quarta-feira, 4 de maio de 2022

Matias Aires

Matias Aires – (1705 a 1763)

Autor: Alysomax Soares

Introdução

Matias Aires Ramos da Silva de Eça foi um filósofo luso-brasileiro do período colonial. É considerado um dos primeiros filósofos do Brasil e conceituado também como um dos maiores filósofos da língua portuguesa. Pertenceu a academia brasileira de letras, tendo ocupado a cadeira de número seis como patrono. É patrono também da cadeira de número 3 da Academia Paulista de Letras. Sua obra é considerada um clássico da Literatura mundial. Ele foi apontado como um filósofo melancólico, pois tinha um aspecto respeitoso e educado o que era muitas vezes confundido, em sua época, como antissocial. Iniciou seus estudos no colégio jesuíta de São Paulo, mas foi morar em Lisboa quando tinha apenas onze anos. Posteriormente concluiu o curso de humanidades no colégio santo Antão, em Portugal. Recebeu o grau de mestre em artes pela universidade de Coimbra. Chegou a cursar Direito, em Paris na França. Atuou como engenheiro voluntário na batalha do cerco de Gibraltar. Ocupou o cargo de provedor da Casa da Moeda, em Portugal. Sua educação nobre lhe permitiu uma sólida e eclética formação. Tratou em sua filosofia dos temas relacionados à vaidade, o amor, o tempo e o ceticismo. Dessa forma, sua filosofia se entrelaça entre questões da Psicologia e da Filosofia Moral. Também é visto como um pensador humanista. Matias não teve o devido reconhecimento de sua obra em vida e isso teria lhe deixado decepcionado. Por muitos anos sua obra permaneceu esquecida nos porões do tempo, entretanto é bastante estudada na atualidade. Era natural da cidade de São Paulo, filho de José Ramos da Silva e de Catarina Horta. Faleceu no ano de 1763, em Agualva, localidade próximo a Lisboa.

Filosofia Moral

Ele teria sido conceituado como um filósofo moralista por transcorrer sobre as questões relacionadas com a investigação da alma. A base da sua filosofia se encontrava ancorada na sapiente frase bíblica do Eclesiastes: “vaidade das vaidades tudo é vaidade”. Nesse sentido, ele construiu sólidas reflexões sobre a noção de vaidade. Acreditava que os homens agiam movidos pelas paixões e que estas eram causadas pela vaidade, ou seja, a vaidade seria um guia para outras paixões ou até mesmo para o entendimento humano. Matias Aires explicava que a vaidade não seria uma paixão do corpo, mas sim da alma, pois o defeito não estaria na vontade, e sim na imperfeição da lucidez humana. Nesse contexto, o homem deveria enfrentar esse vício não com as forças do corpo, mas sim com as armas do espírito. Desse modo, as paixões que seriam geradas pelo coração do homem e pela sua ideia de compreensão do mundo eram na verdade ilusórias, elas dominavam o espírito humano, por isso o homem deveria buscar uma clarificação do entendimento em Deus. Aires argumentava que se o homem conseguisse negar a vaidade, ele estaria cumprindo o propósito de Deus, pois na sua visão, Deus seria a autoridade maior que existe no campo espiritual e temporal.

Argumentava que até mesmo na dor o homem também floresce sua vaidade, pois em alguns casos o indivíduo se agarra ao sofrimento com a finalidade de comprovar uma injustiça ou agigantar seu infortúnio. Em razão disso, a vaidade poderia amenizar ou piorar o sofrimento humano. Na sua visão, nem mesmo as virtudes escapam da vaidade. Dessa forma, ele pontuava que a vaidade estaria presente em questões como a desgraça, a miséria, o suplício e até na própria morte como sacrifício de vida. Portanto, a vaidade também seria uma espécie de amor à vida. Em contrapartida, ele pensava que o amor teria como função equilibrar a dinâmica do universo. Matias diferenciava a definição para dois tipos de amor: o amor medíocre e o amor sublime. O primeiro era voltado aos prazeres ligados aos sentidos, às paixões do corpo e aos impulsos da natureza humana, este buscava aceitação no outro e a aprovação de outros indivíduos. O segundo emanava da alma e encontrava satisfação dentro de si, era independente do outro, possuía um aspecto divino e seria completamente desvinculado das paixões.

Filosofia do Conhecimento

Matias acreditava que o conhecimento das coisas se originava nos sentidos. Dessa maneira, ele pensava que o conhecimento não poderia sem apreendido e nem ensinado. Explicava que o homem poderia utilizar o critério da vaidade como guia de conhecimento de “si e do outro”. Ainda segundo ele, o homem poderia se prevenir de certos comportamentos e construir ações políticas que pudessem lhe auxiliar a agir de forma justa e efetiva. Nesse sentido, ele denotava que a ideia de juízo não seria propriamente o acúmulo de conhecimento, mas antes de tudo, saber agir com prudência e sabedoria. Sendo assim, muita informação não significaria necessariamente muita sabedoria, pois um homem sábio agiria com zelo e cautela nos tratos sociais, premeditando comportamentos e regulando ações para realizar manobras de prevenção de modo a agir discretamente.

