Nuno Marques –
(1652 a 1733) d.C
Autor: Alysomax
Soares
Introdução
Nuno Marques
Pereira foi um filósofo moralista luso-brasileiro do
período colonial. Adotou em seu estilo os elementos da arte barroca.
Utilizou-se da literatura alegórica e da narrativa informacional para descrever
seus saberes filosóficos. Escreveu sua “magnum opus” intitulada de “O Peregrino
da América”, registrando, com isso, sua participação na vida literária
brasileira. Devido seu trabalho singular na literatura basílica, a Academia
Brasileira de Letras (ABL) relançou várias outras edições de sua obra. Seu
escrito transcorria a respeito de questões morais e espirituais da alma humana,
pois era essencialmente de cunho moral-social e ético-cristã. Também revelava
alguns enaltecimentos sobre a beleza tropical do Brasil. Trabalhou como escritor
e presbítero secular do hábito de São Pedro. Chegou a cursar Direito na
universidade de Coimbra, em Portugal. Foi homenageado como patrono da cadeira
número 7 do antigo Silogeu Brasileiro. Seus escritos são considerados
importantes fontes que retratam a história, a etnografia, a literatura e o
folclore do período colonial. Nasceu no município de Cairú na Bahia, em 1652, e
faleceu na cidade de Lisboa, por volta de 1733.
Filosofia Moral
Tratou em sua obra
sobre a relação das práticas morais com os saberes teológicos. Transcorreu
sobre acontecimentos fantasiosos, singulares e curiosos que refletiam alguns
dos aspectos sociais. Nesse sentido, era considerado um dos fundadores da
narrativa ficcional brasileira. Ao longo de sua obra são descritos vários
conhecimentos sobre a história da filosofia antiga e medieval. Seu trabalho foi
caracterizado por estudiosos como sendo um saber enciclopédico, pois reunia
várias informações e estudos sobre assuntos variados. Na esfera literária, o
texto não se moldava a nenhuma estrutura textual específica, dado que a
narrativa possuía uma pluralidade tipológica, impedido uma delimitação
concreta, mas demonstrando uma riqueza de gêneros. A obra utilizava a figura de
linguagem como modo de representação entre a ficção e a realidade, ou seja, um
simbolismo alegórico. Sua teologia moral se ancorava na tese de que todos os
homens eram apenas peregrinos na Terra, e que a verdadeira pátria do ser humano
seria o céu. Posto isso, ele citava que:
“Ainda
há muito esforço para adquirir as seis virtudes da piedade religiosa, justiça,
prudência, magnanimidade e temperança. Entre as quatro virtudes morais, a
sabedoria deve ser especialmente levada em consideração. Em primeiro lugar, a
alma deve distanciar-se de toda leitura e opinião que não trata de Deus. A seguir,
fuja das más companhias, imitando os virtuosos e sábios. Em terceiro lugar,
conseguir uma viabilidade transparente e verdadeira entre o interior e o
exterior. Quarto, empregue nosso entendimento no conhecimento “volitivo” e
“eletivo” do que é realmente bom. Essa seria a melhor maneira de servir a Deus
e aos homens. Portanto, nossa vida deve ser uma peregrinação patrocinada pela
graça de Deus para obter o fruto desejado do Reino dos Céus." (Nuno
Marques, 1728).
O livro retratava
uma narrativa em torno de um peregrino que se deslocava do interior da Bahia em
direção a Minas Gerais. O protagonista revelava que não estaria em busca de
ouro ou de riquezas materiais, mas sim da salvação eterna. No caminho o
peregrino trava um diálogo com um ancião. O velho demonstra um sério interesse
em analisar as causas das perturbações políticas que assolavam o Brasil.
Durante a caminhada de um dos itinerantes, aos poucos vão se desvelando na
obra, alguns elementos mágicos que estão ligados ao folclore brasileiro e aos
multiculturalismos regionais. A peregrinação descrita evidenciava o homem em
seu aspecto dinâmico, mostrando uma ideia de movimento que estaria conectado
com a transitoriedade da vida. No transcorrer do diálogo, o personagem da obra
vai paulatinamente introduzindo suas reflexões e críticas morais. Dessa forma,
a existência humana se revelava em uma teia de significações e relações entre o
mundo material, espiritual e divino. Nesse ínterim, o “eu lírico” proferia
algumas críticas às situações sociais que se mostravam ao longo do caminho
como, por exemplo, as desordens urbanas, o fanatismo religioso e as injustiças
sociais. Assim sendo, Marques advertia que:
“É
este mundo estrada de Peregrinos, e não lugar nem habitação de moradores;
porque a verdadeira Pátria é o Céu. Pela razão de ser o céu nossa Pátria, cuida
para que da eternidade nunca vos descuideis, pois a presença de Deus é o ‘Sumo
Bem que se pode desejar’.” (Nuno Marques, 1728).
