuda o ser enquanto ser, ela nasceu do embate entre as ideias de Parmênides e Heráclito. Nesse sentido, enquanto Heráclito afirmava que um homem não poderia entrar duas vezes no mesmo rio, pois tudo estaria em constante movimento, Parmênides dizia o contrário, afirmando que tudo estaria em um eterno repouso. Explicava que só poderia existir o “ser”, desse modo, ele pontuava que: “o ser é e o não ser não é.”. O devir de Heráclito seria o processo de mudança entre o “ser” e o “não-ser” ao qual chamou de “vir-a-ser”. Para Parmênides esse “vir-a-ser” não seria possível, pois dizia que esse processo de mudança era ilusório, dado que, o “vir-a-ser” seria na verdade uma ilusão ofuscada pelos sentidos do corpo. Argumentava que a ideia apontada por Heráclito de que as mudanças, isto é, o “vir-a-ser” seria um “ser”, era completamente equivocada, porque na verdade essa mudança não era real e o conceito de “vir-a-ser” não poderia ser considerado algo como o “ser”. A frase de Parmênides que sintetizava esse pensamento era “toda mutação é ilusória”. 

Para Parmênides a sensação levava o indivíduo pelo caminho errado da falsa verdade, a sensação gerava contradições e isso levaria os indivíduos a confundirem o “ser” com o “não ser”. Ele criou uma teoria sobre o que estaria por trás das aparências e das transformações das coisas. Em vista disso, ele fazia comparações entre pares de opostos, explicando as divisões e contradições dos pares de opostos. Assim sendo, ao comparar os pares de opostos, ele fazia a mesma analogia da luz com a escuridão, dizendo que o segundo par era a negação do primeiro. Cada um seria apenas como a negação do outro, e então, de maneira metafisica, o “não-ser”, seria apenas a negação do “ser”. O “ser” e o “não-ser” originavam o “vir-a-ser”, porém esse “vir-a-ser” seria uma ilusão, pois só existe o “ser”, dado que, o “não-ser” é apenas a negação do “ser”.

Filosofia da Metafísica

Para alguns estudiosos ele também seria o fundador da metafísica do ser. Na filosofia de Parmênides, a ideia de pensar e de ser era a mesma coisa, seu pensamento influenciou muito o filósofo Platão sobre o conceito de "doxa", daí ele explicava que o caminho da opinião e dos sentidos, levaria a uma conclusão falsa. Parmênides trabalhava a ideia de que a “alethéia” seria a luz da verdade, daí o "ser" seria tudo aquilo que pode ser pensado. Já o que "não é", seria o “não-ser”, e esse não poderia ser pensado. O “não-ser” seria a “doxa”, que seria o caminho da opinião, esse caminho era ilusório, pois a via da verdade que era o pensamento, deveria ser falado, logo, para Parmênides existe uma relação de identidade entre o ser, o pensar e o dizer, já em vista do “não-ser”, este seria vazio, ausente e não existente. Para Parmênides, apenas as divindades possuíam essa verdade, ao homem seria dado conhecer apenas a ilusão ou caminho da opinião.

O pensamento de Parmênides se apresenta como uma ideia de oposição entre a verdade e a aparência das coisas. Essa ilusão seria vista pelos sentidos que nos mostram o “ser” e o “não ser”, porém também levaria a vários erros. A verdade, portanto, poderia ser buscada pela razão, pois o “não-ser” não existe, já que ao se pensar em nada, nada se pensa da mesma forma que ao não se falar, nada se fala. Ele dizia que só podemos pensar e expressar o que pensamos através de algum objeto, e esse objeto já demonstra que algo existe, ele já é um "ser". Dessa maneira ele pontuava que o “ser” “é”, e não pode “não-ser”. Essa ideia fundamentou as bases da metafísica, já que o “ser” não é apenas o “ser” da natureza, mas também o "ser" do homem, do pensar, do agir e de qualquer coisa que possa ser imaginada.

Filosofia Monista

O filósofo argumentava que a mudança era uma ilusão, pois somente existem o “ser” e o “não-ser”, o “vir-a-ser” seria, portanto uma ilusão dos nossos sentidos, ou seja, a ideia de movimento era uma ficção. O pai do imobilismo universal explicava boa parte do seu pensamento se baseando no conceito de monismo, pois enquanto Heráclito dizia que havia uma pluralidade de realidades, Parmênides revelava a existência de apenas uma realidade, esse embate entre os dois filósofos ficou conhecido como “mobilismo versus imobilismo”.  Outro conceito notável em sua obra foi a “lei de identidade”, em que ele descrevia que se a realidade era caracterizada como algo imutável, então, quando uma coisa mudasse, ela deixaria de ser o que era, sem ainda ter se tornado algo, portanto, pode-se concluir que esse algo não é nada.

