Alcídamas de Eleia – (420 a 360) a.C
Autor: Alysomax Soares
Introdução
Foi um filósofo sofista da Grécia antiga que nasceu na cidade de Eleia.
Estudou oratória e especializou-se na arte da retórica. Foi também aluno de
Górgias e teve como principal oponente nos discursos o sofista Isócrates.
Chegou a lecionar na cidade de Atenas. Escreveu uma obra intitulada: “sobre
os sofistas” em que explicava que o maior objetivo de um bom orador
era poder falar com improviso sobre qualquer assunto. Alcídamas escrevia com um
estilo poético e trabalhava conceitos metafóricos em seus discursos.
Desenvolveu a técnica da “polytropía”, que quer dizer, falar de
maneira improvisada para públicos diversos, em locais variados. Alguns
estudiosos apontam uma forte influência de seus escritos nas obras de Platão.
Defendia que a escravidão não seria algo natural, mas sim uma convenção entre
as pessoas e que esse pacto era ocasionado pela supremacia do mais forte sobre
o mais fraco. Desse modo, ele dizia que: “Todos são livres por
natureza". Comparava o discurso escrito como sendo um simulacro de uma
escultura, isto é, uma mera cópia da realidade. Seu pai foi um importante
médico da antiguidade grega e um grande autor de textos eruditos, conhecido
como Díocles. Nasceu por volta de 420 a.C e veio a falecer, aproximadamente em
360 a.C.
Filosofia da Linguagem
A retórica defendida por este
pensador trabalhava a ideia de improvisação da fala no lugar da escrita. Para
ele, a escrita estaria em um estágio inferior ao da fala, por isso, os bons
oradores deveriam se destacar na arte da fala improvisada. Ele explicava, de forma
figurada, que aquele que conseguia transportar uma carga pesada, certamente
conduziria uma carga maneira, mas aquele que só movimentasse cargas leves,
dificilmente conduziria uma carga pesada. Essa citação tinha como objetivo
argumentar que, aqueles que apenas treinam os discursos de maneira escrita não
seriam capazes de manter o mesmo ritmo, em discursos improvisados. Enquanto
aqueles que, treinam a arte do improviso na fala, seguramente saberiam também,
escrever belos discursos, pois esses últimos, teriam tempo e recursos
suficientes, para fazer o que já sabem. Nesse ínterim, os indivíduos
acostumados com o fardo leve do tempo e com os macetes das técnicas escritas,
não saberiam como improvisar em ocasiões de debates. Alcídamas não
desqualificava os sofistas que faziam discursos escritos, mas apenas
considerava que, quem dominava a arte do improviso, em relação à fala, estaria
em um nível de superioridade em relação, aos que faziam uso apenas do recurso
da escrita. Outro exemplo que ele usava para explicar essa teoria, era a
seguinte: “um corredor rápido poderia facilmente seguir os mais lentos,
enquanto o lento não seria capaz de acompanhar os mais rápidos”.
Instruía que haveria três
gêneros de discurso em que se formaria a arte do convencimento, através das
palavras. Esses gêneros seriam: o forense, o público e o privado. Em relação ao
espírito de competição que predominava entre os gregos, Alcídamas sugeria que
fosse dado o nome de "violência" para a luta corpo a corpo, e o nome
de "contestação" para o combate de palavras. Nesse sentido, os
discursos longos que enfrentariam um embate com outros discursos longos,
levaria o nome de contestações forenses. E os debates que ficassem divididos
entre perguntas e respostas, deveriam ser chamados de controvérsias. Em relação
à retórica, aconselhava o orador a possuir um claro arranjo mental de seu
discurso, pois ele deveria preparar a estrutura principal, incluindo os
pensamentos e os argumentos mais importantes, porém precisaria se adaptar às
preocupações e as ideias da plateia ao falar.
