Górgias de
Leontinos – (485 a 380) a.C
Autor: Alysomax
Soares
Introdução
Foi um filósofo da
antiguidade grega pertencente à escola conhecida como sofismo. Fez parte da
primeira geração de sofistas. Era muito fluente na arte da comunicação, tendo
se destacado na oratória, retórica e dialética. Possuía grande eloquência e
poder de persuasão. O termo “gorgianizar” se refere ao seu estilo de oratória
próprio e original. Sua retórica encantava
os ouvintes devido ao requinte teatral com que ele explanava suas ideias. Seu
pensamento lhe rendeu o título de pai da sofística. Exerceu muita influência entre os primeiros sofistas
no campo da educação, sendo visto como um filósofo itinerante, que também
desenvolveu conceitos sobre a arte da fala. Em seus discursos tinha
bastante habilidade em improvisar as falas. Atuou como embaixador e chegou a
viajar por grande parte da Grécia antiga. Suas obras abordavam principalmente
conceitos relacionados ao relativismo, ao ceticismo-absoluto, ao subjetivismo e
ao asceticismo. A maioria dos sofistas cobrava pelos seus ensinamentos na arte
da oratória, por isso eles foram bastante criticados pelos filósofos da época.
Os sofistas sofreram duras críticas dos filósofos clássicos como
Sócrates, Platão e Aristóteles. Górgias nasceu em 485 a.C, na região de
Leontinos¹ e faleceu, por volta de 380 a.C, na localidade de Tessália, morreu muito
velho, com mais de cem anos de idade.
Filosofia da
Linguagem
Górgias foi
considerado um inovador na arte da retórica, pois introduziu novas estruturas
linguísticas nos discursos, como por exemplo, a ideia de ornamentação e a
introdução da paradoxologia. Algumas de suas obras foram preservadas através de
um compilado de textos chamado de “Technai”, que era um manual
de instrução retórica, o qual consistia de modelos a serem memorizados, e que
também demonstrava diversos princípios da prática retórica. Para ele, não
importava quem estaria certo ou errado na defesa da verdade, nem quem estaria
com a razão, em um debate de ideias, mas sim quem dominava a retórica, isto é,
a arte da fala. Desse modo, quem discursasse melhor atingiria a ideia de razão.
Dizia que a verdade não existia em si mesma, o que existiria seria a arte de
argumentar com eloquência e competência.
O estilo de
Górgias era considerado performático, devido o esforço que ele fazia para
demonstrar sua habilidade retórica e para convencer as pessoas através de um argumento
absurdo. Górgias utilizava em seus discursos e escritos, estratégias como a
paródia, a figuração artificial e a teatralidade. Utilizava-se também de ideias
impopulares e de paradoxos. Seu discurso argumentativo era descrito como sendo
de poesia sem métrica. Ele acreditava que as palavras persuasivas continham uma
força que era equivalente as palavras divinas. Em uma de suas obras, ele faz
uma analogia dizendo que as palavras tinham um efeito na alma parecida com o
efeito das drogas no corpo. Veja o que ele diz:
“Assim como diferentes drogas trazem à tona os
diferentes humores do corpo - alguns interrompendo uma doença, outros a vida -
o mesmo ocorre com as palavras: algumas causam dor, outras alegria, algumas
provocam o medo, algumas instilam em seus ouvintes a ousadia, outras tornam a
alma muda e enfeitiçada com crenças más”. (Górgias).
Explicava
que as palavras tinham poder de encantamento, podendo curar a alma e controlar
fortes emoções. Seu estilo poético encantava as plateias. Górgias argumentava
que a virtude era relativa a cada pessoa, por isso ele não acreditava que a
virtude poderia ser ensinada de maneira igual para todos. Portanto, a retórica
seria a rainha de todas as ciências, pois era capaz de persuadir qualquer curso
de ação, em um indivíduo. Ele obrigava seus discípulos a decorar passagens
importantes da literatura, com a finalidade deles dominarem o uso da linguagem.
Sua persuasão era realizada de maneira parecida com a magia e o encantamento,
utilizando-se, para isso, do instrumento da linguagem, daí ele empregava o
discurso como uma espécie de feitiço.
Filosofia do
Conhecimento
Górgias acreditava
que não existia um fundamento absoluto para a verdade. Para ele, nada “é”, a
verdade do mundo seria incompreensível, e o conceito de verdade era criação da
imaginação. Assim como outros sofistas, Górgias não acreditava em uma verdade
única, pois dizia que os sentidos criavam uma ilusão em relação à verdade.
Nesse sentido, conhecer a verdade seria impossível, pois todo o conhecimento
era ilusório. A frase que melhor sintetizava
sua filosofia era: “Nada Existe”, a sentença parece ser a priori
simples, porém a expressão traduz um duplo sentido. Ele foi chamado de “niilista”,
pelo fato de não acreditar em uma verdade universal. Sua obra se diferencia da
teoria de Protágoras na medida em que Górgias assumiu uma visão mais radical
sobre a impossibilidade de um critério absoluto. Enquanto para Protágoras o
relativismo poderia conduzir o pensamento para algo útil, para Górgias seria
impossível afirmar qualquer pensamento concreto, restando ao ser humano, apenas
uma atitude “niilista”, isto é, a inexistência de qualquer valor ou
critério que fundamentasse uma verdade.
