segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Aspásia de Mileto

Aspásia de Mileto – (470 a 410) a.C

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Foi uma filósofa sofista da Grécia antiga que viveu no período clássico. Nasceu na cidade de Mileto que ficava situada na região da Ásia menor.  Aspásia lecionou Retórica e exerceu papel importante como mentora do estadista Péricles. Atuou de maneira influente na educação política e cultural de Atenas. Sabe-se que ela era filha de um homem muito rico conhecido por Axíoco. Acredita-se que ela teria saído de Mileto para Atenas com a idade aproximada entre vinte a trinta anos e de lá teria levado uma bagagem de aprendizado cultural para Atenas. Supõe-se que ela também teria parentesco com um homem respeitado chamado Alcebíades e que este pode ter influenciado os primeiros contatos dela com a aristocracia ateniense. O significado do nome Aspásia seria uma espécie de saudação como “bem-vinda” ou “bela recepção”. Ela auxiliou Sócrates em partes da sua teoria sobre o método socrático, relatos afirmam que ele recomendava aos seus discípulos que visitassem a escola de Aspásia para que pudessem adquirir conhecimentos com ela. Platão em sua obra Menêxeno informa que ela teria ensinado retórica e oratória para Sócrates. Especula-se que Sócrates tenha tido um romance com ela, mas essas informações ainda não estão bem historiografadas. Também exerceu colaboração no ensino do filósofo Anaxágoras e de outros sofistas. Muitos filósofos antigos escreveram obras com o título de Aspásia, desse modo, não se sabe ao certo se estas eram obras em sua homenagem ou para divulgar seus conhecimentos. A enciclopédia “Suda” menciona as habilidades dela em relação ao mundo das palavras e da arte argumentativa.

Filosofia da Educação

Estudou os campos da Filosofia, Retórica, Oratória e Medicina. Lecionou as disciplinas de Artes, Retórica, Oratória e Administração Doméstica. Ela teria transformado o salão principal do palácio de Péricles em um grande centro cultural. Além de participar do círculo político, ela promovia reuniões literárias onde eram debatidas questões sobre Filosofia, Política, Arte, Literatura, Cultura e Educação. Também criou uma escola para mulheres na cidade de Atenas.  Sua escola teria ficado conhecida como “Academia de eloquência e artes amadoras”. Na sua escola ela ensinava as mulheres a como pensarem e como expressarem seus conhecimentos, pois isso permitiria para essas mulheres uma educação voltada ao gerenciamento do lar e também um melhor prestígio junto ao marido.

Segundo estudiosos, ela ministrava instruções medicinais relacionados à gravidez e ao estado pós-parto das mulheres. Colaborou na pesquisa e na prevenção da gravidez de risco, inclusive desenvolvendo remédios. Teve forte atuação no campo cirúrgico da obstetrícia e da ginecologia. Esse papel exercido por ela é visto como um forte símbolo de apoio à luta da emancipação da mulher. Ela incentivava as mulheres de Atenas a se libertarem do complexo de inferioridade que era imposto pela classe conservadora da época. Ensinava as mulheres a desenvolverem suas potencialidades físicas, sexuais e intelectuais. Ela teria desenvolvido um método de argumentação chamado de “indução” em que descreve técnicas de utilização de um argumento duvidoso que concorde com outro argumento semelhante ao de seu oponente. Para Aspásia o casal deveria ser o melhor cônjuge um para o outro ao invés de desejar um parceiro ideal.

Filosofia Política

As estrangeiras de Atenas eram denominadas de “metecas”, elas geralmente exerciam os ofícios de artesãs, tecelãs e cortesãs. Aspásia era considerada uma “hetera” (mulher que na Grécia antiga trabalhava como cortesã de maneira independente). Essas mulheres aconselhavam os homens da classe política e possuíam um status social de maior elevação em relação às outras mulheres. Elas se diferenciavam das prostitutas, das escravas e das esposas, pois eram mulheres admiradas pela cultura que tinham e pela inteligência que possuíam. Sua condição de “hetera” e seus saberes teria lhe proporcionado viver como os sofistas, ou seja, da venda de seu conhecimento. Sua posição social era vista com relativa independência, pois contribuía com os impostos igualmente como os cidadãos do sexo masculino.

