sábado, 30 de setembro de 2023

Ferreira França

Ferreira França – (1809 a 1857) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Eduardo Ferreira França foi um filósofo brasileiro ligado as correntes de pensamentos da “filosofia da mente”. Sua obra é vista como umas das primeiras investigações psicológicas das Américas. Desse modo, ele era considerado um dos pioneiros da Psicologia no Brasil. Tinha como tema central de sua abordagem a chamada “psicologia experimental”. Encaminhou-se inicialmente pelas ideias do materialismo, migrando posteriormente para as concepções do espiritualismo. Exerceu grande importância nas ciências médicas, doutorando-se em Medicina pela Faculdade de Paris, em 1834, com a tese intitulada de “Ensaio sobre as relações da influência alimentar na moral”. Além da Medicina, atuou também em várias outras áreas, como Química, Literatura, Mineralogia, Filosofia e Política. Tendo relacionado os estudos da mente humana com as ciências da filosofia, fisiologia, frenologia, psicologia e política social. Era filho do senhor Antônio Ferreira França com a dona Ana da Costa Barradas. Nasceu na cidade de Salvador, em 1809 e faleceu por volta de 1857, em alto mar. Relata-se que seu navio teria afundado a caminho da Europa.

Filosofia da Mente

Abordou temas morais relacionando o ecletismo com a psicologia, tendo se destacado, por uma linha de ideias denominada de “ética espiritualista”. Segundo contam, ele desejava encontrar elementos observáveis que pudessem ser aptos a explicar o comportamento moral das pessoas. Em 1854 publicou o livro Investigações de Psicologia. Tal livro é identificado por historiadores da psicologia como sendo um dos mais antigos das Américas. Ensaiou alguns entendimentos a respeito da “motilidade”, isto é, a capacidade de movimentação da alma humana e como a alma exerce ações sobre o corpo. Dissertou acerca dos fenômenos da consciência, dos atributos intelectuais, dos instintos humanos e das atividades volitivas, direcionando esses saberes para as questões da influência do ambiente sobre o homem.

Para a ele a concepção de moral se formava a partir de uma série de funções da mente, o resultado seria o produto equipolente das faculdades intelectivas com as propriedades emocionais. Com isso, existia, segundo ele, uma razão proporcional desses fatores, desse modo, a moral dependeria do grau de assertividade de cada fator limitante. Nesse contexto, ele explicava que os limites da faculdade mental tenderiam a aumentar ou diminuir, conforme se estendessem ou reduzissem os fatores da emoção humana. Nessa perspectiva, ele descrevia que o processo de educação do homem poderia transformar a moral humana, tanto de forma positiva, como também de maneira negativa.

Filosofia Naturalista

Teve grande influência do pensamento naturalista, descrevendo pontos fisiológicos e biológicos da condição existencial do homem. Para Ferreira, havia um determinismo que caracterizava a condição natural do ser humano. Seu naturalismo determinista abordava uma relação interior do indivíduo com questões de ordem social, desse modo, para ele, questões como a “alimentação e a civilização” eram requisitos que justificavam as condições naturais de existência. Nesse sentido, ele destacava que os alimentos e as bebidas ingeridas pelo ser humano influenciavam na formação moral do homem. Diferenciava a influencia que os alimentos de origem animal e vegetal causavam no ser humano. Pontuando que o primeiro despertava no ser humano mais vigor e agressividade, já o segundo gerava menos vigor, produzindo um sentimento de timidez no indivíduo.

Explicava que o homem era formado por duas substâncias principais, corpo e alma, e que elas mantinham uma interação mútua. Segundo Ferreira, o homem enquanto ser material mantém um determinismo característico de sua condição animal, e que por isso, seria regulado pelas leis físicas gerais dos corpos. Porém sua alma, que estaria ligada aos princípios vitais, era responsável por dá animação ao corpo, podendo agir de maneira contraposta as leis naturais dos corpos.