Filosofia
da Natureza
Para
Górgias, o “ser” não existe, o que “existe” é
apenas o “nada”. Por isso, o “ser” é o “nada”.
Nesse sentido, se existisse alguma verdade o homem não seria capaz de conhecê-la,
e se pudesse imaginar esse conceito de “ser”, ainda sim, não
saberia como expressá-lo em palavras, logo, o homem fala sobre palavras em
relação ao saber e não sobre o que realmente é o “ser”. Assim, a
palavra não exprime uma verdade em si, mas apenas uma aparência sobre a
verdade. Explicava que não era apenas o “ser” que não existia,
mas que o “não-ser” também não poderia existir. Tudo, então,
seria apenas uma representação mental das coisas, que não estaria propriamente
conectada com a realidade, o homem comunicaria a “si e ao outro”, somente o “logoi”,
isto é, princípios “incriados”, não conseguindo expressar a real
substâncias das coisas. O que existiria no mundo não passaria de uma relação
metalinguística que teria sido convencionada pelo homem para explicar os
fenômenos de forma ilusória.
Ao
combater o pensamento da escola Eleata, Górgias afirmava que não haveria uma
conexão entre o “ser” e o “pensar”. Pois ele não
acreditava na existência do “ser”, daí logicamente não poderia
existir também o “pensar” e como consequência disso, não existiria uma verdade
absoluta. Esse conceito se baseava em suas três teses fundamentais que eram: “o
ser não existe; o ser é incognoscível; e o ser é inexprimível”.
Em
relação à primeira tese ele defendia a não existência do “ser” alegando
que não era possível diferenciar o “ser” do “não-ser”, logo, “Nada
é”. Também explicava que o “ser” não poderia ser gerado e
nem poderia ser eterno. E por fim ele concluía que também não poderia ser “uno” e
nem “múltiplo”. Com isso, ele definia como inviável a ideia
de “ser” como sendo um fundamento substancial da realidade,
pois se o “ser” fosse colocado em primeiro plano como realidade
fundamental, logo se pensaria na ideia do “não-ser” como
existência oposta. A aceitação do “não-ser” terminaria
por “nadificar”, isto é, eliminar o conceito de “ser”. Nesse
contexto, seu surgimento fazia dele um outro “ser”. Portanto,
posicionados os dois lado a lado, “ser” e “não-ser” deixariam
equivalentemente de “ser”.
Na
segunda tese, ele discorria sobre o incognoscível, ou seja, sobre a
impossibilidade de conhecimento real do “ser”. Pois o “ser” não
possuiria um sentido físico como a visão ou a audição, para traduzir o que era
o real “ser” das coisas. O homem não possuía um sentido com
capacidade de apreensão cognitiva do “ser”. A mente não conseguiria
imaginar situações que “não-são”, logo, ela possuiria limites para
projetar experiências que envolvessem questões do “não-ser”. Como
as situações ilógicas por exemplo. Portanto, também não seria possível
diferenciar os fenômenos que “são”, dos que “não-são”. Nesse
sentido, sobre o mesmo ponto de vista, seria inconcebível dissociar o “ser” do “não-ser”.
Por
fim, na terceira tese ele dissecava a respeito da incomunicabilidade do ser.
Aqui, ele parte do principio da falseabilidade das duas hipóteses anteriores.
Supondo que o “ser” exista e que possa ser conhecido através
do sentido de apreensão. Ele, então se questiona: - como isso poderia ser comunicado?
Para Górgias, as palavras não possuem a função de transmissão, elas servem
apenas para rememorar a mente sobre algo. Não existiria uma transmissão real
das coisas através das palavras, mas somente uma aparente ilusão que afetaria
as experiências sensoriais, fazendo as pessoas interligarem um acontecimento a
uma vaga lembrança da palavra. Como não existe um sentido específico para a
apreensão do “ser”, não poderia existir essa recordação entre o
sentido e a palavra em um caso singular, ou seja, se fosse possível perceber
o “ser” das coisas, nessa lógica, não seria possível
comunicá-la, pois para Górgias a experiência seria sempre de caráter pessoal e
não poderia ser transferido. Não podendo a percepção das coisas, ser expresso
de maneira concreta. Por fim, então ele conclui: “Nada existe e, se existisse nós não o conheceríamos e, se pudéssemos
conhecer, não saberíamos explicar essa existência para ninguém”.