Filosofia da Linguagem

Seu poema foi estruturado em três partes principais: proêmio, realidade e opinião. Parmênides também desenvolveu o seguinte pensamento sobre as vias da indagação: “o que é” que pode ser traduzido também por “não pode ser que não seja”, seria chamada de "persuasão" e traduzida por Parmênides de “a verdade”. A outra via então seria: “o que não é” e que pode ser definido por “é preciso que não seja”. Nessa via ele chamou de “impraticável”, visto que, “o que não é” não se pode conhecer e nem se expressar. Esse pensamento é construído através de um diálogo imaginário pela morada da deusa justiça, que segundo ele, teria o poder de conduzir o homem ao coração da verdade.

A obra aponta os conceitos sobre as chamadas “via da verdade” e a “via da opinião”. Onde ele descreve a narração da viajem simbólica que faz o "homem que sabe". Nela ele diz assim: o “homem que sabe” faz uma viagem de carro e esse carro é conduzido por duas éguas, ao qual seria impulsionado pelas Helíades. O caminho por onde ele é conduzido, é um caminho distante do caminho usual dos mortais, esse caminho teria a via do dia e a via da noite, durante o caminho ele é interrompido por um enorme portal de pedra, cuja guardiã é Dice (deusa da justiça). As filhas do Sol persuadem e seduzem a deusa, e esta hipnotizada abre a porta para que o carro passe. Logo ele é recebido por ela, a Deusa, esta então lhe explica, que em primeiro lugar, ele não foi enviado por um destino funesto, mas pela lei e pela justiça. Então, por isso, segue que seja necessário que ele conheça todas as coisas, tanto "o coração inabalável da verdade persuasiva" bem como também "as opiniões dos mortais", porque, apesar de que nestas “não existe convicção verdadeira”, no entanto desfrutavam de prestígio. 

 

Filosofia Sapiencial

- "O movimento e a mudança são impossíveis".

- "Não há espaço vazio; O mundo é cheio".

- "O ser é e não pode não ser".

- "O pensamento e o ser são a mesma coisa".

- "O ser é imóvel porque se se movesse poderia vir a ser e então seria e não seria ao mesmo tempo".

- "O mundo sensível é uma ilusão".

- “É necessário que o Ser, o dizer, e o pensar sejam”.

- "O Ser é uno, eterno, não-gerado e imutável".

- "Não se confia no que se vê".

- "A essência das coisas não muda". 

- "O ser é e o "não-ser" não é".

- "Não importa por onde eu comecei, pois para lá eu sempre voltarei".

- "A linguagem é a etiqueta das coisas ilusórias".

- "Só o que é, é".

- "Uma vez que o mundo é cheio, não há espaço para o movimento e, portanto, nem para a mudança".

- “O que é, é – e não pode deixar de ser”.

  

Fontes:

ARISTÓTELES. Metafísica. trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2012.

CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia. Vol. 2. São Paulo. Companhia das letras. 2010.

CIVITA, Victor. Pré-Socráticos: Os pensadores. São Paulo. Nova Cultura LTDA. 1996.

FELIPE, Luís Bellintani Ribeiro. História da filosofia I. Florianópolis. Filosofia/Ead/UFSC. 2008.

HAMLYN, David. Uma história da filosofia ocidental. Rio de Janeiro. Jorge Zahar. 1990.

HOBUSS, João. Introdução à história da filosofia antiga. Pelotas. Dissertatio Filosofia. 2014.

HUISMAN, Denis. Dicionário dos Filósofos. São Paulo: Martis Fontes, 2001.

LAÊRTIOS, Diógenes. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. 2 ed. Brasília. UnB. 2008.

MARCONDES, Danilo. Iniciação a História da Filosofia: Dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. 13.ed. Rio de Janeiro. Zahar. 2010.

PARMÊNIDES. Da Natureza. 3ª ed. trad: José Trindade Santos. São Paulo: Loyola, 2013. 

NIETZSCHE, Friedrich. Filosofia na Idade Trágica dos Gregos. São Paulo: Nova Cultural, 1999.

REALE, Giovanni. ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 3.ed. Vol.1. São Paulo. Paulus.1990.

RUSSELL, Bertrand. História da filosofia ocidental. São PauloCompanhia editora nacional. 1957.

SELL, Sérgio. História da Filosofia I. Palhoça. UnisulVirtual. 2008.

VERNANT. Jean Pierre. Mito e pensamento entre os Gregos. Rio de Janeiro. PUC.