quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Soares Bezerra

Soares Bezerra – (1810 a 1887) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Manuel Soares da Silva Bezerra foi um filósofo cearense pertencente a corrente de pensamento chamada de “catolicismo ultramontano”. Considerado um profundo estudioso das línguas latinas, ele se especializou no estudo da filologia, escrevendo importantes tratados sobre questões filosóficas e suas relações com a linguagem. Filho do Militar Antônio Bezerra de Meneses (1780 a 1851) e de Fabiana de Jesus Maria Bezerra de Meneses. Era irmão do conhecido filósofo espírita “Bezerra de Menezes”. Teve dezoito filhos, entre eles está, outro grande filósofo cearense, o ilustre “Antônio Bezerra” (1841 a 1921). Bacharelou-se pela Faculdade de Direito de Olinda, em 1836. Atuou como filósofo, professor, ensaísta, político e magistrado, tendo exercido parte de seu magistério no Liceu do Ceará. Foi também juiz municipal de Quixeramobim e prefeito de Fortaleza. Chegou a assumir o cargo de presidente provincial do Ceará por alguns dias pelo partido conservador. Assumiu várias outras funções importantes na administração pública do Ceará. É o patrono da cadeira de número 26 da Academia Cearense de Letras. Recebeu vários títulos de ordenação católica. Nasceu na cidade de Jaguaretama, em 1810 na localidade conhecida como Riacho do Sangue e faleceu no município de Fortaleza, por volta de 1887.

Filosofia Teológica

Era visto como um conceituado intelectual e líder católico que tinha um espírito desapegado aos vícios humanos, por isso não se envaidecia em seus trabalhos pela busca desmedida do fausto social. Como um grande defensor das causas religiosas, procurava sempre transparecer de maneira respeitosa suas crenças. Defendia os valores cristãos da igreja e os conceitos de civilidade. Era visto por muitos como um homem justo, humilde e modesto, praticava o bem sempre ancorado nos sacrossantos princípios morais da igreja. Pregava que grande parte das máculas políticas estava ligada a falta de religiosidade das pessoas. Advogava de maneira contrária aos polemistas e cientificistas que atacavam os dogmas da fé católica. Ensinava que toda lei que não se fundamentava nos valores morais seriam leis injustas, dessa forma, advertia que quem praticasse essas leis imorais estariam exercendo a tirania ao invés da justiça.

Discorria que Deus teria se revelado ao homem por meio de um mundo físico que se relacionava com um plano moral. Dessa maneira, Deus teria dotado o homem de sensibilidade, imaginação e entendimento. Nesse contexto, ele relatava que primeiramente o homem recebia a impressão dos objetos através dos sentidos corpóreos, logo depois, essa sensibilidade apreendida era transmitida para a imaginação que chegava ao cérebro em forma de imagem, visão ou espectro. Posteriormente, a reflexão sobre as imagens ou fantasmas, que se traduziam como sendo uma “luz intelectual”, construía uma faculdade de “universalizar o singular”, essa virtude iria aos poucos se espiritualizando em ideias que originavam o entendimento. Nesse sentido, o entendimento se gera de “si mesmo para si mesmo”, logo, ele tende a se manifestar por sinais e realizar-se por ações, o resultado disso é o “conhecimento” que também se chama de “verbo”.

Filosofia da Linguagem

Utilizava-se de rigor filosófico na confecção de suas obras sempre procurando se polir com aspectos inovadores. Explicava que a linguagem precisava ser estudada, a partir de uma análise lógica das proposições. Desse modo, ele ia delimitando os conceitos e discriminando as definições linguísticas. Dissertava que a gramática era a arte que ensinava as leis da expressão do pensamento por meio das palavras. Distinguia os estudos da gramática universal e da gramática particular, pontuando que a primeira teria uma essência mais geral fundamentada em todas as línguas, enquanto que a segunda estaria ancorada em adaptações particulares de cada região. Diferenciava o conceito de palavra e de vocábulo, argumentando que palavra seria: “a expressão geral do pensamento por sons articulados”. Enquanto que o vocábulo era: “a expressão particular da ideia por sons articulados”.

Filosofia do Ultramontanismo

Segundo algumas fontes históricas, ele foi um grande defensor do chamado “catolicismo ultramontano”. Protegeu de maneira sistemática as teorias do tradicionalismo católico, sendo um forte idealista cearense dessa doutrina. Nessa feita, ele abraçou as causas dessas vicissitudes do tradicionalismo no Ceará, relacionando as ideias do moralismo francês com o transcendentalismo teológico. Essa corrente de pensamento ganhou destaque inicialmente na idade média, com a ideia de que as doutrinas católicas não poderiam se ancorar apenas em pensadores ligados a Roma ou a Itália tradicional, ou seja, deveriam ir “além das montanhas”, daí vem o termo "ultramontanismo". Entretanto, a doutrina passou a ganhar maior destaque, após a revolução francesa, tendo na França seu maior polo de firmação. Ela fazia oposição ao chamado “galicanismo”. Nesse contexto, a ala mais radical dos ultramontanos defendia o poder Papal como única bússola orientadora para as questões ligadas a fé e a disciplina da igreja. Dessa forma, eles queriam que a Igreja tivesse mais autonomia em relação ao Estado, isto é, uma maior independência da Igreja em relação ao governo.

Curiosidades:

Era seu avô materno o revolucionário “Antônio Bezerra de Sousa e Meneses”, que participou da Confederação do Equador. Atuou como chefe comandante das armas. Seu avô teria sido condenado a pena de degredo perpétuo para o interior do Maranhão, em 1825, por ter participado dessa revolta. Contudo, outras fontes afirmam que ele teria sido na verdade condenado a morte, mas que faleceu antes da pena ser executada.