Filosofia Política

Exerceu atividades políticas como deputado federal, atuando em causas ligadas a saúde pública e a medicina social. Era adepto das correntes políticas do liberalismo. Para ele, as questões naturalistas exerceriam determinadas influências na liberdade humana, por consequência, isso também afetava a vida política nas cidades. Explanava que algumas nações eram mais corajosas e cruéis que outras por conta de ingerir uma alimentação rica, apenas em carne animal. Porém os povos que mantinham uma dieta de origem somente vegetal seriam mais compassivos e supersticiosos, demonstrando uma moral fraca. Contudo, as civilizações que consumiam uma alimentação mista, isto é, de origem animal e vegetal, e ao mesmo tempo, essas possuíam todas as vantagens que os alimentos forneciam e ainda eliminavam os percalços produzidos pelas dietas que eram feitas apenas de maneira isolada.

Filosofia Sapiencial

+ “Os alimentos e as bebidas influenciam significativamente nossa moral”.

+ “Não há fenômeno sem uma mudança, não há mudança sem uma causa”

+ “Não é possível ser filósofo sem ser médico nem ser médico sem ser filósofo”.

+ “O estudo do homem moral é um dos mais interessantes e dos mais úteis que existem”.

+ “Os fenômenos que percebemos diariamente são aqueles que mais merecem nossa atenção”.

+ “As constituições não devem ser feitas em favor do poder; as constituições são sempre feitas em favor dos povos”.

+ “Observar os fenômenos da alma, classificá-los, deduzir suas leis e aplicá-las: eis em resumo o fim do estudo do espírito humano”

+ “O regime animal exclusivo produz paixões violentas e sem freio, torna os homens corajosos, independentes, mas, ao mesmo tempo, cruéis e pouco sociáveis. O regime vegetal, ao contrário, estingue o aguilhão das paixões, torna os homens doces e compassivos; mas ele gera a pusilanimidade, a escravidão, e termina muitas vezes por produzir a fraqueza e a corrupção. Todos os dois, empregados exclusivamente, são contrários ao desenvolvimento da inteligência. É então por um regime misto que o homem pode adquirir as mais belas qualidades morais, que sua inteligência pode crescer e se aperfeiçoar, que ele pode ser corajoso sem ser cruel doce sem ser escravo”.      

Obras:

Investigações de Psicologia; Influência dos pântanos sobre o homem; Ornitologia brasileira; Discursos introdutórios ao estudo de química médica; Relatório sobre o Sistema Penitenciário; Influência das emanações pútridas animais sobre o homem; Ensaio sobre a influência dos alimentos e das bebidas sobre o moral do homem.

Fontes:

ARAÚJO, Bernardo Goytacazes de. As éticas espiritualistas de Cunha Seixas e Ferreira França. Revista Estudos Filosóficos. N: 07. Rio de Janeiro: Universidade Castelo Branco, 2011.

CALMOM, Pedro. História da literatura baiana. Rio de Janeiro: Editora José Olímpio, 1949.

CERQUEIRA, Luiz Alberto. Filosofia brasileira: ontogênese da consciência de si. Petrópoles: Editora Vozes, 2002.

FRANCA, Leonel. Noções de História da Filosofia. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1965.

JAIME. Jorge. História da Filosofia no Brasil. Vol. 1. Petrópolis: Vozes, 1997.

LEITE, Geraldo. Eduardo Ferreira França: 114. Site: Blog Médicos Ilustres da Bahia e de Sergipe. Internet: Publicado em 2011. Acesso em 2023.  

MARGUTTI, Paulo. As ideias filosóficas de Eduardo Ferreira França. Porto Alegre: Editorra Fiorg, 2023.

PAIM, Antônio. Ferreira França: Investigações de Psicologia. São Paulo: EDUSP/Editorial Grijalbo, 1973.

ROMERO, Sylvio. A Filosofia no Brasil: Ensaio Crítico. Porto Alegre: Typ. de Deutsche Zeitung, 1878.

SACRAMENTO, Blake. Dicionário Bibliográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1902.