Aires transcorria em sua obra uma crítica aos valores culturais, sociais e históricos da sociedade da qual ele fez parte. Por consequência, ele pontuava que a vaidade do homem era compreendida como sendo um mal geral, que se mascarava principalmente por meio dos valores da nobreza, ou seja, dos sábios, dos magistrados, dos nobres e dos reis. Ele denunciava os vícios individuais e sociais do homem. Alguns pensadores acreditam que Matias não estava muito conectado aos problemas do seu tempo, por isso não teria sido bem compreendido. Sua extemporaneidade teria lhe deixado um legado de exclusão nos campos do chamado espírito filosófico. Contextualizava em suas reflexões que existem vaidades universais que norteiam as civilizações e outras vaidades individuais que as desagregam. Sua filosofia abordava aspectos do pensamento iluminista com pintadas da arte barroca.

Outro ponto importante, em sua obra, é a questão do tempo, para Matias, a consciência humana se moldava em conformidade com a noção de tempo, por isso o produto do homem no mundo era de ser um prisioneiro do tempo, acorrentado por contradições que se traduziam na ação do tempo em conflito com os paradoxos do mundo, construindo dessa feita uma relação dialética de ilusão da realidade, isto é, uma dependência opositiva e sem fim entre Natureza e História.

 

Filosofia Sapiencial

+ “Tudo são produções da vaidade”.

+ “Só a vaidade é constante em nós”.

+ “Quantas vezes buscar o precipício é o único meio de evitá-lo”.

+ “A natureza de cada coisa também se compõe do seu defeito”

+ "Que coisa é a ciência humana, senão uma humana vaidade?”.

+ “Sendo o termo da vida limitado, não tem limite nossa vaidade”.

+ "Não vivemos contentes, se a nossa vaidade não vive satisfeita".

+ “É mais fácil sustentar uma opinião má do que escolher uma boa”.

+ “As regras não governam aos homens, estes é que governam as regras”.

+ "Com os anos não diminui em nós a vaidade, e se muda, é só de espécie”

+“Tudo no mundo é vão, por isso a vaidade é a que move os nossos passos”

+ “Quem deseja vingar-se ainda ama e quem se mostra ofendido ainda quer”.

+ “Viemos ao mundo para fugirmos de nós, mas nunca podemos fugir de nós”.

+ “São raros os que nas letras buscam a ciência; o que buscam é utilidade e aplauso”.

+ “O aplauso é o ídolo da vaidade, por isso as ações heroicas não se fazem em segredo”.

+ “Quero deixar o mundo antes que o mundo me deixe. Quero antecipar-me já, para não estranhar depois”.

+ "A vaidade nos ensina, que as ações heroicas se fazem imortais por meio das narrações da história".

+ "De todas as paixões, quem mais se esconde, é a vaidade: e se esconde de tal forma, que a si mesma se oculta".

+ “As criaturas são mais perfeitas, à proporção que são capazes de mais amor; e assim o amor não só é o princípio da vida, mas também é um sinal de perfeição”.

+ “Quando nos parece que a nossa vista rompeu a nuvem, e que o nosso discurso rompeu o embaraço, então é que estamos cegos, e então é que erramos mais”

+ “Assim, bem podemos assentar, que a vaidade da Nobreza é uma introdução supersticiosa, a qual nasce da vaidade do luxo, da vaidade da arrogância, e da vaidade da fortuna”.

+ “Nunca mostramos o que somos, senão quando entendemos que ninguém nos vê, e isto porque não exercitamos as virtudes pela excelência delas, mas pela honra do exercício”.

+ “Assim como nos lugares, há também horizontes na idade, e continuamente imos deixando uns, e entrando em outros, e em todos eles a mesma vaidade, que nos cega, nos guia”.

+ “O nosso engenho todo se esforça em por as coisas em uma perspectiva tal, que vistas de um certo modo, fiquem parecendo o que nós queremos, que elas sejam, e não o que elas são.”

+ “Tudo no mundo é vão, por isso a vaidade é a que move os nossos passos: para donde quer que se vá à vaidade nos leva e vamos por vaidade. Mudamos de lugar, mas não mudamos de mundo”.

+ "Assim se vê que a vaidade nos livra de uma dor como por encanto; por isso nos é útil, pois serve de acalmar os nossos males; e se os agrava alguma vez, é como a mão do artista, que faz doer para curar".

+ “Quem nos dera que assim como há arte para saber, a houvesse também para ignorar; e que assim como há estudo, que nos ensina a lembrar, o houvesse também, que nos ensinasse a esquecer".

+ “A cada passo, que damos no discurso da vida, se nos oferece um teatro novo, composto de representações diversas, as quais sucessivamente vão sendo objetos da nossa atenção, e da nossa vaidade”.