Foi seu irmão também o “Dr. Teófilo Rufino Bezerra de Menezes” que era um renomado jurista e professor do Liceu do Ceará, esse seu irmão teria fundado uma pequena capela católica no antigo “Bairro Vermelho” que é conhecido atualmente como “Antônio Bezerra”, posteriormente essa capela cresceu e se tornou uma igreja conhecida como “paróquia Jesus, Maria e José”.

Obras:

- Compêndio de Gramática Filosófica;

- Os dogmas políticos do Cristão;

- O Inferno;

- Compêndio de Gramática da Língua Nacional;

- Questões de Gramática Filosófica;

- O que é Protestantismo;

- Os deveres do Cristão

- Compêndio de gramática portuguesa para uso do Ateneu Cearense, no Liceu e nas escolas primárias;

Filosofia Sapiencial

- “Não desejo ao vincular ideias e lições, introduzir na circulação, moeda falsa por verdadeira".

- “Não me limito aos “tratadinhos” de palavras que estão em moda, com as novidades de algumas subtilezas e argúcias”.

- "Sim: quem reflete sobre nossa moralidade, comparando-a com a dos séculos passados, não deixará de perceber que dela só conservamos o verniz e a aparência”.

- "Suprimindo-se a repressão moral suprime-se igualmente a repressão legal pela consequência de que a autoridade, que a exerce, é tal qual aquele a quem reprime e que por isso seus atos são tirania e não justiça".

- “Como os sentidos lhe transmitiram e imprimiram-lhe, a imaginação ou fantasia, faculdade sensitiva, que não excede o particular, não representa senão as imagens ou fantasmas nas condições individuais de tempo e lugar”.

- “O som simples ou articulado que não é veículo de alguma ideia, não é palavra nem vocábulo; porque o pensamento, querendo fazer-se conhecer, procura um veículo no som da voz, une-se á voz, encarna de alguma sorte na voz, faz-se voz, são inseparáveis”.

- “Não me perdoaram os críticos, estou certo; mas a quem perdoaram eles? Não espero ser a exceção: nem é possível; porque Deus deu ao homem a variedade no pensar para convencer a cada um da falibilidade da razão individual, e com isso, sujeitá-lo a razão social ou universal”.

- “Saído das mãos de Deus, não podia o homem sem nenhuma ideia, sem nenhum conhecimento dele, percebe-lo, Concebê-lo, e conhecê-lo, nem conhecer-se a si, a lei, o dever, o bem e o mal moral, senão pelo ensino de seu Criador, pela palavra divina, que devia receber e transmitir a sua descendência, sob pena, de perpétua ignorância do que mais lhe importava saber”.

Fontes:

AMORA, Manoel Albano. A Academia Cearense de Letras: Síntese Histórica (1894 – 1954). Revista da academia cearense de letras. Fortaleza: ACL, 1954.

BEZERRA, Antônio. O Ceará e os Cearenses. Fortaleza: Fundação Waldemar Alcântara, 2001.

BEZERRA, Antônio Herbert Paz. Genealogia dos Bezerra de Menezes - História e Diáspora. Fortaleza: Premius, 2004.

BEZERRA, Soares. Compendio de gramática filosófica. Internet: Biblioteca Digital Luso Brasileira, 1861.

CASTELO, Plácido. A História do ensino no Ceará. Fortaleza: IOCE, 1970.

DIAS, Milton; ALCÂNTARA, Lúcio. Dois Discursos Acadêmicos. Fortaleza: ACL, 1978.

GALVÃO, Miguel Archanjo. Relação dos cidadãos que tomam parte no governo do Brasil: Período de Mar. 1808 a Nov. de 1889. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1984.

GIRÃO, Raimundo. A Academia de 1894. Fortaleza: ACL, 1975.

JÚNIOR, João Geraldo dos Santos. Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP): um movimento ultramontano na Igreja Católica do Brasil? Teses e Dissertações. São Paulo: PUC, 2008.

LIMA, Francisco Augusto de Araújo. Genealogia da Ribeira do Jaguaribe. Site: Famílias Cearenses. Internet: Acesso, 2022.

LUSTOSA, Oscar Figueiredo. A Igreja Católica no Brasil e o regime republicano. São Paulo: Loyola, 1990.

MONTENEGRO, João Alfredo. O contexto Histórico da Criação da Diocese no Ceará. Revista Acadêmica da Prainha. Fortaleza: Kairós, 2004.

POMPEU, Gina Vidal Marcílio; TASSIGNY, Mônica Mota. História de nossa gente. Fortaleza: ALC, 2004.

SÁ, Murilo Bezerra. Famílias Cearenses: Estudo genealógico dos Bezerra de Menezes. Revista Instituto do Ceará. Fortaleza: RIC, 1946.

STUDART, Guilherme. Dicionário Bio-Bibliográfico Cearense. Fortaleza: Typografia, 1910. 

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Capistrano de Abreu

Capistrano de Abreu - (1853 a 1927) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

João Capistrano Honório de Abreu foi um filósofo historicista cearense que atuou nos estudos da historiologia crítica e da literatura nacional. Afirmou-se como sendo adepto do chamado “Realismo Histórico”. Pretendia com seus estudos descobrir o que ele chamava de "as leis fatais que regem a sociedade brasileira”. Transcorreu seus pensamentos também pela linha cunhada de “Determinismo Sociológico”. Colaborou com os campos da etnografia e da linguística, sendo considerado um “etnolinguístico”. Realizou seus primeiros estudos em algumas escolas de Fortaleza, tendo concluído o curso de humanidades na cidade do Recife. Laborou como funcionário da Biblioteca Nacional, tendo também lecionado Geografia e História do Brasil no Colégio Pedro II. Foi consagrado como um dos primeiros historiadores do Brasil com grande relevância entre os pensadores da historiografia moderna. Recebeu o título de “o príncipe dos historiadores brasileiros”. Chegou a realizar encontros com o escritor José de Alencar, onde foram produzidas pesquisas sobre o folclore cearense. É tido como patrono da cadeira de número 15 da Academia Cearense de Letras e também da cadeira 23 da Academia Brasileira de Literatura e Cordel. Participou como membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Era filho do Militar Jerônimo Honório de Abreu com a Dona Antônia Vieira de Abreu. Nasceu no município de Maranguape, no ano de 1853 e faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 1927, vítima de uma pneumonia. 