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Adolfo Caminha

Adolfo Caminha – (1867 a 1897) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Adolfo Ferreira dos Santos Caminha foi um filósofo cearense ligado a corrente filosófica chamada de “Determinismo Naturalista”. Era considerado um dos primeiros intelectuais dessa corrente de pensamento no Ceará. Seu sistema de pensamento abrangeu elementos do positivismo, do realismo e do pessimismo. Utilizou-se da literatura para explanar suas ideias. Sua obra era composta de poesias, ensaios críticos e romances literários. Teve uma infância sofrida, pois perdeu sua mãe, com apenas dez anos de idade, atingida pela seca que assombrou o Ceará. Trabalhou inicialmente, por um longo tempo, na Marinha do Brasil. Posteriormente, laborou como escritor na “revista moderna”. Foi um dos fundadores do Centro Republicano Cearense. Participou do movimento chamado de “A Padaria Espiritual”, onde utilizava o pseudônimo de “Félix Guanabarino”. Seus pais eram Raimundo Ferreira dos Santos Caminha e Maria Firmina Caminha. Nasceu no município de Aracati, em 1867 e faleceu prematuramente, em 1897, com apenas 29 anos de idade, na cidade do Rio de Janeiro, vitimado por uma tuberculose. Dois anos depois de sua morte, uma de suas filhas, também faleceu precocemente de tuberculose. Adolfo recebeu várias homenagens de ruas e escolas com o seu nome.

Filosofia Naturalista

Sua obra transcorria sobre aspectos zoomórficos da condição humana, isto é, o homem como um animal selvagem. Essa concepção seria um viés do naturalismo, em que eram pontuados aspectos de uma solidez dramática, que retratava cenas desumanas e sinistras. Havia um intenso criticismo social que caracterizava um aspecto pavoroso. Seus textos eram vistos como obras polêmicas e subversivas, que descreviam os vícios da condição humana. Continha um caráter ácido que desaguavam em crimes e perversões. Entre suas principais características estavam o objetivismo e a impessoalidade. Tinha o domínio de uma escrita linear que desvelava a realidade factual. Nesse sentido, ele valorizava as ideias científicas sobre o prisma do “existencialismo determinista”. Os aspectos que caracterizavam seu enredo eram movidos por situações que contextualizavam a sociedade, a cultura e a genética dos atores sociais. Dessa forma, o personagem sofria influência da raça ao qual fazia parte, por isso, o meio social e a época seriam fatores determinantes nos destinos dos indivíduos. Os personagens agiam movidos pela vontade e também de forma animalesca, sem controle dos impulsos e desejos. Dessa maneira, os instintos subjugavam a razão humana. Os indivíduos eram sempre retratados como pobres e miseráveis que vivam a margem da sociedade. Misturavam os temas como o homossexualismo e o racismo, com ideias ligadas ao racionalismo e o cientificismo.  

Filosofia Política

No campo político era um grande defensor dos ideais abolicionistas no Brasil. Ainda muito jovem, já fazia discursos contra a escravidão e contra o sistema imperial. Essa perspectiva era contrária à posição conservadora em que ele estava inserido socialmente. Sua visão política era moderna e estava em sintonia com o movimento republicano, que era contrário a permanência da monarquia. Desse modo, criticava a ordem política e as injustiças ardilosas que eram perpetradas. Foi considerado um dos fundadores do movimento literário e político chamado de “Padaria Espiritual”, onde eram debatidas ideias sobre a conscientização popular, através da cultura e da educação. Acreditava na educação como meio de transformação da realidade social, em que o país estava submergido. Envolveu-se em certas celeumas sociais que serviram como fonte de inspiração para algumas de suas obras. Nesse sentido, ele utilizava seus textos como forma de resistência contra o falso puritanismo da qual lhe atacavam, denunciando furtivamente aspectos da violência física e psicológica, que eram dissimulados na sociedade.

Filosofia Literária

Lançou o romance “A Normalista”, de cunho naturalista, em que criticava a vida urbana das capitais. A atmosfera escolhida como referência foi à cidade de Fortaleza, onde pontuava aspectos regionalistas, denunciando um espaço urbano parco e frugal.  A obra foi descrita por alguns pensadores como tendo um aspecto pessimista do cenário urbano. Também tinha elementos que mostravam a realidade de uma sociedade vulgar, mesquinha e preconceituosa. O autor evidenciava um cenário de corrupção moral e assédios que maculavam os valores, mostrando o falso moralismo que a sociedade tentava esconder. A história impactante denunciava um incesto patriarcal praticado contra uma jovem moça pelo seu próprio padrinho. O romance abalava os bons costumes morais, tendo sido considerada pervertida pela ordem social vigente. Utilizava-se de um vocabulário coloquial que representava as características locais dos personagens. Alguns desses personagens possuíam um saber empírico que alimentava a percepção das vicissitudes experienciais.