Elogio
de Helena
Na
obra o “Elogio de Helena” Górgias retrata o poder que um
discurso poético tem na alma humana. Ele mostra como as palavras podem afetar
as emoções de uma pessoa. Por isso, ao mexer com os sentimentos as palavras
podem retirar a autonomia e o poder de decisão de uma pessoa. Para esse
filósofo, o homem vive perdido na ilusão da ignorância e em vista disso, pode
ser facilmente manipulado. O discurso poético pode, então, conduzir facilmente
essas pessoas por caminhos ao qual o orador possua a intenção de levar. Observe
um pequeno trecho que foi traduzido dessa obra:
“Ordem, para a cidade, virilidade; para o corpo, beleza; para a alma,
sabedoria; para o ato, excelência e verdade; para o discurso. O contrário
destes, desordem. Tanto homem, quanto mulher; tanto discurso, quanto obra;
tanto cidade, quanto assunto privado é preciso, por um lado, com louvor, honrar
o digno de louvor; por outro lado, repreender ao indigno. Pois igual erro e
ignorância é repreender coisas louváveis e louvar coisas repreensíveis”.
(Górgias).
Ao
explicar o poder que existia na ideia de “logos” ele advertia que “Helena”
só poderia ter fugido com “Páris” em quatro hipóteses previsíveis: força
física, vontade dos deuses, persuasão pela fala ou seduzida pelo “amor Eros”
(desejo erótico). Com isso, em nenhum desses casos, ela teria culpa, dessa
forma, não seria justo responsabilizá-la. Sua inocência era ainda maior na
hipótese da persuasão pela fala, pois um belo discurso ornamentado pelo “logos” poderia
impressionar a alma e fazê-la mudar suas crenças, passando a vítima a agir de
acordo com a vontade do hipnotizador. Esse poder causado pelo bom orador teria
a mesma equivalência de coação da força física ou da vontade dos deuses.
Filosofia
Sapiencial
+
“Não há nada que seja ou exista”.
+
“O artista é um criador de mundos”.
+ “As coisas não são mais do que não são”.
+
“Mesmo que as coisas sejam elas não são conhecíveis”.
+
“O que parece a mim é para mim, e o que parece a ti é para ti”.
+
“A persuasão aliada a palavras modela a mente dos homens como quiser”.
+
“O ser não é uno, não é múltiplo, não criado e nem gerado, por conseguinte o
“ser” é “nada”.
+ “A persuasão é
soberana, porque não há nenhuma verdade acima da que um homem pode ser
persuadido a crer”.
+
"Como alguém pode se comunicar a ideia de cor por meio de palavras, pois o
ouvido não ouve cores, mas somente sons?"
+
“Frente ao drama da vida a única consolação é a palavra que adquire valor
próprio porque não exprime a verdade, mas a aparência”.
+
“O ser não existe; se existisse, não poderia ser reconhecido; mesmo que fosse
conhecido, não poderia ser comunicado a ninguém”.
+
“Se é eterno não teve princípio, se não tem princípio é infinito, se é infinito
não está em nenhum lugar, se não está em nenhum lugar não existe”.
+ “A boa ordem da
cidade é a coragem dos seus cidadãos; a do corpo, a beleza; a da alma, a
sabedoria; a da ação, a excelência; e a do discurso, a verdade”
+
“A arte da persuasão ultrapassa todas as outras, e é de muito a melhor, pois
ela faz de todas as coisas suas escravas por submissão espontânea e não por
violência”.
+
“Assim como a visão não conhece os sons, o ouvido não ouve as cores, mas os
sons. Quem fala expressa bem um som, mas não pode falando expressar uma cor ou
uma experiência”.
+
“Difícil explicar o que leva o ser a direcionar as suas ações em função do
meio. Por vezes deixamos de fazer tanta coisa, justamente por conta do meio.
Liberte-se, escuta a tua intuição e serás feliz”.
+
“Podemos somente analisar a condição em que nos encontramos e expor o que
devemos ou não fazer e mesmo o que devemos ou não fazer muda muito dependendo
da situação em que nos encontramos”.
+
"O Discurso é um senhor soberano que, com um corpo diminuto e quase
imperceptível, leva a cabo ações divinas. Na verdade, ele tanto pode deter o
medo como afastar a dor, provocar a alegria e intensificar a compaixão".
+
“A poesia é um discurso com métrica e quem a escuta é invadido por um arrepio
de estupor, uma compaixão que arranca lágrimas, um ardente desejo de dor e pelo
efeito das palavras a alma sofre seu próprio sofrimento ao ouvir a sorte ou o
azar de fatos e pessoas estranhas”.
+ “Uma tal ilusão
que, por um lado, o que cria a ilusão é mais justo que aquele que não a cria e,
por outro lado, aquele que se deixa encantar é mais sábio que aquele que não se
deixa levar. De fato, um é mais justo porque aquilo que prometeu fê-lo; o
outro, o que cede ao encanto, é mais sábio: com efeito, deixa-se levar pelo
prazer das palavras, o que não deixa de ter um sentido.”
Obras:
Discursos;
O Elogio de Helena; A Defesa de Palamedes; A Oração Fúnebre; O Discurso Olímpico; O Elogio dos Elisinos; O Elogio
de Aquiles; A Arte Oratória; O Onomástico; Elogio a cidade de Eléia; Tratado do Não Ente ou Sobre o não-ser.
Fontes:
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Notas:
_________________
¹Leontinos era uma colônia grega da Grécia antiga que ficava localizada na costa leste da antiga Sicília.