Filosofia da História

Desenvolveu grandes trabalhos a respeito do universo historiográfico brasileiro. Teve como principais traços que marcaram sua obra: um estudo sistemático das fontes e um olhar analítico sobre os fatos históricos. Suas pesquisas compreenderam uma visão moderna em relação ao prisma da interpretação e investigação dos fatos. Seus ensaios se direcionaram em contraposição aos pensamentos do historiador brasileiro “Adolfo de Varnhagen”. A pesquisa de Capistrano construía um estudo historiográfico que visava ensinar e discutir a “História” para além dos fatos, nomes e datas. Aprofundou-se nos estudos da história colonial brasileira, com isso, desenvolveu uma teoria a respeito da literatura nacional. Ancorou sua tese nos princípios conceituais sobre os climas, a geografia e as raças, criticando os mitos romantizados que foram construídos sobre o índio brasileiro, pois estes eram vistos como “bons selvagens”. Combateu o simbolismo eurocêntrico que intencionava justificar o colonialismo nos trópicos brasileiros. Essa inovação, de conceber um novo olhar historiográfico, impulsionou uma aproximação da vida cosmopolita do litoral com a sociedade agreste do sertão.

A linha conceitual desenvolvida por Capistrano delimitou os primeiros modelos de construção de um pensamento social no Brasil, contribuindo com a história da inteligência brasileira. Recorreu às ciências sociais como ferramenta de auxílio na construção de sua obra. Segundo relata Morais (2010, p.9), Capistrano explicava que existia uma comunidade política brasileira, em ascendência, que estava se formando, em meio a um confuso processo de mudanças e complexos conflitos. Existia de um lado o “povo” que representava o espírito de “nação” contra um “Estado” que simbolizava um “governo”.  Dessa tensão é que se formaria o Brasil. Ambos estavam pensando um projeto de país sem muita clareza e consciência de qual lado pertenciam de fato ou porque se digladiavam. Dito isto, surgiu a seguinte reflexão de Capistrano: "punge-me sempre e sempre a dúvida: o brasileiro é um povo em formação ou em dissolução?".

Filosofia Política

Foi um dos fundadores da Academia Francesa do Ceará, local onde eram debatidas as questões sobre política, cultura, literatura e filosofia. Defendia os ideais progressistas e algumas questões contra a igreja. Vivenciou a influência da máxima chamada “surto de novas ideias” que tinha sido idealizada pela Escola de Recife. Sua obra representava um novo olhar expressivo do contexto sócio-político brasileiro, delineando uma roupagem que destacava os elementos nacionais.  A vanguarda do seu pensamento se entrelaçava entre os campos das ciências humanas, econômicas, sociológicas, antropológicas, políticas e filosóficas, com isso, refutava o conservadorismo que era enaltecido de maneira centralizada. Sua visão abriu uma nova fase de construção historiográfica, delimitando novos horizontes filosóficos da história do Brasil.

Advertia a respeito da importância que o historiador teria no contexto geral, atuando com responsabilidade social e realizando ações de utilidade pública em prol da sociedade. Denunciou através de cartas o burocratismo atravancado que obstruía a pesquisa no Brasil. Esse burocratismo de prática autoritária visava legitimar os interesses e privilégios que alguns intelectuais possuíam de ter acessos exclusivos a livros e documentos com mais facilidade, exercendo, dessa forma, seu objeto de poder, através do uso e do monopólio dos instrumentos de pesquisa. Teria sido convidado para fazer parte da Academia Brasileira de Letras, mas esquivou-se de tomar posse nessa casa por questões políticas e pessoais. Segundo algumas fontes, Capistrano era avesso a títulos altivos, vaidades imperiosas e condecorações acadêmicas, justificando seu posicionamento, por conta de sua forte atuação profissional como historiador que deveria ser isonômica e o mais imparcial possível. Nesse sentido, ele dizia que: “minhas aspirações se reduzem a morrer sem escândalos”.

Anedota

Na transição do Brasil império para o Brasil república aconteceu uma reforma na educação brasileira que culminou com a extinção da disciplina de História do Brasil dos currículos escolares, nesse ínterim, Capistrano foi colocado em disponibilidade e convidado a lecionar a cadeira de História Universal, conta-se que ele teria se recusado, e a partir daí, passou a se dedicar nas pesquisas sobre a História do Brasil, resultando em sua obra prima intitulada de “Capítulos da História Colonial”.

Obras

Estudo sobre Raimundo da Rocha Lima; José de Alencar; O Descobrimento do Brasil; A língua dos Bacaeris; Capítulos de História Colonial; Dois documentos sobre Caxinauás; Caminhos Antigos e o Povoamento do Brasil; Ensaios e Estudos; Correspondência; Cartas de Capistrano de Abreu a Lino de Assunção; A geografia física do Brasil; Kosmos; O Livro do Centenário. 

Filosofia Sapiencial

- "Não há em História maior logro que a alusão."

- “É bom que os críticos estreiem por obras próprias”.

- “Levantados os andaimes, saberei melhorar o tujupar”. 

- “As obras do amor são as únicas que pagam o sacrifício”.

- "Só entrei para a sociedade humana porque não fui previamente consultado."

- “Todo artista tem um gérmen original que é a base e o 'substrato' de seu talento”.