Filosofia Pragmática
Para ele, a comunicação da
fala na vida pública teria mais utilidade no dia a dia, do que a comunicação
escrita. Por isso, a arte de improvisar na fala seria uma necessidade, enquanto
que a escrita teria menos aplicabilidade e prestabilidade na vida social. Seu
pensamento sobre a ideia de uma oratória prática se opunha à de Isócrates que
defendia a retórica literária. Ao passo que Alcídamas defendia o discurso oral,
Isócrates fazia apologia ao uso da escrita. Esse embate ficou conhecido como
discurso prático versus o discurso teórico. Ainda, segundo Alcídamas, aqueles
que se ocupam mais do discurso escrito poderiam ser comparados mais com
artesãos, do que com exímios oradores. Esclarecia que as pessoas com baixa
instrução poderiam se apropriar de alguns discursos escritos e fazerem algumas
modificações, imitando ou plagiando algum eminente escritor. Por isso, esses
discursos escritos, não seriam tão confiáveis quanto um falado. Já em relação à
oratória, ele justificava que quem dominasse essa arte, teria mais facilidade
de produzir um discurso escrito e também mais autêntico. Assim sendo, em
relação aos discursos ele argumentava:
Não é
desconhecido que aquele que fala belamente aos outros de improviso, entre o
tempo e o ócio, ao escrever diferentemente, será compositor de discursos.
Também não é imperceptível que aquele que elabora arranjos por meio da escrita,
ao ter composto os discursos de improviso, terá a mente cheia de dificuldade,
incerteza e confusão. (Alcídamas).
Ele defendia que a
praticabilidade da fala estaria associada a vários fatores convencionais como o
poder de contradizer falsas acusações, acalmar pessoas enfurecidas, aconselhar
os que cometem enganos e encorajar os descontentes. Por isso, a fala seria
indispensável para suprir as carências do homem. Segundo ele, a escrita requer
silêncio e o silêncio pode ser mal interpretado, culminando em desprezo.
Portanto, isso poderia gerar pessoas incapazes de atuar na vida política da “polis”.
A prática somente do discurso escrito, poderia levar os cidadãos a não saberem
improvisar em casos de situações embaraçosas ou em disputas políticas
imprevisíveis, aos quais poderiam surgir na “ágora”. Para
explicar isso, ele recorria a uma metáfora de um prisioneiro acorrentado
durante muito tempo. Desse modo, ele discorria que esse indivíduo aprisionado,
ao criar o hábito de andar com correntes e pesos sobre os pés, não teria a
mesma desenvoltura que os homens livres, para caminhar quando fosse liberto,
necessitando de certo tempo para se acostumar a andar normalmente de novo.
Dessa maneira, o costume da escrita teria o peso da pausa nas reflexões do
pensamento, levando os indivíduos a se tornarem prisioneiros desse mau hábito,
diante disso, os falantes teriam dificuldade de se expressarem de maneira
rápida, recorrendo à força do hábito de pausar o cérebro para refletir e falar.
Argumentava que o discurso
falado teria mais vantagens no sentido de aproveitamento das oportunidades
ocasionais que surgem durante um debate. Outra vantagem que ele citava,
seria em relação a uma situação tensa, em que a emoção pudesse levar um orador
a cometer erros, pois ele dizia que, para um bom orador, essa gafe poderia
passar despercebida pela dinâmica de uma boa eloquência, pontuando novas falas
e enfeitando o discurso, a ponto de levar os interlocutores a esquecerem a gafe,
para acompanhar os novos raciocínios, porém, no discurso escrito, o orador
fatalmente deixaria marcas e registros, que tornariam sua falha vergonhosa,
pois os interlocutores possuiriam tempo para pausar as informações, isso traria
vexame não apenas momentaneamente, mas também ficaria registrado, o discurso
desonroso, e isso dificilmente poderia ser corrigido.
Filosofia Sapiencial
+ "Todos são livres por
natureza"
+ “A dialética é a faculdade
do que resulta plausível”.
+ “São manufaturadas, as
coisas compostas e fabricadas”.
+ “A odisseia de Homero é um
belo espelho da vida humana”.
+ “Deus criou todos os homens
livres e não fez nenhum deles de escravo”.
+ "O professor deve ser,
por meio de sua técnica, tanto um encantador quanto conciso".
+ “O corredor rápido poderia
facilmente seguir os mais lentos, enquanto o lento não seria capaz de
acompanhar os mais rápidos”.
+ “Aqueles que escrevem
merecem o nome de sofista, enquanto aqueles que falam podem ser propriamente
chamados de sábios”.
+ “O hábil a levantar uma
carga pesada conduziria facilmente ao ter se voltado às cargas mais leves.