Sofreu censura de algumas obras como o romance “bom-crioulo”, em que descrevia cenas impactantes e polêmicas a respeito do homossexualismo. Na literatura alencarina, essa era uma obra inédita em relação à temática escolhida. Contudo, a crítica conservadora teria desaprovado essa obra, por conta do tema escolhido. Ainda sim, a obra seria considerada tempos depois como uma importante fonte histórica. Ele retratava, nessa obra, além do naturalismo característico, aspectos do realismo, pois confrontava o romantismo idealizado que existia na sociedade. Pontuou a questão de igualdade ao colocar um negro e um branco em situações semelhantes, tanto da vida castrense, como na vida pessoal dos personagens, tendo até polemizado um romance inter-racial. Apropriava-se de hiperbolismos para descrever algumas cenas, enaltecendo sentimentos como o desejo e a frustração, que culminavam em tragédias. Externalizava as discriminações que eram praticadas por questões de raça, gênero e sexualidade, e também certos castigos físicos que eram infligindo nas classes mais desfavorecidas.

 Filosofia Sapiencial

+ “O mundo da lenda é infinito.”

+ “A perfeição é inimiga do homem.”

+ “E consumou-se o delito contra a natureza”.

+ “Pela cara se conhece quem tem lombrigas”.

+ “O dever de todo artista é produzir e produzir sempre.”

+ “Eu de mim só sei que o patriotismo, longe da pátria, duplica.”

+ “A arte é sempre a arte, verdadeira e bela, intransigente e nobre.”

+ “A forma é quase tudo na arte, dizem; creio, porém, que a sinceridade é tudo”

+ “A lágrima há de existir enquanto palpitar em nós esse músculo que se chama coração.”

+ “A saudade é um estado da alma como a nostalgia, como o amor, como a tristeza, como a dor.”

+ “Para quem viaja no mar uma vela que se avista é sempre motivo de inocente alegria.”

+ “A literatura e as artes de um país são coisas muito mais sérias do que vulgarmente se julga.”

+ “Não se escreve a história de um país sem demorar-se em largo e paciente estudo sobre as suas origens”.

+ “Ser talentoso é o quanto basta para que um rapaz veja-se antipatizado, odiado, cercado de inimigos.”

+ “Ali se achava, ao redor dele, a sublime expressão da liberdade infinita e da soberania absoluta, coisas que seu instinto alcançava muito vagamente através de um nevoeiro de ignorância”

+ “E um dia a sociedade, esse vampiro enorme, que o sangue chupa ao justo e poupa a tirania, essa ave negra, viu-te, arroxeado e informe, o corpo de criança, a alma… já não via!”

+ “Na obra de arte, com especialidade, essa perfeição só se adquire por meio de um trabalho penoso, mortificante, cheio de desesperos, e que vai desde o simples esboço, rápido e nervoso, até a forma definitiva, serena e límpida, através da qual não se percebem as agonias do artista na luta pela realização do ideal estético”.

Obras:

Voos Incertos (1886), poesia; Judite (1887), contos; A chibata 1887, Contos; Lágrimas de um Crente (1887), contos; A Normalista (1893), romance; No País dos Ianques (1894), romance; Bom Crioulo (1895), romance; Cartas Literárias (1895), romance; Tentação (1896); Ângelo, romance inacabado; O Emigrado, romance inacabado; Pequenos contos; Duas Histórias; Traduções do teatro de Balzac.

 

Fontes:

ABAURRE, Maria Luiza; PONTARA, Marcela. Literatura Brasileira. São Paulo: Moderna, 2005.

ADOLFO Caminha. A Normalista. São Paulo, Editora Três, 1973.

_________________ Bom Crioulo.  Carapicuíba: Ateliê Editorial, 1895.

_________________ No país dos Ianques. São Paulo: Poeteiro Editor Digital, 2014.

AZEVEDO, Sânzio de. Literatura Cearense. Fortaleza: Academia Cearense de Letras, 1976.

BEZERRA, Carlos Eduardo de Oliveira. Adolfo Caminha: um polígrafo na literatura brasileira do Século XIX (1885-1897). São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.

BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 2015.

COUTINHO, Afrânio. A ficção naturalista. São Paulo: Global, 1997.

FERRÉZ. Ninguém é inocente em São Paulo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.

DALCASTAGNÈ, Regina. Literatura brasileira contemporânea: um território contestado. São Paulo: Vinhedo Horizonte, 2012.