- “O brasileiro é povo em formação ou em dissolução? Vale a pena ocupar-se de um povo dissoluto?”

- “José de Alencar é o primeiro e principal homem de letras brasileiro, é o fundador de nossa literatura”.

- “Minha aspirações se reduzem a morrer sem escândalo, sair do mundo silenciosamente como nele entrei”. 

- “É sempre assim: não curamos do tempo, o tempo tudo escritura e surpreende-nos com suas contas monstruosas”.

- “Eu proporia que se substituíssem todos os capítulos da Constituição por um Artigo Único: Todo brasileiro fica obrigado a ter vergonha na cara”.

- “Crítica sintética, impessoal e positiva só me parece possível fundada em dois princípios: o primeiro é que a literatura é a expressão da sociedade, o segundo é que o estilo é o homem.”

- “Se o estilo é o homem, todo livro é um problema psicológico digno de estudo, e se a curiosidade estética não se satisfaz, a teoria científica do espírito sempre aproveita com seu exame”.

- “Para a questão do suicídio, nunca existirá uma explicação bastante razoável, porque às vezes o desespero surge em uma situação menos provável ou terrível do que outra, para a qual, antes sobrava coragem: Desse modo, para mim todo suicida é sagrado”.

- “Há anos, quando eu desembarcava aqui, em um dia de cerração. Quão pouco sabia da vida. Não distava muito de um cego, solto nessa cidade de automóveis. Ainda hoje, quando penso no passado, não compreendo como não soçobrei desde as primeiras passadas”.

Fontes:

ABREU, Capistrano de. Capítulos da História Colonial. Rio de Janeiro: Briguiet e Cia, 1954.

_________________ O Descobrimento do Brasil. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

ARAÚJO, Sadoc. Ascendência sobralense de Capistrano de Abreu. Fortaleza: Instituto do Ceará, acesso 2022.

BLOCH, Marc. História e Historiadores. Lisboa: Teorema, 1998.

CHRISTINO, Beatriz. Capistrano de Abreu e o rã-txa hu-ni-ku-ĩ. Internet: Biblioteca Digital Curt Nimuendajú - línguas e culturas indígenas sul-americanas, 2010.

FLORES, Moacyr. Dicionário de História do Brasil. Porto Alegre: PUCRS, 2008.

GONTIJO, Rebeca. História e historiografia nas cartas de Capistrano de Abreu. Revista Perspectivas. São Paulo: UNESP/Scielo, 2005.

IGLÉSIAS, Francisco. Historiadores do Brasil: capítulos de historiografia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

LIMA, Francisco Augusto de Araújo. Historiador: Capistrano de Abreu. Site: Famílias Cearenses. Internet: Acesso, 2022.

MORAIS, Alexandre Magno. A historiografia na rede: Capistrano de Abreu e a construção da moderna historiografia brasileira. Tese de Mestrado. Belo Horizonte: UFMG, 2010.  

RIBEIRO, João. Historiadores: Obras Críticas. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 1961.

RODRIGUES, José Honório. Capistrano de Abreu e a historiografia brasileiraHistória e historiadores do Brasil. São Paulo: Fulgor, 1975.

VIANNA, Hélio. Capistrano de Abreu: O descobrimento do Brasil. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Friedrich Hegel

Friedrich Hegel - (1770 a 1831) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Georg Wilhelm Friedrich Hegel foi um filósofo idealista alemão do período contemporâneo. Pode ser considerado um dos fundadores do sistema filosófico conhecido como “idealismo absoluto”. Floresceu no período de transição da chamada filosofia moderna para a filosofia contemporânea. Influenciou consideravelmente as correntes de pensamentos do existencialismo e do marxismo. Escreveu uma importante obra chamada de “fenomenologia do espírito”. Essa obra é considerada um clássico da filosofia mundial. Hegel teve uma boa formação humana e científica. Iniciou seus estudos em casa com sua família e com tutores. Posteriormente, matriculou-se no seminário da igreja protestante, e logo após, ingressou na universidade de Tübingen onde concluiu sua formação teológica e filosófica. Chegou a trabalhar como tutor particular e depois passou a viver da herança herdada de seu pai. Sofreu grande influência do filósofo Immanuel Kant e de pensadores iluministas. Foi nomeado como principal preceptor oficial do rei da Prússia. Nasceu na cidade de Stuttgart na Alemanha, em 1770 e faleceu vítima de cólera, em Berlim no ano de 1831.

Filosofia do Conhecimento

Segundo Hegel, durante a história do pensamento humano houve uma forte ligação entre a Filosofia e a História. Ele chegou a delimitar os campos da filosofia e da mitologia, fazendo claras distinções entre elas. Demarcou as principais fronteiras da história da filosofia, pontuando graus e diferenças. Explicava que a filosofia experimentou várias manifestações do espírito ao longo da história da humanidade. Em sua teoria, ele pontuava reflexões sobre a história da consciência humana e meditava a respeito da relação desses fatos com o desenvolvimento do conhecimento da humanidade. Dessa forma, ele elaborou um conceito de evolução gradual da razão humana. Para Hegel, a lógica do pensamento não seguiria um padrão fixado no tempo, mas sim, caminhava de acordo com o processo de mutação da sociedade. Dessa forma, ele conceituava que as “verdades universais” iriam se moldando e progredindo no tempo juntamente com os avanços sociais. A partir disso, ele definiu dois conceitos básicos para a compreensão do movimento da história: o conceito de “zeitgeist” (espírito do tempo) e o conceito de “volksgeist" (espírito do povo). Nesse sentido, ele dizia que: “essa história é o desenvolvimento da razão pensante; seu “vir-a-ser” deve ter se passado de acordo com a razão”. Buscou compreender o homem em sua totalidade, explicitava que as vivências humanas estavam interligadas por um sistema único. Dessa forma, o universo estaria em um constante movimento onde o tempo, o homem e a história seriam apenas uma parte da engrenagem desse sistema.