Filosofia da Mente
Segundo algumas
fontes, sua obra também refletia a respeito de conhecimentos psíquicos da alma
humana, relacionando esse saber com ideias dinâmicas do barroquismo. Diante dos
desafios que surgiam no caminho do peregrino, o autor descrevia ideias
relacionadas à “psicomaquia”, isto é, a existência de uma batalha espiritual
entre as virtudes e os vícios humanos. Seus ensinamentos morais se relacionavam
com as vicissitudes existenciais que assombravam a alma humana. Misturava cenas
do cotidiano e da realidade com misticismo e ficção. O sincretismo cultural,
que o movimento do barroco promoveu no Brasil colônia, colaborou com a
construção dos primeiros passos da identidade brasileira. Despertando a
autonomia e a autenticidade do espírito nacional. Dessa forma, a obra se
revelou como sendo um fiel espelho dos costumes, do ambiente social, do aspecto
político e cultural que permearam o período colonial.
Nuno também
desvelava a importância do tempo na vida do homem e as formas de como saber
utilizá-lo de maneira produtiva. Nessa perspectiva, ele tecia um paralelo entre
o tempo e a eternidade. Descrevendo que o tempo seria como uma dimensão finita
devido à existência da noção de duração, já a eternidade era uma grandeza sem
princípio e nem fim. A questão da eternidade era analisada se demostrando que
para saber empregar bem o tempo, fazia-se necessário saber que, em sua duração,
deve-se saber cuidar da eternidade. Desse modo, ele pontuava que: No
fim do tempo: “não haveria mais tempo”, pois “dali por diante não haverá mais
que eternidade, a qual durará enquanto Deus for Deus, que será para sempre sem
fim”.
Fatos e Curiosidades:
Relata-se que o
título original de sua obra-prima era muito extenso, segundo fontes históricas,
as primeiras edições continham o seguinte título: "Compendio
narrativo do peregrino da América em que se tratam vários discursos
Espirituais, e morais, com muitas advertências, e documentos contra os abusos,
que se acham introduzidos pela malicia diabólica no Estado do Brasil. Dedicado
à Virgem da Vitória, imperatriz do céu, rainha do mundo, e Senhora da Piedade,
Mãe de Deus".
Filosofia
Sapiencial
+ “O ouro tem
valor conforme seu dono”.
+ “Os homens estão
doentes de avareza e cobiça”.
+ “As enfermidades
da alma não se curam com a mudança do lugar”.
+ “Pus-me na rua,
na rua que já me pudera então considerar: a chamada rua da amargura”.
+ “Que fujais
muito de que vos enganem os três inimigos da alma, que são: Mundo, Diabo e
Carne”.
+ “Devemos
empregar bem o tempo para vivermos uma vida reformada, e termos uma morte
preciosa”.
+ “E como o vi
prostrado por terra, o considerei escarmento da soberba, horror da morte,
desengano da vida”.
+ “Mais atormenta
ao homem o temor de perderem a fazenda que possuem, do que foi o gosto que
tiveram em adquiri-la”.
+ “Não há no homem
firmeza, nem estabilidade, que por muito tempo dure; por andar sempre em uma
perpétua mudança”
- “Reparai que:
sendo só de uma mesma espécie este metal (ouro), toma os efeitos das pessoas,
em cujo poder se acha”.
+ “É este mundo
estrada de Peregrinos, e não lugar nem habitação de moradores; porque a
verdadeira Pátria é o Céu”.
+ "Todos
somos peregrinos neste mundo: e de que devemos obrar com acerto, para chegarmos
a nossa pátria, que é o Céu".
+ “Bem é verdade,
que me dirão muitos, que escrever, e ainda em matérias espirituais, só incumbe
a seus professores, e que eu o não sou”
+ “Porque a Cruz é
o principio, meio, e fim eficaz da nossa salvação; por ter sido o principio de
toda a formação do gênero humano principiado em Adão”.
- “As riquezas
fazem aos homens altivos, soberbos e invejosos: e que são poucos os ricos e grandes
do mundo que não tenham estes efeitos consigo”.
+ “Não merece
pouca estimação, o que, desprezando os mimos e regalos de sua Pátria, busca as
alheias, para nelas se qualificar com mais largas experiências”.
+ No fim do tempo:
“não haveria mais tempo”, pois “dali por diante não haverá mais que eternidade,
a qual durará enquanto Deus for Deus, que será para sempre sem fim”.
+ “Se bem
repararmos que coisa é a vida de um homem neste mundo”, vemos que ele vive
sempre “apetecendo glórias até possuí-las, e na mesma posse temendo
perdê-las”
+ “Por cuja razão
é o sair da Pátria, o que faz aos homens mais capazes, e idôneos para mui
grandes empresas, e suficientes para tudo; como o tem feito a tantos Varões
ilustres”.
+ “Pode um homem
matar em sua fiel defesa, ou por algum outro incidente, que poderá ter
desculpa. Pode furtar em tão extrema necessidade, que não seja pecado, porque
no tempo da necessidade extrema todos os bens são comuns”.
