domingo, 10 de setembro de 2023

Quintino Cunha

Quintino Cunha - (1875 a 1943) d.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

José Quintino da Cunha – Foi um filósofo cearense ligado as correntes de pensamento positivistas. Relacionou seus saberes entre ideias cientificistas e as concepções do romantismo literário. Escreveu sua obra em formato de poesias, repentes, modinhas e sátiras. Era considerado por alguns pesquisadores como “o pai do humor cearense”, tendo ficado afamado, por conta de seu carisma simpatizante e pelo seu estilo irreverente, de anedotas ácidas. Possuía profunda eloquência e notável poder de oratória. Era de origem humilde e sua família não possuía grandes posses. Conta-se que, com apenas 11 anos de idade, o menino já praticava atividades laborais para um periódico local. Iniciou seus estudos no Ginásio Cearense, tendo depois migrado para o Colégio Militar de Fortaleza. Atuou por um tempo como rábula, antes de obter diploma na área. No campo literário ficou conhecido como o “Bocage Cearense”. Na área jurídica como o advogado dos pobres. Graduou-se, em Ciências Jurídicas, pela Faculdade de Direito do Ceará, por volta de 1909.

Exerceu os ofícios de militar, político, escritor e advogado criminalista. Era filho de um conceituado filólogo, chamado de João Quintino da Cunha, com uma ilustre professora conhecida por Maria Maximina Ferreira Gomes. Foi membro da Academia Cearense de Letras. Nasceu na cidade de Itapajé, em 1875 e veio a falecer, por volta de1943, em Fortaleza. A causa de sua morte teria sido por conta de uma malária que ele teria adquirido na região Norte. No seu túmulo se encontra escrito, a seu pedido, o seguinte epitáfio: “O Padre eterno, segundo refere à história sagrada, tirou o mundo do nada, e eu nada tirei do mundo”. Seu corpo se encontra sepultado no cemitério São João batista, em Fortaleza. Recebeu em sua homenagem o nome de um bairro e de uma escola na cidade de Fortaleza.

Filosofia Literária

Descreveu, em sua obra, elementos da tradição oral que eram popularizados no folclore brasileiro. Enaltecendo pontos da aura climática ligada a natureza paisagística de algumas regiões. Tinha o domínio de uma escrita assertiva, em que alinhava aspectos inovadores com um refinamento discursivo. Sua obra é um importante documento histórico que preserva, até os dias de hoje, boa parte da cultura popular, de seu tempo. Transitou seu estilo literário pelas veias do parnasianismo e pelos ideais do romantismo, valendo-se do conto, da poesia e da oratória como instrumentos de consolidação de sua obra. Criou figuras lendárias que alimentaram o imaginário popular, utilizando-se das chamadas tiradas de humor sarcástico. Encabeçou a campanha política de um personagem conhecido até os dias de hoje como o “bode ioiô”. Também chegou a construir outras histórias sobre o personagem o “Cabeleira” da obra do escritor Franklin Távora, em que descreve um personagem mais humano. Defendeu um sistema de educação popular que contemplasse os menos favorecidos.  Atuou com brilhantismo e sagacidade em várias causas jurídicas que eram consideradas de difícil absolvição. Ajudava os mais pobres e os mais desafortunados que eram vitimados pela injustiça social. Lutou contra a extinção da faculdade de Direito, proposta que chegou inclusive a ser cogitada em assembleia legislativa.

Filosofia do Direito

Relata-se que, certa vez, atuando como advogado, na área criminal, numa causa muito difícil, em uma grande audiência, apareceu como seu opositor um brilhante e intelectual promotor de justiça que citava de cabeça o nome dos maiores juristas nacionais e internacionais, e isso impressionavam tanto o juiz, bem como também o júri popular. Foi quando, então, o Dr. Quintino começou a citar o nome de outro nobre e grande jurista chamado de “Alberto Nepomuceno”. Postulou sua defesa citando uma perfeita argumentação, e era...invocando o tal de Dr, Nepomuceno aqui de um lado.... e aduzindo Nepomuceno acolá de outro. Quando, enfim, saiu à sentença dando causa favorável para o cliente do Dr. Quintino. Em seguida, o promotor veio parabenizá-lo e o indagou: - Dr. Quintino, eu já estudei e ainda estudo muito essa nossa área do Direito criminal, mas devo lhe confessar que nunca ouvi falar do Dr. Nepomuceno. Gostaria de saber mais sobre ele. Logo depois o Dr. Quintino responde: “eu também não conheço, acabei de inventar”. Nessa época, os poetas e boêmios intelectuais de Fortaleza conviviam pelos conhecidos cafés da famosa Praça do Ferreira. Então, posteriormente se descobriu que o tal de Dr. Alberto Nepomuceno, seria na verdade um erudito maestro, grande estudante da área de música, que frequentava esses locais da praça.