RIBEIRO, João. Roteiro de Adolfo Caminha. Rio de janeiro: Livraria São José, 1957.

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Literatura Brasileira: seus fundamentos econômicos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964.

domingo, 10 de setembro de 2023

Quintino Cunha

Quintino Cunha - (1875 a 1943) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

José Quintino da Cunha – Foi um filósofo cearense ligado as correntes de pensamento positivistas. Relacionou seus saberes entre ideias cientificistas e as concepções do romantismo literário. Escreveu sua obra em formato de poesias, repentes, modinhas e sátiras. Era considerado por alguns pesquisadores como “o pai do humor cearense”, tendo ficado afamado, por conta de seu carisma simpatizante e pelo seu estilo irreverente, de anedotas ácidas. Possuía profunda eloquência e notável poder de oratória. Era de origem humilde e sua família não possuía grandes posses. Conta-se que, com apenas 11 anos de idade, o menino já praticava atividades laborais para um periódico local. Iniciou seus estudos no Ginásio Cearense, tendo depois migrado para o Colégio Militar de Fortaleza. Atuou por um tempo como rábula, antes de obter diploma na área. No campo literário ficou conhecido como o “Bocage Cearense”. Na área jurídica como o advogado dos pobres. Graduou-se, em Ciências Jurídicas, pela Faculdade de Direito do Ceará, por volta de 1909.

Exerceu os ofícios de militar, político, escritor e advogado criminalista. Era filho de um conceituado filólogo, chamado de João Quintino da Cunha, com uma ilustre professora conhecida por Maria Maximina Ferreira Gomes. Foi membro da Academia Cearense de Letras. Nasceu na cidade de Itapajé, em 1875 e veio a falecer, por volta de1943, em Fortaleza. A causa de sua morte teria sido por conta de uma malária que ele teria adquirido na região Norte. No seu túmulo se encontra escrito, a seu pedido, o seguinte epitáfio: “O Padre eterno, segundo refere à história sagrada, tirou o mundo do nada, e eu nada tirei do mundo”. Seu corpo se encontra sepultado no cemitério São João batista, em Fortaleza. Recebeu em sua homenagem o nome de um bairro e de uma escola na cidade de Fortaleza.

Filosofia Literária

Descreveu, em sua obra, elementos da tradição oral que eram popularizados no folclore brasileiro. Enaltecendo pontos da aura climática ligada a natureza paisagística de algumas regiões. Tinha o domínio de uma escrita assertiva, em que alinhava aspectos inovadores com um refinamento discursivo. Sua obra é um importante documento histórico que preserva, até os dias de hoje, boa parte da cultura popular, de seu tempo. Transitou seu estilo literário pelas veias do parnasianismo e pelos ideais do romantismo, valendo-se do conto, da poesia e da oratória como instrumentos de consolidação de sua obra. Criou figuras lendárias que alimentaram o imaginário popular, utilizando-se das chamadas tiradas de humor sarcástico. Encabeçou a campanha política de um personagem conhecido até os dias de hoje como o “bode ioiô”. Também chegou a construir outras histórias sobre o personagem o “Cabeleira” da obra do escritor Franklin Távora, em que descreve um personagem mais humano. Defendeu um sistema de educação popular que contemplasse os menos favorecidos.  Atuou com brilhantismo e sagacidade em várias causas jurídicas que eram consideradas de difícil absolvição. Ajudava os mais pobres e os mais desafortunados que eram vitimados pela injustiça social. Lutou contra a extinção da faculdade de Direito, proposta que chegou inclusive a ser cogitada em assembleia legislativa.

Filosofia do Direito

Relata-se que, certa vez, atuando como advogado, na área criminal, numa causa muito difícil, em uma grande audiência, apareceu como seu opositor um brilhante e intelectual promotor de justiça que citava de cabeça o nome dos maiores juristas nacionais e internacionais, e isso impressionavam tanto o juiz, bem como também o júri popular. Foi quando, então, o Dr. Quintino começou a citar o nome de outro nobre e grande jurista chamado de “Alberto Nepomuceno”. Postulou sua defesa citando uma perfeita argumentação, e era...invocando o tal de Dr, Nepomuceno aqui de um lado.... e aduzindo Nepomuceno acolá de outro. Quando, enfim, saiu à sentença dando causa favorável para o cliente do Dr. Quintino. Em seguida, o promotor veio parabenizá-lo e o indagou: - Dr. Quintino, eu já estudei e ainda estudo muito essa nossa área do Direito criminal, mas devo lhe confessar que nunca ouvi falar do Dr. Nepomuceno. Gostaria de saber mais sobre ele. Logo depois o Dr. Quintino responde: “eu também não conheço, acabei de inventar”. Nessa época, os poetas e boêmios intelectuais de Fortaleza conviviam pelos conhecidos cafés da famosa Praça do Ferreira. Então, posteriormente se descobriu que o tal de Dr. Alberto Nepomuceno, seria na verdade um erudito maestro, grande estudante da área de música, que frequentava esses locais da praça.