Enquanto aquele que vai de encontro, com força, às coisas leves não seria capaz
de carregar nada pesado”.
+ “Aquele que de longe
consegue arremessar o javali com sucesso e lançar a flecha fará o mesmo
facilmente de perto. Mas não é perceptível se aquele que as lança de perto
venha a conseguir fazer isso de longe”.
+ “O discurso falado
diretamente e impulsivamente tem uma alma e é vivo e é pertinente e é como os
corpos reais, enquanto o discurso escrito cuja natureza corresponde a uma
representação de uma coisa real carece de qualquer tipo de poder vivo”.
+ “Não seria risível, se
quando o arauto chamasse junto de si - quem dentre os cidadãos deseja falar na
assembleia? - ou quando a água da clepsidra já escoando nos tribunais, o orador
recorresse à sua tabuinha de escrever para recuperar e relembrar um discurso?”
+ “Todas as coisas boas e
belas são raras e difíceis, e se alcançam habitualmente por meio da prática,
porém as coisas banais e comuns tornam-se de fácil aquisição. Portanto, visto
que a escrita nos é mais manejável do que a fala, deveríamos claramente considerar
sua aquisição com valor menor do que a outra”.
+ “Visto que alguns dos chamados
sofistas se descuidaram da formação e da investigação, ainda que se vangloriem
e valorizem por se dedicarem a escrever discursos, eles não passam de leigos
inexperientes em matéria de eloquência.
Ostentando seus saberes através de textos, eles mostram possuir a menor parte
da arte retórica, muito embora a reivindiquem por inteiro. Por isso, eu me disponho a acusar os
discursos escritos”.
Obras:
Instrução de arte retórica;
Logos para os messênios; Uma palavra invocando as musas; Odisseu; Sobre aqueles
que escrevem discursos escritos ou sobre os sofistas; Um elogio da morte; Um elogio
a Naís, a cortesã; Elogio da Pobreza; Os Encômios.
Citações de filósofos
“Alcídamas diz que existem
quatro tipos de enunciados: expressão, exposição, questão e apóstrofe”. (Suda).
“Alcídamas nomeia quatro tipos
de discurso: Afirmação, negação, interrogatório e definição”. (Diógenes
Laércio).
As peripécias de Ulysses em a Odisseia – eram consideradas por Alcídamas como "um belo espelho da vida humana" (Aristóteles).
Fontes:
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário
de Filosofia. 5º ed. São Paulo: Editora Martins, 2007.
ARISTÓTELES. A
política. São Paulo: Editora Edipro, 2009.
BLASS, Fridericvs. Antiphontis
Orationes et fragmenta, adivnctis Gorgiae, Antisthenis. Alcidamantis,
declamationibvs. Leipzig: Teubner, 1892.
BURNET, John. A aurora
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CASSIN, Barbara. O
Efeito Sofístico: filosofia, retórica e literatura. São Paulo: PUCC,
2005.
DINUCCI, Aldo. Górgias
de Leotino. São Paulo: Oficina do Livro, 2017.
FILÓSTRATO, Flávio. História
dos Sofistas Ilustres. Londres: Loeb, 1989.
GUTHRIE, William. Os
sofistas. São Paulo: Editora Paulus, 2007.
HOOK, Van. Alcídamas
versus Isócrates: A fala versus a escrita. The Classical Weekly, 1918.
KERFELD, George. O
movimento sofista. São Paulo: Editora Loyola, 2003
LAÊRTIOS, Diógenes. Vidas
e doutrinas dos filósofos ilustres. 2ª ed. Brasília. UnB. 2008.
MCCOY, Marina. Platão e a
retórica de filósofos e sofistas. São Paulo: Editora Madras, 2010.
MUIR, Jonh. Alcídamas.
London: Bristol Classical Press, 2001.
REIS, Michel Ferreira. Tradução
do discurso: Sobre aqueles que escrevem discursos escritos ou sobre os sofistas
de Alcídamas. Brasília: Belas infiéis. V.9 n. 5. 2020.
SALLES, Lucio Lauro Barroso
Massafferri. As faces do sofista de Eleia. Rio de Janeiro:
Anais da filosofia clássica – UFRJ. v. 10, n. 20, 2016.
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