Comenta-se que, em certa ocasião, um andarilho maltrapilho vivia sofrendo chacota de um arrogante morador da cidade, que era muito influente e tinha grande poder aquisitivo. Até que, em um fatídico dia, o maltrapilho cansado das ofensas, acabou assassinando seu ofensor. Devido a grande influência da família da vítima ninguém queria defender o acusado. Então, Dr. Quintino aparece de surpresa no dia do julgamento final, veste a toga e se apresenta como advogado de defesa. Após o promotor realizar uma brilhante explanação em desfavor do réu, Dr. Quintino inicia sua defesa apenas com elogios aos presentes: “Senhor Meritíssimo Juiz, Nobre e estimado Promotor, caros e ilustres jurados” redisse a frase por várias vezes, até que enfim foi interrompido pelo o Juiz que falou em tom ríspido e nervoso: - Dr. Quintino vamos logo, conclua seu raciocínio. Logo em seguida, Dr. Quintino responde. Vejam bem senhores aqui presente, faz somente, menos de dez minutos que repito apenas elogios a todos vocês e alguns aqui, já estão impacientes e irritados, imaginem então vocês, como esse pobre infeliz não deve ter se sentido ao receber a mesma ofensa por quase dez anos, qualquer um aqui nessa sala poderia ter feito o mesmo. Menciona-se que, logo depois, os jurados votaram a favor da absolvição do réu.

Narra-se um outro caso curioso que aconteceu com um rapaz pobre que não tinha como custear sua defesa. O acusado, enciumado tinha tentado um crime passional contra a vida de um rival. Ninguém queria realizar a defesa porque o crime tinha chocado a sociedade. Dr. Quintino assume o caso, mesmo sobre orientações contrárias dos colegas, pois era uma causa perdida. Depois que a acusação realizou seu discurso, segura da condenação, Dr. Quintino começa sua defesa dizendo: Senhores jurados, não olhem para o crime desse pobre infeliz, que merecia receber prisão perpétua, mas antes de tudo, orem, eu digo orem pela mãezinha, já velha e doente deste traste, ela que tanto fez por nossa cidade, e agora jaz esquecida num leito de uma cama, e nesse momento reza implorando misericórdia e justiça para com ela, pois ela só tem ele como filho, e chora esperando que ele entre agora pela porta do quarto, para cuidar dela. Conta-se que o resultado foi pela absolvição do réu, após o final da sessão, um dos jurados se dirige ao Dr. Quintino e pergunta. – “Dr. Gostaria de solicitar o endereço dessa família, eu queria fazer uma doação para ajudá-los”. Dr. Quintino, então responde: - “Ora! Eu sei lá onde mora esse imprestável, nem sei ao menos se este infeliz algum dia teve mãe.

Filosofia Sapiencial

+ “A escola é uma prisão onde se aprende a ser livre”.

+ “A fome não respeita virtudes, quanto mais fronteiras”

+ “O cearense é como o passarinho, tem que voar para fazer o ninho”

+ “Há homens de caráter mudo, que pensam que ser sério, é ser sisudo”

+ “No Ceará, o sujeito nasce na fé, cresce na esperança e morre na caridade”

+ “Vê como se separam duas águas, que se querem reunir, mas visualmente; É um coração que quer reunir as mágoas de um passado, às venturas de um presente”.

+ “Na história da teimosia, entra a rudeza e a arrogância, é tão forte a ignorância, tão cruenta, tão mendaz, que a própria sabedoria; de tudo, sabendo tanto, não pode saber de quanto o ignorante é capaz”.