Devido sua condição de mulher e de estrangeira, existiu um forte debate sobre o impacto que sua atuação causava na Atenas clássica, isso teria lhe rendido falsas acusações e discriminações. Ela teria sido acusada pelo crime de “impiedade” (ofensas aos deuses), por um poeta cômico chamado de Hermipo. Relata-se que Péricles conseguiu intervir em sua absolvição com um discurso emocionante e isso teria sensibilizado os jurados.  O fato é que muitos filósofos e políticos de Atenas visitavam sua escola, por isso as esposas dessas personalidades ficavam enciumadas e acusavam a escola de ser um bordel, pois algumas mulheres acabavam tendo casos com os visitantes. O próprio Péricles se apaixonou por Aspásia e acabou deixando sua esposa para ir viver com ela, isso gerou muita polêmica na cidade e Aspásia passou a sofrer discriminações e perseguições na localidade. Após a morte de Péricles, Aspásia teria se casado novamente com um comerciante chamado Lísicles e com o passar do tempo, teria transformado ele em um político influente de Atenas. Conta-se que ele era um homem sem instrução, porém com pouco tempo, Aspásia teria lhe dado uma boa formação e ele teria se tornado um grande orador muito eloquente em Atenas.

Aristófanes, filósofo comediante, tecia críticas irônicas afirmando que os discursos de Péricles eram escritos por Aspásia e que este era incapaz de escrevê-los sozinho. Aspásia é tida como uma figura paradigmática do ponto de vista feminino e considerada também como enigmática devido aos mistérios sobre a sua vida, pois o que intriga os pesquisadores, é o fato de que ela era mulher e estrangeira, duas condições que dificultavam a sua atuação política em Atenas, isso é observado por estudiosos como um fato muito curioso para a época. Porém, mesmo diante dessas adversidades, ela conseguiu influenciar as principais lideranças políticas de seu tempo. Platão teceu duras críticas a ela e teria lhe acusado de ter se aproveitado da filosofia para influenciar a política de Atenas e com isso persuadir os governantes. Também foi acusada por críticos de ter insuflado os estadistas e aristocratas a apoiarem Atenas a lutar na guerra de Samos e na guerra do Peloponeso.

Filosofia Moral

Ela argumentava que o homem que dedicava sua vida para cuidar da família suportava melhor os infortúnios do destino. Ensinava aos homens que na covardia não se vive, apenas se padece, desse modo, ela enaltecia a ideia de nobreza e de honra entre os homens. Acreditava em uma irmandade fraterna em que a Terra seria a pátria-mãe de todos, por isso, chamava essa pátria de “mátria”, isto é, casa em que todos eram irmãos, ou também, “fratria” de onde deriva o termo fraterno. Desse modo, ela defendia o amor fraterno entre os irmãos, até mesmo entre os estrangeiros. Também defendia o amor ao solo em que se vive ou a cidade que lhe acolhe. O amor defendido por ela seria o amor materno relacionado à mãe-terra, por isso a expressão “mátria” traduziria a ideia de fraternidade defendida por ela. Adotava esse conceito ético de união entre todos como forma de reconhecimento das virtudes de coragem e honra dos guerreiros mortos nas guerras em defesa da pátria.