+ “A soberba
pomposamente vestida de escarlata, com uma capa roçagante, e um escudo, e nele
escrita em letras, uma frase que dizia: Sou a Soberba invejosa, semelhante ao
Inferno: e por isso meus sequazes padecem de um mal eterno”.
+ “De mim têm
falado vários autores sagrados e humanos; e que existo no mundo, desde o
primeiro século em que Deus me fez e toda esta máquina do Universo. E sabei que
também hei de ter fim e que será a minha duração tão somente até se acabar o
mundo”.
+ “Vede agora
quanto maior razão eu tenho para trazer-te as moralidades, e humanidades, com
que te pretendo lisonjear o gosto neste livro que te ofereço, para debaixo
delas te dizer e mostrar s6lidas virtudes, com relações muito exemplares.
Desejo só agradar e servir a Deus”.
+ “A experiência
ocularmente nos está mostrando que toda a criatura racional, depois que morre,
com uma das duas eternidades se vai encontrar. Ou com a da Glória, cuja
grandeza é inexplicável, pelo incomparável bem de que gozam os que a ela vão:
ou com a do Inferno”, onde “nunca se acaba de morrer, por serem as penas
eternas na duração”.
+ “Sobre a paixão,
vamos ao remédio, que me pedistes. Haveis de saber, que para sarar do amor e
dessa enfermidade (a paixão) é necessário haver ausência. Muitas doenças se
curam só com a mudança do ar: porém, a do amor só se cura com a (mudança) da
terra. É o amor, como a lua, que em havendo terra (distância) entre meio, logo
se eclipsa”
+ “São os versos uma
recreação honesta, em que o
entendimento tanto se
diverte, que esquecendo-se
do penoso que o aflige,
se suaviza na ocupação de os
compor, ou ler, não só entre a gente popular
e plebeia, mas
também entre os
mais nobres e
grandes príncipes”.
+ “Primeiramente,
haveis de saber que as causas excessivamente intensas produzem efeitos
contrários. A dor faz gritar, mas se é grande, faz emudecer; a luz faz ver, mas
se é excessiva, cega: a alegria alenta, mas se é estupenda, mata; o amor pode
ser extremoso que passa loucuras; o ódio poderá ser tão extraordinário, que
cometa absurdos; as espécies se fazem venenos e matam, tanto que passam dos
quatro graus de quente a frio. Esta é a razão porque mata o grande pesar ou a
demasiada alegria.”
+ “Mas, falando
agora dos efeitos do pesar: sabeis que o homem tem alma racional, que os outros
animais não têm. Dela resultam a reminiscência, memória, entendimento, razão e
vontade, situadas na cabeça, membro mais nobre do corpo, sítio e morada da alma
racional. Pelo entendimento entende e sente os males e danos recentes; pela
memória, os males passados; pela razão espera e teme os males futuros, e pela
vontade aborrece; estes três gêneros de males, presentes, passados e futuros,
ama, deseja, teme e aborrece”.
+ “Porém, há de
ser com intenção de não mudar só de lugar, senão também de costumes; porque é
certo, que quem peregrina acompanhado de seus vícios, mais valera não haver
saído; pois tornará mais perdido, que aproveitado: porque as enfermidades da
alma não se curam com a mudança do lugar. O Peregrino vai por onde há de achar
cada dia novos costumes, e os deve ser, e aprovar; e não repreendê-los: pois é
mais razão acomodar-se ao uso da terra, que pertencer, e querer trazer aos mais
ao costume da sua Pátria. Há de considerar que vai obedecer às leis, que achar
estabelecidas; e não a dar regra aos mais: e que vai aprender, e não a ensinar.
E peregrinando assim, se qualificará em um perfeito Herói”
+ “O cevado, enquanto vivo, para nenhuma coisa serve; e só trata de comer, e engordar: o que se não acha em outros animais, como largamente tratam vários Autores, e com especialidade Jerônimo Cortez no seu Tratado dos Animais, assim domésticos, como silvestre, e ainda voláteis. Porque vemos, que o boi trabalha, o cavalo carrega, o carneiro dá lã, a cabra dá leite, o cão caça, o gato limpa a casa: e finalmente não há animal, que não tenha o seu ministério. Porém, o Cevado, só depois de morto se aproveitam dele: come-se a carne, guarda-se a banha, apanha-se o sangue, não se lhe perdem os miúdos, e finalmente tudo se lhe aproveita. Assim também o rico avarento: em quanto vivo, para nada vale; tanto que morre, para todos serve. Aparece o dinheiro, que tinha escondido, e talvez pelo ter furtado: come o parente, aproveita-se o testamenteiro, pagam-se os clérigos, remedeiam-se os pobres, satisfaz-se aos que trabalharam no Funeral: e enfim todos se aproveitam, porque em sua vida a ninguém prestou.”
Obras:
+ O Peregrino da
América
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