Em seus estudos, ele conceituava que a dialética poderia ser pensada como um sistema em que a ideia, isto é, a “teses” (ideia-de-si) poderia ser contrariada com a noção de “antítese”, ou seja, (ideia-fora-de-si). Nesse sentido, esse embate entre “teses e antíteses” formaria a concepção da dialética. Ainda nesse contexto, a contraposição das ideias que formavam a dialética daria origem à ideia de “síntese” (ideia-em-si e para-si), quer dizer, outra ideia melhor elaborada. Nessa lógica, ele enunciava que: “a verdade não é encontrada nem na tese nem na antítese, mas em uma síntese emergente que reconcilia as duas”. Nesse contexto, ele exemplificava que a realidade poderia ser compreendida a partir da dialética, pois através dela seria possível conhecer as verdades universais. Segundo seu entendimento, duas ideias opostas dependeriam uma da outra para existirem. Demonstrava que a consciência deveria passar por um estágio de desenvolvimento e amadurecimento, para que assim, ela pudesse conseguir superar as contradições observadas nos conceitos que se apresentam de formas opostas.

Filosofia Idealista

O sistema desenvolvido por Hegel cunhado de “idealismo absoluto” incluiu várias áreas do conhecimento que se desenvolveram em três fases principais: a filosofia lógica, a filosofia da natureza e a filosofia do espírito. Nela, o filósofo conceituava a ideia de que o Estado seria estritamente mecânico. O espírito absoluto seria a síntese do espírito subjetivo e do objetivo, dos quais representariam o fundamento comum, dessa forma, abrangeria a arte, a religião e a filosofia. Posto isso, ele definia que o “espírito absoluto” (filosofia, religião e arte) seria formado a partir da síntese do espirito objetivo (costumes, moralidade e o direito) com o espírito subjetivo (alma, consciência e razão). Hegel buscava uma interpretação racional da ideia de multiplicidade sensível, pois tentava compreender em relação à noção de finito o que existia de absoluto.

Segundo Hegel: “tudo aquilo que pode ser pensado é real e tudo que é real pode ser pensado”. Nessa perspectiva, para ele, não existiria algo que fosse impossível de ser pensado. Dessa maneira, ele afirmava que: “o real é racional e o racional é real”, ou seja, não seria possível separar o mundo e o sujeito, o objeto e o conhecimento, o universal e o particular. Dessa forma, o “ideal absoluto” seria em sua essência um princípio ativo, mas só poderia se manifestar na esfera do pensamento, isto é, do autoconhecimento. Ele partia do conceito de que o “ideal absoluto” seria um processo contraditório em si mesmo, pois a noção de “ideia” se transformava, depois passava a negar-se, e posteriormente se convertia no seu contrário. Sua teoria se ancorava na suposição de que a realidade poderia ser expressa em um sistema particular de categorias. Conforme Hegel, o objetivo da filosofia era o mesmo da religião, ou seja, encontrar uma verdade universal, nesse sentido, a religião absoluta seria o cristianismo, que se diferenciava das outras religiões devido sua ideia de encarnação, pois esse conceito representaria a união do divino com o humano. Desse modo, Hegel dizia que: "o verdadeiro é o todo".

Filosofia Política

O Estado, para Hegel, era formado a partir da síntese das vontades individuais e imediatas dos indivíduos. Ele seria o resultado do desenvolvimento das exigências da sociedade. Esse estado era formado a partir do conceito de homens livres que usavam a ideia de liberdade como um instrumento de ação individual-coletiva para concepção da constituição moral do Estado. Hegel utilizava o termo “herói” para definir como alguns homens agiram de maneira grandiosa no curso da história humana. A história para ele se daria mediante um processo de relação com as ações efetuadas pelos indivíduos no contexto social e cultural. Por isso, os homens que se fizeram presentes como construtos dessa relação entre processo histórico e ação humana, são denominados por ele de “heróis”. Hegel aborda o conceito de liberdade como um ponto chave para esclarecer que os grandes homens, chamados de “heróis”, possuem um “espirito livre”, por isso promovem ações responsáveis de modificação da realidade do seu tempo. O espirito consciente seria um espirito livre, capaz de criar soluções para problemas sociais, políticos e culturais. Logo, o “herói” seria um grande homem capaz de utilizar sua liberdade com responsabilidade para provocar ações mobilizadoras e transformadoras na sociedade. Sua ideia de Estado se baseava em um conceito de regime automatizado que agiria em conjunto com os homens de uma sociedade. Dessa maneira, ele afirmava que:

“A sociedade civil-burguesa supera dialeticamente a família, negando seus princípios, esvaziando-a, diminuindo seu papel, sem, no entanto, fazê-la desaparecer. O Estado supera dialeticamente a sociedade civil-burguesa, negando sua pulverização estrutural, mas precisa conservar, em sua síntese superior, as exigências ligadas à conquista da autonomia por parte dos indivíduos. O Estado é o nível superior da realização desse movimento; é a ‘efetividade da ideia ética’, a unidade da consciência subjetiva e da ordem objetiva.” (Hegel, 1821).

 

Dialética do senhor e escravo

Nessa metáfora, Hegel explanava a respeito de sua dialética. Primeiramente, o “senhor”, que seria uma consciência, submeteria o “escravo” a ser um objeto. Entretanto, para que o Senhor continuasse sendo um senhor, o escravo precisaria reconhecê-lo como tal. Assim sendo, o escravo seria ao mesmo tempo objeto e também sujeito. Desse modo, o senhor precisaria do escravo para ser senhor. Logo, quando o senhor precisa do reconhecimento do escravo, ele acaba se fazendo também de objeto. Nesse sentido, as posições de senhor e do escravo, isto é, sujeito e objeto, são trocados a todo o momento, em uma constante luta entre os contrários. Em vista disso, o desenvolvimento da história estaria na superação dessas contradições.