+ “Nem sempre fomos suscetíveis das mesmas impressões; nem sempre somos sensíveis ao mesmo sentimento; sempre fomos vaidosos, mas nem sempre domina em nós o mesmo gênero de vaidade".

+ “Se a melancolia nos desterra para a solidão do ermo, não deixa de ir conosco a vaidade; e então somos como uma ave desgraçada que, por mais que fuja do lugar em que recebeu o golpe, sempre leva no peito atravessada a seta”.

+ “Tudo quanto vejo é com olhos desenganados. Talvez por isso vejo as coisas como são e não como se mostram. Porque o desengano tem virtude e força para arrancar da formosura o véu cadente e mentiroso de que o teatro da vida se compõe”.

+ "Tudo nos é dado como por conta: a vida, a fortuna, a desgraça, a alegria e a tristeza; em tudo há um ponto certo e fixo; a vaidade que governa todas as paixões, em umas aumenta a atividade, em outras diminui; e todas recebem o valor que a vaidade lhes dá".

+ “A vaidade nos inspira aquele modo de vingança e parece, com efeito, que o deixar o mundo é desprezá-lo.  Assim  será,  mas  quem  deseja  vingar-se  ainda  ama  e  quem  se  mostra  ofendido  ainda quer [...]. Mudamos de lugar, mas não mudamos de mundo”

+ “A inconstância nos serve de alívio, e desoprime, porque a firmeza é como um peso, que não podemos suportar sempre, por mais que seja leve; e, com efeito, como podem as nossas ideias serem fixas, e sempre as mesmas, se nós sempre vamos sendo outros?”.

+ “A inconstância nos serve de alívio, e desoprime, porque a firmeza é como um peso, que não podemos suportar sempre,  por  mais  que  seja  leve;  e, com  efeito,  como  podem  as  nossas  ideias serem fixas, e sempre as mesmas, se nós sempre vamos sendo outros?”

+ “Quem são os homens mais do que a aparência de teatro? A vaidade e a fortuna governam a farsa desta vida. Ninguém escolhe o seu papel, cada um recebe o que lhe dão. Aquele que sai sem fausto, nem cortejo, e que logo no rosto indica que é sujeito à dor, à aflição, à miséria, esse é o que representa o papel de homem. A morte, que está de sentinela, em uma das mãos segura o relógio do tempo. Na outra, a foice fatal. E, com esta, em um só golpe, certeiro e inevitável, dá fim à tragédia, fecha a cortina e desaparece”.

 Obras:

- Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens

- Carta sobre a Fortuna

- Problema de arquitetura civil


Fontes:

AIRES, Matias. Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens. trad. Alceu Amoroso Lima. Ilustrações de Santa Rosa. São Paulo: Livraria Martins Editora S. A., 1955.

BERNARDO, Luiz Manuel. A filosofia de Matias Aires: uma ciência do tempo. Revista de Filosofia: Argumentos. N; 25. Fortaleza: UFC, 2021.

BEZERRA, Alcides. A filosofia na fase colonial. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1935.

BRASIL. Dicionário Biobibliográfico de Autores Brasileiros. filosofia, pensamento político, sociologia, antropologia. Brasília, Salvador: Senado Federal, CDPB. 1999.

CHAUVIN, Jean Pierre. Matias Aires e a arte de sentenciar. Revista patrimônio e memória. v. 14, n; 2. São Paulo: Unesp, 2018.

COSTA, Rodrigo. História da Filosofia e exclusão de Filosofia: o caso Matias Aires. Revista: Problemata Internacional de Filosofia. V. 06 N; 1. UFPB, 2015.

LIMA, Alceu Amoroso. Introdução em Matias Aires: Reflexões sobre a vaidade dos homens. São Paulo: Edipro, 2011.

MESQUITA, Antônio Pedro. Vanitas vanitatum: As virtudes com vaidade em Matias Aires. Revista Estudos Filosóficos nº 07. São João Del-Rei: UFSJ – DFIME, 2011.

PAIM, Antônio. As Luzes no Brasil: História do Pensamento Filosófico Português.  Vol. O3. Lisboa: Caminho, 2001.

PINTO, Paulo Roberto Margutti. Reflexões sobre a vaidade dos homens: Humes e Matias. Revista de Filosofia: Kriterion. Belo Horizonte: Scielo, 2003.

REAL, Miguel. Matias Aires: As Máscaras da Vaidade. Lisboa: Sete Caminhos, 2008.

SILVA, Paulo José Carvalho da. A dor da alma nas reflexões sobre a vaidade de Matias Aires. Revista Latino americanov.12, n. 2. São Paulo: Fapesp, 2009.

SUASSUNA, Ariano. Reflexão sobre Matias Aires. Revista de Pesquisa Histórica. v. 1, n. 1 Recife: UFPE, 1977.

VALINHAS, Mannuella Luz de Oliveira. A ideia de História em Matias Aires. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2012.

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