Clóvis Beviláqua –
(1859 a 1944) d.C
Autor: Alysomax
Soares
Introdução
Foi um filósofo
cearense ligado as correntes de pensamento da filosofia jurídica. Além do
Direito, seus estudos também contribuíram para várias outras áreas do saber
como História, Filosofia, Psicologia, Economia, Política e Literatura. Atuou
como escritor, jurista, professor e historiador. Iniciou seus estudos no
Ateneu Cearense de Sobral, tendo logo em seguida frequentando o Liceu do Ceará
em Fortaleza. Aos 17 anos passou a morar por um tempo no Rio de Janeiro onde
trabalhou no Jornal “Laborum Literarium”. Posteriormente, teria
concluído seu Bacharelado em Direito na Faculdade de Recife. Teve como mestre e
orientador o filósofo Tobias Barreto, em vista disso, participou do famoso
movimento filosófico conhecido como Escola de Recife. Mudou-se novamente para
Fortaleza e ajudou na elaboração da Constituição do Ceará. Nessa época, teria
se afeiçoado com o movimento filosófico e literário da chamada Academia
Francesa do Ceará. Defendeu os preceitos republicanos através de suas teorias
jus-filosóficas.
Laborou como
promotor público na cidade de Alcântara no Maranhão. Também chegou a trabalhar
como bibliotecário e professor de filosofia em Recife. Foi o autor do primeiro
projeto do Código Civil Brasileiro. É considerado um dos fundadores da Academia
Brasileira de Letras, ocupando a cadeira de número catorze, e patrono da Academia
Cearense de Letras. Fez parte do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil.
Biógrafos afirmam que Clóvis era desafeto as vaidades e ambições sociais, não
comungava em busca de status, às vezes chegava ao ponto de recusar títulos e
cargos públicos que lhe eram oferecidos. Devido o seu estilo de vida
despretensioso e respeitoso, foi alcunhado de “o santo laico”. Nasceu em viçosa
no Ceará, em 1859 e faleceu no Rio de Janeiro por volta de 1944, dentro de sua
biblioteca, de falência física e ainda com os seus instrumentos de escrita nas
mãos.
Filosofia do
Direito
Premiou o Brasil
com um vasto legado cultural e jurídico que funcionou como fonte e bússola
orientadora das atividades do Direito. Tinha uma visão humanista e social em
relação ao campo jurídico, pois teria sofrido grande influência literária e
filosófica. Seu objeto de estudo se direcionava para as noções do Direito
comparado, isto é, ramo da ciência jurídica que estuda as diferenças e as
semelhanças dos diversos ordenamentos jurídicos existentes na história.
Posicionava-se ao lado das correntes filosóficas positivistas, evolucionistas e
monistas. Era visto na área jurídica como um civilista, devido sua notável
atuação no Direito Civil, ele viu no campo jurídico uma bússola de orientação
para regulação do organismo social. Acreditava que o Direito seria um fenômeno
social em conformidade com o mundo, por isso, essa ciência poderia ser
considerada como sendo um grande organismo dotado de um sistema com tecidos e
órgãos. Alguns pensadores pontuam que a obra de Clóvis teria um caráter
universalista, pois relacionava seu vasto saber científico com a realidade e
suas implicações no mundo jurídico.
Ensaiou alguns
estudos também no campo do Direito Internacional, chegando inclusive a ocupar o
cargo de consultor do Ministério das Relações Exteriores, exercendo importantes
atividades na diplomacia brasileira. Sua obra apresentou inovações em alguns
campos do Direito brasileiro, como, por exemplo, a criação de regulações para a
locação de serviços. Em relação ao direito da família, ele contribuiu com a
questão da investigação da paternidade e o reconhecimento dos filhos
ilegítimos.
Filosofia Política
Na arena política
se inclinava na direção do liberalismo, dado que sustentava a noção de
liberdade e unidade do espírito nacional. Diante disso, ele se mostrava a favor
dos princípios democráticos. Era um grande defensor dos ideais republicanos e
abolicionistas, pois lutava em prol da construção de um pensamento nacional.
Pontuava que a abolição da escravatura teria legado ao Brasil um grande abismo
social, por isso, caberia ao Estado promover uma reorganização social para
inserir esses novos cidadãos na sociedade moderna, pois muitas dessas pessoas
tinham passado a sobreviver à margem da coletividade. Posto isso, ele
compreendia que o liberalismo não poderia se dissociar da democracia, ou seja,
ambos eram meios de ligação na corrente da construção da soberania nacional.