Destacava um princípio formulador da inteligência e da justiça que era definida por “nous”, esse princípio seria o que diferenciava os homens de coragem dos animais selvagens da natureza, daí os homens de valor de uma cidade seriam guiados pelo “nous”, ou seja, uma espécie de “inteligência-justiça” traduzida também por “no que a linguagem se mostra”. Nesse sentido, o indivíduo que teria amor a “mátria” saberia conviver com o outro, sendo fraterno e solidário, sendo inteligente e justo, por isso morreria pelo outro, por fim veria a morte como glória. Esse conceito de ligação entre amor, Terra, mãe, natureza, irmandade, inteligência e justiça, também se une a ideia de divindade para compreensão do conceito de “nous”.

Obras:

Discurso Fúnebre de Péricles

Aspásia – Obra de Ésquines Socrático

Comentários de filósofos

"Que arte ou poder de encantamento tão grande esta mulher tinha, que lhe permitia cativar, como fez com os maiores estadistas, e brindar os filósofos com a oportunidade de falar tanto dela em termos tão exaltados." (Plutarco).


Filosofia Sapiencial

- “Todo conhecimento dissociado da justiça e das demais virtudes é apenas astúcia, jamais sabedoria”.

- “É melhor morrer em glória do que viver na covardia”

- “A virtude deve ser imitável, e não simplesmente ensinável”.

- “O passado é verdadeiro o futuro é escuro”.

- “Se ambos querem ter o melhor marido e a melhor esposa, ambos devem procurar ser o melhor marido e a melhor esposa, respectivamente”.

 

Fontes:

ARISTÓFANES. Os Acarnânios. Biblioteca Clássica Gredos. Madrid: Editorial Gredos, 1995.

BAIRD, Forreste & KAUFMAN, Walter. Filosofia antiga: Período clássico. USA: Prentice Hall, 2008.

BERQUÓ, Thirzá. Aspásia de mileto: mulher e filosofia na Atenas Clássica. Org. Juliana Pacheco, In: Filósofas a presença das mulheres na filosofia. Porto Alegre: Editora Fi, 2018.

CALDEW. Taylor. A glória que passou. Trad. Pinheiro de Lemos. Rio de Janeiro: Recorde, 1974.

DUESO, José Solana. Aspásia de Mileto: testemunhos e discursos. Barcelona: Anthropos. 1994.

HENRY, Madeleine. Prisioneira da História: Biografia de Aspásia de Mileto. Reino unido: Oxford University Press, 1995.

LEVI, Mario. Péricles: um homem, uma cultura. Trad. Antônio Agenor Briquet de Lemos. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991.

MÉNAGE, Gilles. História das mulheres filósofas. Barcelona: Herder Editorial. 2012.

MENEZES, Fabíola & XIMENES, Raíssa. Aspásia: O amor como armadura de Atenas. Rio de Janeiro: Revista Páginas de filosofia, vol. 9. n. 2, 2020.

O’GRADY, Patrícia. Os Sofistas: Uma Introdução. Nova Iorque: Bristol Classical Press, Bloomsbury . 2008.

POMEROY, Sarah. Goddesses, Whores, Wives, and Slaves: Women in Classical Antiquity. New York: Schocken Books, 1995.

PSEUDO, Plutarco. Vidas Paralelas: Péricles e Fábio Máximo. Trad. Ana Maria Guedes Ferreira & Ália Rosa conceição Rodrigues. Coimbra: IUC, 2013.

SANCHEZ Castro Carolina. Aspásia de Mileto. Santa Rosa: Scielo, Circe classic, vol. 19. N. 2, dez, 2015.

SIQUEIRA, Ana Carla de Abreu. Subsídios para a visibilidade de mulheres na História da Filosofia. FortalezaRevista Lampejo. vol. 7 nº 2. 2018.

SUDA. Enciclopédia online. Aspásia. Internet: Acesso, 2021.

TUCÍDIDES. História da Guerra do Peloponeso. Trad. Mário da Gama. São Paulo: Imprensa Oficial, 2000.

WAITHE, Mary Ellen. The history of women philosophers. Vol. 1. Boston: Martinus Nijhoff, 1987.

XENOFONTE. Econômico. São Paulo: Martins Fontes, 1999.


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