Obras

Introdução à história da filosofia; Fenomenologia do Espírito; Ciência e Lógica; Enciclopédia das Ciências Filosóficas; Elementos da Filosofia do Direito; Lições Sobre a Filosofia da Religião; Lições Sobre a Estética; O espírito do cristianismo e seu destino; A arte romântica; A História Universal.

 

Filosofia Sapiencial

- “Nada é. Tudo vem a ser”.

- "Amar é esquecer-se no outro".

- “A história do mundo é um tribunal”.

- “Tenha a coragem para estar errado.”

- “O negativo é do mesmo modo positivo”

- “O que o sujeito é, é a série de suas ações”.

- “A educação é a arte de tornar o homem ético”.

- “A tarefa da filosofia é entender o que é a razão”.

- “Quem exagera o argumento, prejudica a causa”.

- "O verdadeiro é o todo e o racional por si só é real".

- “Aquele que vence a raiva vence os seus inimigos.”

- “Nada de grande se realizou no mundo sem paixão.”

- “O homem não é mais do que a série dos seus atos”.

- “A realidade racional é que toda a racionalidade é real.”

- “A razão é a certeza consciente de ser toda a realidade”.

- “A Filosofia é a ave de Minerva que alça o seu voo ao cair da tarde”.

- “Tudo quanto provem do espírito é superior ao que existe na natureza”.

- “A impaciência exige o impossível, ou seja, a obtenção do fim sem os meios”.

- “Algo é “em-si” na medida em que, a partir do “ser-para-outro”, ele regressou a si.”

- “A filosofia desponta num determinado momento de desenvolvimento da cultura”.

- “A história ensina é que os governos e as pessoas nunca aprendem com a história.”

- “As espécies não se diversificam do universal, mas somente umas perante as outras”.

- “A necessidade, a natureza e a história não são mais do que instrumentos da revelação do Espírito”.

- “A história do mundo não é nada mais do que a história do progresso da consciência de liberdade”.

- “A luz, afirmam, é ausência de trevas, mas na pura luz se vê tão pouco quanto na pura escuridão”.

- “Todo princípio do entendimento é unilateral e esse caráter se revela em que o outro princípio lhe é oposto”.

- “A filosofia última no tempo é o resultado de todas as filosofias precedentes, e deve por isso conter os princípios de todas”.

- “Quem quer algo de grande, deve saber limitar-se. Quem, pelo contrário, tudo quer, nada, em verdade, quer e nada consegue.”

- “A existência do homem tem o seu centro na cabeça, ou seja, na razão, sob cuja inspiração ele constrói o mundo da realidade”.

- “A necessidade geral da arte é a necessidade racional que leva o homem a tomar consciência do mundo interior e exterior e a fazer um objeto no qual se reconheça a si próprio.”

- “A filosofia nos dá o conhecimento do universo como uma totalidade orgânica, totalidade que se desenvolve a partir do conceito e que, nada perdendo do que faz dela um conjunto, um todo cujas partes estão unidas pela necessidade, a si mesma regressa e no “regresso a si mesma” forma um mundo de verdade”.

- “Não devemos cair nas ladainhas das lamúrias, dizendo que, no mundo, muitas vezes ou quase sempre, os bons e piedosos são infelizes, ao contrário dos maus e perversos. Por felicidade entendem-se coisas bem diversas, como fortuna, honra mundana e coisas semelhantes. Mas quando se trata de um fim em si e por si, o que se chama ventura ou infortúnio deste ou daquele indivíduo particular não pode ser tomado como momento da ordem racional do universo. Aqui não é o interesse nem a paixão individual que exigem satisfação, mas a razão, o direito, a liberdade”.

Fontes:

AZEVEDO. Ana Catarina Moreira. A Filosofia de Hegel: Fenomenologia. Lisboa: FLUP, 2014.

COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirta. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva: 2010.

DUDLEY, Will. O Idealismo alemão. Trad. Jacques Wainberg. Petrópolis: Vozes, 2018.

HABERMAS, Jurgen. Discurso Filosófico da Modernidade.  São Paulo: Martins Fontes, 2000.

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quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Monte Alverne

Monte Alverne – (1784 a 1858) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Francisco José de Carvalho foi um filósofo brasileiro ligado a corrente de pensamento chamada de ecletismo. Teria sido influenciado pela filosofia sensualista do pensador iluminista Condillac e também pelo ecletismo espiritualista de Victor Cousin. Escreveu algumas obras em formato de sermões, alegorias, discursos, compêndios e literatura. Ficou conhecido como o “Frei Francisco de Mont’Alverne”. Esse codinome lhe foi dado pela ordem dos franciscanos, em homenagem ao “Padre Francisco de Assis”, simbolizando um momento de reflexão vivido pelos frades no conhecido “Monte Alverne” localizado na Itália. Alverne era filho do ourives João Antônio Silveira e de Ana Francisca da Conceição. Cogita-se a hipótese de Mont’Alverne ter sido filho de criação desse casal. Estudou Teologia e Filosofia no Convento São Francisco de Assis, em São Paulo.