Diferenciava os
conceitos de Estado e sociedade, pontuando que sociedade seria: “uma
concepção do universo, como um campo onde as instituições se transformam
conduzidas por forças seletivas da experiência e da razão”. Enquanto
que o Estado poderia ser delimitado como sendo: “um agrupamento humano,
estabelecido em determinado território e submetido a um poder soberano, que lhe
dá unidade orgânica”. Ainda segundo o ilustre filósofo, o Estado
deveria ser dotado de três elementos básicos para a sua formação: povo,
território e soberania. Ele teria por fim a conservação da segurança, quer
contra os inimigos de fora quer contra as perturbações internas.
Criticava o fascismo italiano explicando que essa forma de governo empurrava o indivíduo para uma situação de submissão ao Estado. Com isso, criava-se uma desarmonia de âmbito social, promovendo, em razão disso, um desvio na evolução da espiritualidade humana. Dessa forma, aconteceria uma apreensão total do indivíduo pelo Estado. Posicionou-se contrário as ideologias sovietistas afirmando que estas sofreriam de um pecado original, pois elas não seriam produto de uma evolução social e natural de um povo, mas sim de uma construção artificial baseada em teóricos simpáticos a luta de classes, desse modo, observava que o regime comunista seria apenas uma contraversão de conduta, isto é, uma ditadura do proletariado.
Filosofia do
Conhecimento
Clóvis advertia
sobre a não existência de verdades absolutas, mas acreditava que o homem poderia
se aproximar do conhecimento verdadeiro, pois ele pensava que a ciência
caminhava em direção a uma constante transformação. Essas mudanças ocorreriam
tanto no meio social como também na vida acadêmica e científica. Dessa forma,
as teorias iriam se moldando conforme o tempo e espaço, criando e recriando
novos paradigmas no tecido social, e com isso, reformulando seus sistemas de
pensamento de forma constante. Nesse sentido, ele esclarecia que o conhecimento
teria certa falibilidade, mas que o amadurecimento do conhecimento se dava em
todas as áreas do saber. Dessa maneira, ele advogava em favor do rigor
filosófico como fonte de transformação e evolução do conhecimento. Compreendia
o saber filosófico como sendo um processo de sistematização do conhecimento que
sintetizava, generalizava e unificava a completude do saber humano. Nesse
contexto, ele teria sofrido grandes influências dos pensadores Augusto Comte e
Herbert Spencer.
Na sua visão, o
Direito se construía através das relações sociais estabelecidas entre o homem e
a sociedade, dessa troca, nasceria uma fonte de conhecimento vindo de
filósofos, historiadores, psicólogos e sociólogos. Portanto, os juristas
analisavam esses dados produzidos por essas áreas e elaboravam um saber crítico
referente à teoria do Direito. Dessa forma, Clóvis defendia o estudo da
sociologia e da psicologia para a complementação do saber jurídico, por
entender que a compreensão do homem dentro do contexto de seu universo não
seria possível sem a percepção social e a cognição da psique. Nessa
perspectiva, ele também era visto como sendo um conciliador das variadas
tendências culturais que se distinguiam.
Filosofia da
Educação
Defendeu uma
reformulação no ensino do Direito e na Educação Brasileira, pois acreditava que
a educação deveria se voltar para questões mais realistas da sociedade e para resoluções
de problemas sociais dos quais o país estava enfrentando. Explicava que o
Estado necessitaria proporcionar uma educação jurídica crítica que abrangesse
tanto os pontos a favor como os contrários a uma determinada linha de
pensamento, pois, com isso, se formaria uma classe intelectual melhor desenvolvida.
Pensava a atividade jurídica como sendo uma ferramenta de natureza educacional.
Compreendia que a Educação seria um dos caminhos para as transformações
sociais. Considerava que a mulher tinha um papel importante na educação dos
filhos. Dessa forma, ele pontuava que: “o ensino da primeira idade é
preciso ser dado em família, para que bem longe se lance pela vida do homem a
salutar influência feminina”. Beviláqua era considerado um homem a
frente do seu tempo. Sua obra era caracterizada como um marco civilizatório
para época.
Anedotas:
De acordo
historiadores, o jurista aqui descrito adorava bichos, daí certo dia alguém
teria se dirigido à casa do seu avô para pegar um parecer por ele concluído. No
entanto, Clóvis teria feito o cliente esperar, porque um gato estava dormindo
sobre o volume de livros e papéis. Tranquilamente, ele disse: “Vamos esperar o
gatinho acordar”.
Em outro momento,
conta-se que Clóvis certa vez gastou "sem contos de réis" em joias
para sua esposa, mas a empregada de sua casa teria roubado as peças. Clóvis,
porém, em um ato de extrema compreensão, não a condenou, dizendo que: “se ela
as tinha levado era porque precisava”.