Comenta-se que, em certa ocasião, um andarilho maltrapilho vivia sofrendo chacota de um arrogante morador da cidade, que era muito influente e tinha grande poder aquisitivo. Até que, em um fatídico dia, o maltrapilho cansado das ofensas, acabou assassinando seu ofensor. Devido a grande influência da família da vítima ninguém queria defender o acusado. Então, Dr. Quintino aparece de surpresa no dia do julgamento final, veste a toga e se apresenta como advogado de defesa. Após o promotor realizar uma brilhante explanação em desfavor do réu, Dr. Quintino inicia sua defesa apenas com elogios aos presentes: “Senhor Meritíssimo Juiz, Nobre e estimado Promotor, caros e ilustres jurados” redisse a frase por várias vezes, até que enfim foi interrompido pelo o Juiz que falou em tom ríspido e nervoso: - Dr. Quintino vamos logo, conclua seu raciocínio. Logo em seguida, Dr. Quintino responde. Vejam bem senhores aqui presente, faz somente, menos de dez minutos que repito apenas elogios a todos vocês e alguns aqui, já estão impacientes e irritados, imaginem então vocês, como esse pobre infeliz não deve ter se sentido ao receber a mesma ofensa por quase dez anos, qualquer um aqui nessa sala poderia ter feito o mesmo. Menciona-se que, logo depois, os jurados votaram a favor da absolvição do réu.

Narra-se um outro caso curioso que aconteceu com um rapaz pobre que não tinha como custear sua defesa. O acusado, enciumado tinha tentado um crime passional contra a vida de um rival. Ninguém queria realizar a defesa porque o crime tinha chocado a sociedade. Dr. Quintino assume o caso, mesmo sobre orientações contrárias dos colegas, pois era uma causa perdida. Depois que a acusação realizou seu discurso, segura da condenação, Dr. Quintino começa sua defesa dizendo: Senhores jurados, não olhem para o crime desse pobre infeliz, que merecia receber prisão perpétua, mas antes de tudo, orem, eu digo orem pela mãezinha, já velha e doente deste traste, ela que tanto fez por nossa cidade, e agora jaz esquecida num leito de uma cama, e nesse momento reza implorando misericórdia e justiça para com ela, pois ela só tem ele como filho, e chora esperando que ele entre agora pela porta do quarto, para cuidar dela. Conta-se que o resultado foi pela absolvição do réu, após o final da sessão, um dos jurados se dirige ao Dr. Quintino e pergunta. – “Dr. Gostaria de solicitar o endereço dessa família, eu queria fazer uma doação para ajudá-los”. Dr. Quintino, então responde: - “Ora! Eu sei lá onde mora esse imprestável, nem sei ao menos se este infeliz algum dia teve mãe.

Filosofia Sapiencial

+ “A escola é uma prisão onde se aprende a ser livre”.

+ “A fome não respeita virtudes, quanto mais fronteiras”

+ “O cearense é como o passarinho, tem que voar para fazer o ninho”

+ “Há homens de caráter mudo, que pensam que ser sério, é ser sisudo”

+ “No Ceará, o sujeito nasce na fé, cresce na esperança e morre na caridade”

+ “Vê como se separam duas águas, que se querem reunir, mas visualmente; É um coração que quer reunir as mágoas de um passado, às venturas de um presente”.

+ “Na história da teimosia, entra a rudeza e a arrogância, é tão forte a ignorância, tão cruenta, tão mendaz, que a própria sabedoria; de tudo, sabendo tanto, não pode saber de quanto o ignorante é capaz”.