Foi considerado um dos grandes oradores sacros da igreja católica no Brasil. Inicialmente, ele teria sido nomeado por D. João VI para o cargo de Pregador, havendo posteriormente exercido diversas outras funções na área política e na educação. Lecionou disciplinas da área de Filosofia, Oratória e Teologia. Tendo exercido partes do seu professorado no Convento de Santo Antônio da Ordem Franciscana. Foi membro da Academia de Belas Artes e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Floresceu no período de transição do Brasil colônia para o período emancipatório de independência brasileira. Sofreu algumas limitações visuais que comprometeram seu desempenho nas suas atividades laborais. Acredita-se que tenha sido acometido por uma doença conhecida como “amaurose”. Passou então a viver afastado, por um longo tempo, de suas funções, tendo retornado ao fim de sua vida, através de convites, para realizar novos discursos públicos. Nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 1784 e faleceu no município de Niterói, por volta de 1858, de morte cerebral, em um retiro na casa de amigos.

Filosofia do Ecletismo

Sua admirável oratória teria exercido grande poder de influência na formação de opiniões públicas. Essa influência teve papel importante na caracterização do pensamento nacional. Contribuindo para a formação da identidade nacional e a invenção da intelectualidade brasileira. Como professor, rejeitou nos últimos anos, a “escolástica tomista” para defender o ecletismo de Victor Cousin. A originalidade do seu ecletismo se encontrava ancorado em uma espécie denominada de “romantismo sermonístico”. Visto como um dos idealizadores do romantismo no Brasil, ele exerceu grande influência nos escritores do romantismo brasileiro. Transcorreu através de sua sermonística pelos horizontes da poética, da política, da teologia e da filosofia. Inclinando-se mais propriamente nos caminhos da estética e da moral. Alguns pesquisadores apontam como principais características de sua filosofia, os elementos ligados ao arcadismo, ocultismo, exotismo, individualismo, subjetivismo, reformismo, exageração, sensualismo e informalismo. Nesse sentido, sua “sermonística universalista” transitava entre ideias espiritualistas e percepções do ecletismo.

Filosofia Teopolítica

Visto por alguns pensadores como um dos grandes nomes da cultura no Brasil, ele direcionava alguns de seus discursos para reflexões do cotidiano brasileiro. Sua veia do romantismo dialogava entre conceitos teológicos e acepções patrióticas.  Dissertou sobre preceitos políticos e religiosos que se mesclavam, dando, com isso, origem a reflexões enigmáticas. Seu criticismo erudito era muitas vezes confundido com pedantismo. Sua ótima eloquência encenava admiráveis análises políticas, por isso, era descrito como sendo um grande sedutor público. Caminhava dialeticamente entre noções de transformações reformistas e o conservadorismo dos aspectos tradicionalistas. Dessa forma, foi apontado como um crítico moderado e conciliador. Essa denominação criticista era vista como sendo gerada por pensadores que lutavam por reformas, mas não desejavam revoluções. Defendia alguns pontos positivos que ele identificava na monarquia vigente, mas argumentava em prol de reformas na área da educação. Nesse contexto, sua obra é tida como um marco civilizatório e emancipatório para o país, pois era dotada de dinamismo, em meio ao conturbado cenário de construção do pensamento político brasileiro. Seu trabalho teria influenciado as primeiras correntes políticas do pensamento liberal do país. A veia liberal de Monte Alverne se articulava ecleticamente com os ideais iluministas e com alguns princípios luso-monárquicos. Ele não chegou a se envolver diretamente nas questões políticas de seu tempo, tendo apenas ensaiado conceitos e pensamentos. Dessa maneira, ele afirmava que: “Sou frade e frade morrerei”.

Filosofia Moral

Absorveu os princípios religiosos da simplicidade e do desprendimento material, negando os prazeres mundanos e adotando a solidariedade como bússola orientadora de sua vida. Ele se via como um instrumento de revelação da verdade de Deus na Terra, por isso dizia interceder pela humanidade junto a Deus. Realizou o voto de pobreza como incentivo a regulação de sua conduta moral. Assumiu uma nova postura social que se compatibilizasse com sua religiosidade. Misturou elementos da moral jesuítica com a nova proposta da filosofia ética e modernizadora do ecletismo. Realizou várias preleções onde praticava seu doutrinamento moral e ensinava a seus discípulos. Segundo Gonçalves de Magalhães, Monte’Alverne sentia o que dizia, pois comunicava sua sensibilidade moral de forma bastante sublime e de maneira bem estruturada. Pensou um sistema de explicação denominado de “sensual-espiritualista” que clareava a noção de consciência da alma e sua relação com a vontade individual do homem. Alverne acreditava que a percepção do conhecimento poderia ser entendida pelo espírito humano por meio da comunicação de uma verdade científica. Nesse sentido, o entendimento humano teria as faculdades de perceber, julgar e raciocinar. O homem tateava a clareza do seu juízo através de um “discurso lógico” que delimitava os horizontes dos saberes morais e éticos. Ele conceituava a diferença existente entre descrição e definição, pontuando que a primeira seria uma sentença que se refere a um conjunto enumerado de circunstâncias, com a finalidade de determinar o conhecimento de algo. Já a segunda, seria a maneira de evidenciar a essência fundamental das coisas. O juízo humano deveria, então, utilizar a “descrição” e a “definição” para construir uma “distinção” que estaria baseada em três aspectos principais a serem investigados, os planos: físico, metafísico e lógico. Segundo Alverne, o juízo seria o ato positivo e o ato real da alma humana, que poderia ser percebido de forma intuitiva através da percepção mais conveniente entre duas ideias, pois a natureza do juízo consistiria, em ser um ato da alma, e alma atua melhor, quando ela julga.

Filosofia Sapiencial

+ “O púlpito foi à pira em que arderam meus olhos”

+ “Minha duração é um momento, meu lugar é um ponto”.

+ "O entendimento é a potência de perceber, julgar e raciocinar"

+ “Deus esmaga nas barreiras do túmulo todos esses gigantes da Terra”.

+ “A moralidade dos reis é o mais seguro penhor da felicidade dos povos”.

+ “A perfeita certeza jaz aqui no conhecimento da totalidade destas coisas”.