Curiosidades
Relata-se que
Clóvis teria deixado de frequentar a Academia Brasileira de Letras após sua
esposa “Amélia de Freitas Beviláqua” ter sido negada a concorrer a uma vaga na
academia pelo simples fato de ser mulher. A academia teria alegado que o
estatuto não permitia que houvesse mulheres acadêmicas na casa. Diante disso,
Clóvis e outros intelectuais de peso se desligaram da ABL decepcionados com
esse tipo de posicionamento.
Segundo relatos,
Clóvis Beviláqua teria prestado concurso para o cargo de professor do colégio
Dom Pedro II; porém, o resultado que vinha sendo cobrado pelo Imperador não
saía. Em dado momento o Imperador quis saber mais detalhes sobre o tal 1º lugar
no concurso; como viu que estavam lhe "enrolando", exigiu que lhe
trouxessem a prova deste candidato. Depois de lê-la e ficar impressionado com a
riqueza do trabalho de Clóvis, perguntou: Por que vocês ainda não aprovaram
este rapaz? Seu trabalho é brilhante. Como reposta lhe foi dito: Porque
soubemos que ele é republicano, estamos vendo outro. Dom Pedro II, do alto da
sua sabedoria, assim falou: E o que isso tem a ver? Contratem logo este rapaz.
Ele é o melhor e o que queremos pra cá é o melhor. Assim foi contratado Clóvis
Beviláqua.
Comentários de
Filósofos
A respeito de
Clóvis em um evento, Rui teria dito: “Eis aí no palco, o maior jurista
brasileiro de todos os tempos”. (Rui Barbosa).
Obras:
- A filosofia
positivista no Brasil
- Criminologia e
Direito
- Direito das Obrigações
- Direito de
Família
- Direito Público
Internacional
- Épocas e
individualidades
- Economia
Política
- Esboços e
Fragmentos
- Juristas
Filósofos
- Direito das
Coisas
Filosofia
Sapiencial
- "O mundo é
um vasto campo de batalha".
- “Não deixe que
seus sonhos percam a força de voar”.
- "A luz
surpreenderá o vício, a gargalhada o esmagará”.
- "É um erro
supor que o pensamento é escravo da vontade".
- “O Direito é uma
ciência moral, colocada entre a Filosofia e a História”.
- "As dores,
os desgostos e as angústias precocemente desbotam o talento".
- “A política
atende ao governo dos povos; a filosofia é síntese do saber humano”.
-
“A inteligência irmanada com a força de vontade e com a esperança produz uma
ideia”.
- “Quando um país
está atrasado por falta de atividade intelectual é impossível que ele se eleve”.
- “Todo moço é
ávido de glória, pois tem no coração um gérmen imperecível da animosa esperança”.
- “Com a lei o
direito adquire, em lucidez e segurança, o que perdeu em flexibilidade e
movimento”.
- "Por sobre
as ruínas das escolas e a queda das tentativas falhas se levantará o majestoso
vulto da verdade".
- “O Direito não é
um filho do céu, é, simplesmente, um fenômeno histórico, um produto cultural da
humanidade”.
- “O caráter
essencial da filosofia, o que a distingue de todos os outros conhecimentos, é a
universalidade”.
- “Por toda parte,
o homem vive em sociedade e o direito, embora variável, é o modo necessário de
organizar a sociedade”.
- “A liberdade há
de ser disciplinada pelo direito para não perturbar a paz social, que por sua
vez assegura a expansão da liberdade”.
- "A síntese
da política republicana democrática é Liberdade dentro da ordem, igualdade em
face da lei e justiça garantindo a ordem, a liberdade e a igualdade”.
- “O positivismo
não é uma criação exclusiva de Augusto Compte, porém uma simples adesão às
tradições dos grandes espíritos científicos, cujas descobertas fizeram da raça
humana o que ela é atualmente”.
- “Creio na moral.
Por que é utilidade de cada um e de todos transformada em justiça e caridade,
expunge a alma das inclinações inferiores, promove a perfeição dos espíritos, a
resistência do caráter, a bondade dos corações”.
- “Assim como o
lago, cristalino ou turvo, reflete o firmamento, cada um de nós reflete, fraca
ou fortemente, o espírito dominante na época em que vive, porque o homem é
parte componente do meio social, cuja influência necessariamente recebe”.
- “Creio mais nos
milagres do patriotismo, porque o patriotismo é forma social do amor, e como
tal, é força irresistível e incomensurável; aos fracos dá alento, aos dúbios
decisão, aos descrentes fé, aos fortes ilumina, a todos une no feixe indestrutível,
quando é preciso agir ou resistir; não pede inspiração do ódio e não mede
sacrifício para alcançar o bem comum”.
Fontes:
BEVILÁQUA,
Clóvis. Direito Público Internacional: A síntese dos
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SHUBSKY,
Cássio. Clóvis Beviláqua: um senhor brasileiro. São Paulo: Editora
Litra, 2010.
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