 

Fatos e Curiosidades

Conta-se que, certo dia, Quintino Cunha estava descontraidamente pescando, em um lago, na região do Amazonas. Quando, em dado momento, surgiu uma canoa com dois homens que se aproximaram. Um deles cumprimentou o Sr. Quintino e o indagou. - Bom dia senhor! O que está fazendo? Ele então respondeu com um sorriso irônico:  “Estou pescando a vida”. Relata-se que esse senhor era o escritor Euclides da Cunha, e que a partir desse momento, os dois se tornaram grandes amigos. Posteriormente, os dois passeando entre os rios se encontraram por acaso, a proa da canoa de um, colidiu com a do outro, então Dr. Quintino reverberou – Euclides esse rio é muito estreito para as nossas duas cunhas. Referindo-se a ideia de que os dois possuíam o mesmo sobrenome.

Fala-se que, em dada época, na cidade de Fortaleza, existiam dois conceituados periódicos de grande circulação. O Dr. Quintino escrevia para um, e um outro redator, que era seu opositor nas ideias, colaborava com o segundo periódico. Os dois escritores não se bicavam. Certa ocasião, os amigos do Dr. Quintino resolveram fazer um aniversário surpresa para ele, quando do nada, apareceu sem ser convidado o seu rival. Após os parabéns, entra na sala seu contendor, o mesmo trazia nas mãos, dentro de uma caixa enfeitada, um presente embrulhado. Todos ficaram em silêncio e aguardaram o Dr. Quintino abrir o pacote, após o suspense, Quintino retira de dentro do embrulho, um chapéu em formato de chifres. Um pouco constrangido, ele permanece em silêncio. Passado alguns dias, nada tinha sido retratado sobre o fato nas linhas dos periódicos. Até que depois de poucos meses, na comemoração do aniversário de seu algoz, seu rival organiza uma grande festa para toda a nata da elite cearense, mas decide não convidar o Dr. Quintino. Todos esperavam que Dr. Quintino aparecesse de penetra, porém para surpresa de todos, Quintino só surge no final da festa e aguarda todos na saída, traz em sua mão um pacote semelhante ao que recebeu com os mesmo enfeites. Entrega o presente para o aniversariante que sem graça abre o embrulho pensando que seria algo parecido com o que tinha dado, mas para o espanto de todos, dentro tinha apenas um buquê de flores. Admirados os colegas questionam o que significava aquilo, então Dr. Quintino responde: “a gente só pode dá, aquilo que a gente tem”.

Obras:

A pulga; Diferentes; Os Mártires da Selva; Baturité; Folhas de Urtiga; Manual de História do Direito; De mim para os meus; Versos de Cores; Pelo Solimões; Voando com os Deuses da História; O Julgamento de Sócrates sob a luz do Direito; O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito; Questões Relevantes de Direito Penal e Processual Penal; A Morte de Cabeleira; O estilo da Jurisprudência; Campanha Prorabelo e Discursos; Vir para Voltar; A Vida no Ceará.  

Fontes:

ACL. Pesquisa Histórica. Quintino Cunha. Site: Academia Cearense de Letras. Fortaleza: Copyright, acesso em 2023.

BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias: vultos do passado. Rio de Janeiro: Editora Conquista, 1973.

CUNHA, Lourdite. Quintino Cunha: No conceito de seus contemporâneos. Rio de Janeiro: Editora Pongetti, 1955.

CUNHA, Quintino. Pelo Solimões: Versos norte-brasileiros. Manaus: Editora Valer, 1999.

CUNHA, Plautus. Flagrantes da vida genial de Quintino Cunha. Fortaleza: Editora Sebo Cultural, 1974.

_______________Quintino Cunha e Outros. Fortaleza: Editôra Angelo Accetti, 1974.

GIRÃO, Raimundo. A Academia de 1894. Fortaleza: ACL, 1975.

________________O Ceará. Fortaleza: Instituto do Ceará, 1966.

KRUGER, Marcos Frederico; TELLES, Tenório. Poesia e Poetas do Amazonas. Col. Resgate. Manaus: Editora Valer, 1999.  

LINHARES, Mário. História Literária do Ceará. Fortaleza: Federação das Academias de Letras, 1948.

MENESES, Erigutemberg. Quintino Cunha: Estilo na Jurisprudência e nas Letras. Blumenau: Editora do Autor, 2021.

SOLDON, Renato. Verve Cearense.  Fortaleza: Instituto do Ceará, 1969.