+ “Repeli com horror todas as insinuações que tendem a destruir o edifício social”.

+ “Quando falo da liberdade me refiro a esta liberdade que não aqueceu os ossos de nossos pais”.

+ “É uma injustiça reconhecer nas revoluções políticas dos povos a influência exclusiva das paixões e dos crimes individuais”.

+ “Homem! Em outro tempo eu vos convidaria a vir nesta comunidade tomar um lugar que fica vago. Hoje, porém lhe digo que melhor destino espera o talento”.

+ “Os verdadeiros filhos de uma pátria degenerada não podem encontrar algum pretexto para violar uma convenção regulada pelos princípios da justiça”.

+ “Salve, ó pátria minha, ó terra de minha mãe, ó país em que descansam as cinzas veneráveis de meu pai! Tu serás grande, tu serás venturosa, assim está escrito, assim está decretado."

+ “É nessas barreiras formidáveis dos revoltosos nas revoluções que se despedaçam todos esses opressores que fundam a sua grandeza e a sua glória nas lágrimas, nos gemidos e na miséria dos povos”.

+ “A vida do claustro se não é o consórcio instintivo com a humildade, é um martírio sem mérito; porque não ha entusiasmo que lento sustente por uma vida inteira o sacrifício forçado das mais imperiosas paixões humanas”.

+ “Tantos esforços, fadigas tão aturadas eram precisas para deixar um vestígio de minha passagem nesta terra, onde recebi aplausos, coroas e ovações, de que nenhum orador, nenhum filósofo antes de mim ousou ainda gloriar-se”.

+ “Teus bravos filhos proclamaram no meio dos mais ardentes aplausos à intervenção do homem extraordinário, que reanimando o valor de nossos batalhões afugentou de nossas praias esses ferozes opressores que pretendiam lançar sobre nossos pulsos o cadeado infame da escravidão e do opróbrio”.

+ "Quando todas as nações da Terra se deixassem envilecer pelo cativeiro, quando todo o mundo se desonrasse abraçando uma direção que degrada e embrutece o homem; cada um de nós cerrando o coração às suas mais caras afeições deve defender a todo o transe esta árvore misteriosa que encerra a semente da prosperidade nacional”.

+ “Se eu soubesse que era arrancado das bordas do meu sepulcro, do seio do meu retiro, para receber das mãos da mocidade uma coroa de louros, honra cívica que premia meus serviços pisados pela ignorância, esquecidos pela estupidez, e mal pagos pela mais fria indiferença, ainda assim talvez não tivesse coragem de apresentar-me para recebê-la”.

+ "Empreguei, é verdade, os anos da minha mocidade em dirigir as inteligências que me tinham sido confiadas, revelei verdades que meus antecessores não me tinham comunicado, alarguei a esfera da inteligência; marchei intrépido; pisei o egoísmo; fui sobranceiro à inteligência; não voltei o rosto à injúria, à calúnia; fui conspurcado por a inveja...; mas longe de sucumbir levei de vencida meus adversários”.

+ “Ao fragor do incêndio que reduzia a cinzas nossas povoações, ao tinido lúgubre dos punhais fratricidas que votavam a uma vingança estúpida centenas de vítimas, à inauguração desses festins selvagens, em que o canibalismo dava os mais frenéticos embora ao roubo, à devastação, à barbaridade e à ignorância, Deus nos deparou no Príncipe com que nos mimoseara, o termo de tantos danos, e a aurora de uma felicidade que não nos era dado lobrigar."

+ “Não, não poderei terminar o quadro que acabei de bosquejar: compelido por ser uma força irresistível a encetar de novo a carreira que percorri por anos, quando a imaginação está extinta, quando a robustez da inteligência está enfraquecida por tantos esforços. Não vejo as galas do santuário, e eu mesmo pareço estranho àqueles que me escutam, como desenterrar este passado tão fértil em reminiscências? Como reproduzir esses transportes, esse enlevo com que realcei as festas da religião e da pátria?”

+ “Basta! com efeito, entrar em mim mesmo para ser convencido, que minha alma tem o senso íntimo, ou a consciência de tudo o que experimenta. Ele constitui esta - Unidade, este Eu - , que se incorpora, se identifica com tudo, o que se passa na alma; que reúne em si tudo isto, apropria-se o passado, como o presente; e reúne desta sorte numa só individualidade, em uma só existência toda a série das percepções, e das operações da alma. É este sentimento tão claro, tão permanente, tão uniforme, que eu tenho da minha própria individualidade, do meu Eu, quem me assegura que existo; e a minha existência é uma destas verdades de uma evidencia propriamente dita, á quem nada pode enfraquecer: porque não podendo ter uma percepção, sem ao mesmo tempo sentir, que sou eu, quem a tenho; não posso sentir que eu tenho esta percepção, sem sentir ao mesmo tempo que existo”.

Obras:

- Obras Oratórias (1833)

- Compêndio de Filosofia (1859)

- Trabalhos Literários (1863)

Fontes:

BDLB. Biblioteca Digital Luso-Brasileira. Cartas autografas e uma por cópia de Frei Francisco do Monte-Alverne 1784 a 1858, oferecidas à Biblioteca Nacional da Corte pelo conselheiro Barão de Nogueira da Gama. Site: BNDigital do Brasil. Brasil: Acesso em 2022.

CÂNDIDO, Antônio. Formação da Literatura Brasileira. São Paulo: Martins, 1969.

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IHGB. Frei Francisco de Monte Alverne: Sócios Falecidos. Site: Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Acesso em 2022.  

MAGALHÃES, Gonçalves de. Biografia do Padre-Mestre Frei Francisco de Monte-Alverne. Rio de Janeiro: IHGB, 1859.

MONTE’ALVERNE, Francisco de. Obras Oratórias. Rio de Janeiro: H Garnier, 1858.

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