 

Fatos e Curiosidades

Conta-se que, certo dia, Quintino Cunha estava descontraidamente pescando, em um lago, na região do Amazonas. Quando, em dado momento, surgiu uma canoa com dois homens que se aproximaram. Um deles cumprimentou o Sr. Quintino e o indagou. - Bom dia senhor! O que está fazendo? Ele então respondeu com um sorriso irônico:  “Estou pescando a vida”. Relata-se que esse senhor era o escritor Euclides da Cunha, e que a partir desse momento, os dois se tornaram grandes amigos. Posteriormente, os dois passeando entre os rios se encontraram por acaso, a proa da canoa de um, colidiu com a do outro, então Dr. Quintino reverberou – Euclides esse rio é muito estreito para as nossas duas cunhas. Referindo-se a ideia de que os dois possuíam o mesmo sobrenome.

Fala-se que, em dada época, na cidade de Fortaleza, existiam dois conceituados periódicos de grande circulação. O Dr. Quintino escrevia para um, e um outro redator, que era seu opositor nas ideias, colaborava com o segundo periódico. Os dois escritores não se bicavam. Certa ocasião, os amigos do Dr. Quintino resolveram fazer um aniversário surpresa para ele, quando do nada, apareceu sem ser convidado o seu rival. Após os parabéns, entra na sala seu contendor, o mesmo trazia nas mãos, dentro de uma caixa enfeitada, um presente embrulhado. Todos ficaram em silêncio e aguardaram o Dr. Quintino abrir o pacote, após o suspense, Quintino retira de dentro do embrulho, um chapéu em formato de chifres. Um pouco constrangido, ele permanece em silêncio. Passado alguns dias, nada tinha sido retratado sobre o fato nas linhas dos periódicos. Até que depois de poucos meses, na comemoração do aniversário de seu algoz, seu rival organiza uma grande festa para toda a nata da elite cearense, mas decide não convidar o Dr. Quintino. Todos esperavam que Dr. Quintino aparecesse de penetra, porém para surpresa de todos, Quintino só surge no final da festa e aguarda todos na saída, traz em sua mão um pacote semelhante ao que recebeu com os mesmo enfeites. Entrega o presente para o aniversariante que sem graça abre o embrulho pensando que seria algo parecido com o que tinha dado, mas para o espanto de todos, dentro tinha apenas um buquê de flores. Admirados os colegas questionam o que significava aquilo, então Dr. Quintino responde: “a gente só pode dá, aquilo que a gente tem”.

Obras:

A pulga; Diferentes; Os Mártires da Selva; Baturité; Folhas de Urtiga; Manual de História do Direito; De mim para os meus; Versos de Cores; Pelo Solimões; Voando com os Deuses da História; O Julgamento de Sócrates sob a luz do Direito; O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito; Questões Relevantes de Direito Penal e Processual Penal; A Morte de Cabeleira; O estilo da Jurisprudência; Campanha Prorabelo e Discursos; Vir para Voltar; A Vida no Ceará.  

Fontes:

ACL. Pesquisa Histórica. Quintino Cunha. Site: Academia Cearense de Letras. Fortaleza: Copyright, acesso em 2023.

BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias: vultos do passado. Rio de Janeiro: Editora Conquista, 1973.

CUNHA, Lourdite. Quintino Cunha: No conceito de seus contemporâneos. Rio de Janeiro: Editora Pongetti, 1955.

CUNHA, Quintino. Pelo Solimões: Versos norte-brasileiros. Manaus: Editora Valer, 1999.

CUNHA, Plautus. Flagrantes da vida genial de Quintino Cunha. Fortaleza: Editora Sebo Cultural, 1974.

_______________Quintino Cunha e Outros. Fortaleza: Editôra Angelo Accetti, 1974.

GIRÃO, Raimundo. A Academia de 1894. Fortaleza: ACL, 1975.

________________O Ceará. Fortaleza: Instituto do Ceará, 1966.

KRUGER, Marcos Frederico; TELLES, Tenório. Poesia e Poetas do Amazonas. Col. Resgate. Manaus: Editora Valer, 1999.  

LINHARES, Mário. História Literária do Ceará. Fortaleza: Federação das Academias de Letras, 1948.

MENESES, Erigutemberg. Quintino Cunha: Estilo na Jurisprudência e nas Letras. Blumenau: Editora do Autor, 2021.

SOLDON, Renato. Verve Cearense.  Fortaleza: Instituto do Ceará, 1969.

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